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A semana passada foi de tortura para os analistas e profissionais de educação. A maioria – pelo que tudo indica – não sabia se festejava ou se lamentava os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos, o teste Pisa, na sigla em inglês, exame de desempenho educacional realizado a cada triênio com alunos de 15 anos.

A prova é uma exclusividade dos países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), todos ricos, mas desde 2000 inclui o Brasil como convidado. Há de se relativizar o peso dos resultados. Mas a quem interessar possa, a nota brazuca melhorou. Palmas. Seguidas de recolhimento: as notas permanecem longe de refletir um ensino de qualidade. E descobrir-se tão longe provoca cansaço e a dúvidas. Eis o sentimento.

O Pisa é um teste refinado, que avalia o aluno em seis níveis. Poucos países chegam à última escala. Mas como não se trata de uma maratona de xadrez, não é no grau de dificuldade que reside a virtude. O teste ajuda a medir a capacidade de relacionar saberes, de levantar hipóteses, de perceber e resolver problemas. Ou seja, na esteira da memorização básica e instrumental, o exame avança e aponta onde estão as cabeças pensantes.

Ainda assim, resta a dúvida sobre o que uma prova desse gabarito tem a dizer sobre a educação brasileira, às voltas com professores faltantes, conteúdos vencidos e escolas avariadas. A resposta é "tudo": embora não deva nutrir suas políticas educacionais pelo Pisa, o Brasil precisa da prova para se enxergar melhor. Ela é de fato muito difícil para um país que teve adesão débil ao panorama educacional. Mas é justo essa dificuldade que ajuda a perceber em que ponto estamos no campo da ciência e afins. Às falas.

Entre 2000 e 2009, o Brasil subiu 33 pontos no Pisa, 4% – um feito para o país que segurava a lanterninha entre os 65 membros desse certame. Em 2009, vale dizer, fomos o terceiro que mais cresceu no ranking, ultrapassando a Argentina e a Colômbia, o que nos credencia para o nível 2 nas três áreas avaliadas: Leitura, Matemática e Ciências. Mas permanecemos atrás do México, Chile e Uruguai, ocupando o nada alvissareiro 53.º lugar. A pontuação brasileira é 401. A escala chega a 800. Meio caminho.

Em seis níveis do conhecimento, a maioria dos estudantes brasileiros não passou do primeiro degrau. Nenhum chegou ao nível mais alto em Ciências; e 20 alcançaram ao nível 6 em Leitura e Matemática. Traduzindo: 98,2% dos que fizeram a prova não estão credenciados para a categoria "alto desempenho" – mas nada de ler esse número pela ótica do fracasso. Sua lógica é a do paradoxo e Matemática é o caso.

Em 2006, 73% dos estudantes não saíram do nível básico. Em 2009, foram 69%. Ou seja, nos cânones do Pisa o Brasil não se dá bem com os números, mas foi o item em que mais evoluiu. Quem já pisou numa sala de aula sabe que passo de formiguinha conta. E quem acompanha as mazelas do ensino brasileiro não se espanta com essa nota vermelha no boletim da OCDE: tem professor de Geografia ensinando Matemática, área com uma carência crônica de professores. É da missa a metade.

O que mais assusta nos resultados é que estacionar no nível 1 ou chegar a duras penas ao 2 significa que o adolescente compreende apenas o básico. Essa constatação deixa a nervos expostos a escola brasileira: a dificuldade em oferecer um instrumental para o aluno redunda não só em repetência e atraso, mas na invalidez da escola. Sem capacidade de interpretar, é como se a criança e o adolescente nem sequer tivessem passado por lá. Volte o filme.

O momento é oportuno para avaliar o que levou o Brasil a ter pequenos progressos na prova de Leitura e a ter crescido em Matemática. A resposta está em uma continha de mais. No ano 2000, a educação recebia 4% do PIB nacional. Passou para 5,2%. O ideal, para um novo arranque, seria que fosse para 7%, valor que o próprio ministro Fernando Haddad sugeriu antecipar para o ano que vem, preparando-nos, quem sabe, para fazer bonito no próximo Pisa.

A tese é que com uma folga em caixa, a área superou parte do sufoco e começou a respirar sem aparelhos. Essa premissa, por incrível que pareça, nem sempre angaria adeptos. Por mais que se insista em alienar desempenho educacional a investimentos financeiros, sobram indícios de que dinheiro de per si não melhora a escola. Crer nessa relação equivaleria, inclusive, a trair a natureza simples do ensino, mais próxima de uma refeição caseira do que de um banquete com 200 talheres.

Mas esse caso parece diferente. Seria ingênuo negligenciar o impacto do PIB no Pisa e em tudo o mais. Junto com o dinheiro vieram salários menos vexatórios e algum incremento de políticas educacionais voltadas para a avaliação e para aprendizagem. É preciso enxergar melhor essas políticas, sob perigo de creditar os avanços do Pisa única e exclusivamente aos planos de metas, ao balaio de avaliações oficiais ou ao clima algo competitivo e agressivo que tem tomado conta do ensino.

A propósito da "quase festa do Pisa", vale um comentário. De 2000 a 2009, houve uma alteração na, digamos, representação pública da educação. Em outras palavras, a pauta do ensino no país deixou de ser uma sucessão sinistra de fracassos para se impor como uma conversa madura. Seria injusto desdenhar a força desse debate.

Hoje, fala-se mais em avaliação e aprendizagem. O modelo de Cuba ou o modelo de Bloomberg viraram Fla-Flus. Há levas de professores na defesa de currículos adequados à realidade. Os índices de 40% de repetência já não são vistos como punição exemplar aos folgados, mas um mal de raiz. Há quem se empenhe para devolver às instituições a capacidade de gerir a Leitura, da Matemática e da Ciência, as tais a que mede o Pisa

O investimento financeiro, em resumo, veio acompanhado de um investimento na palavra educação. Pode ter sido pequeno, mas tudo indica que fez a diferença. Falemos, e falemos da escola pelos cotovelos. É o grande assunto de 2011.

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