Bastaram dois meses para que a previsão do rombo nas contas públicas para 2023 subisse 25%. No dia 22 de novembro, os ministérios da Fazenda e do Planejamento anunciaram novas estimativas para o déficit primário deste ano, que chegará a R$ 177,4 bilhões, contra os R$ 141,4 bilhões que haviam sido previstos em setembro, na versão anterior do Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas. O novo valor corresponde a 1,7% do PIB, 0,4 ponto porcentual a mais que a previsão anterior. Para um governo que começou o ano falando em um déficit de 1% do PIB, a meta vai ficando cada vez mais difícil de atingir – em boa parte graças aos erros do próprio governo na condução da política econômica.
É verdade que o governo resolveu antecipar algumas despesas para aliviar a pressão fiscal dos próximos anos. É o caso de uma compensação a estados e municípios por perdas de receita causadas pelas mudanças no ICMS dos combustíveis, e do pedido feito ao Supremo Tribunal Federal para que o governo possa quitar um estoque de R$ 95 bilhões em precatórios sem violar regras fiscais, ao contrário do que previa a PEC dos Precatórios, que limitava o valor anual a ser gasto com esse tipo de despesa. A corte já formou maioria pela permissão, mas o julgamento foi interrompido por um pedido de vista. Apenas esses fatores, no entanto, não bastam para explicar a tempestade fiscal em formação.
Não há como colocar a culpa em despesas extraordinárias quando todo o edifício fiscal do país é construído sobre a base do gasto ilimitado e a correspondente busca frenética por qualquer bilhão de reais que possa ser tomado do contribuinte brasileiro
A conta não é nada complicada: ainda que o governo consiga evitar esse tipo de despesa em 2024 sacrificando o déficit primário de 2023, a realidade é uma combinação de arrecadação em baixa e despesas em alta. Por mais que a economia esteja em desaceleração nos últimos meses, o governo continua fiel à crença no mantra dilmista “gasto é vida” e conseguiu cristalizar em lei a permissão para elevar a despesa acima da inflação ano após ano, independentemente de o país estar em crescimento ou em recessão. Falando à Gazeta do Povo, o economista Samuel Pessoa descreveu a situação atual como “o esgotamento de um modelo errado que combinou uma dinâmica de deterioração das contas do governo com projetos de investimentos públicos mal formulados”.
Não há como colocar a culpa em despesas extraordinárias quando todo o edifício fiscal do país é construído sobre a base do gasto ilimitado e a correspondente busca frenética por qualquer bilhão de reais que possa ser tomado do contribuinte brasileiro. A fúria tributária não discrimina, e todos são alvos: das grandes empresas que geram milhares de empregos ao cidadão que faz pequenas comprinhas do exterior pela internet – o “próximo passo”, a julgar pelas declarações do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin. Como, no entanto, o governo não consegue criar tributos e elevar os já existentes da forma como gostaria, a realidade bate à porta e exige os famosos contingenciamentos, que neste ano já chegam a R$ 4,9 bilhões.
Um governo que desconhece o funcionamento básico da economia e princípios como a Curva de Laffer, que explica por que o poder público não tem como elevar indefinidamente a carga tributária, inevitavelmente cria as condições para o caos fiscal a não ser que acorde para a necessidade de otimizar e cortar gastos não de forma esporádica, mas estrutural, com enxugamento do Estado, privatizações e reforma administrativa. Tudo isso, no entanto, é anátema para o petismo. Nessas condições a deterioração da situação fiscal brasileira trará a volta da inflação e, com ela, os juros altos. E então não adiantará nada a Lula espernear contra o Banco Central, que no fim só estará usando a única arma que tem para combater o problema que o presidente e sua equipe econômica criaram.
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