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Um palpite: em 2010, a obrigatoriedade do antigo "colegial" – em trâmite no Congresso –, deve monopolizar o debate educacional. Vai ser um telecatch. E se não for, pelo menos deveria. Ano passado, teve-se uma amostra da temperatura da discussão – um verdadeiro "quebra-pau", abrandado por questões paralelas que acabaram ganhando o primeiro plano, a exemplo da balbúrdia que tomou conta da aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

Tudo indica, porém, que nos próximos meses o assunto "não escapa" e vai andar nas bocas. Por uma questão muito simples: todo o resto, incluindo diminuição da violência e avanços na economia depende da passagem dos 9 anos de ensino obrigatório para 14 anos, reproduzindo aqui uma experiência acertada de países como a Argentina. É mudança ou morte.

Poucos educadores, no discurso, discordam da obrigatoriedade, o que traz aos púlpitos um falso ar de consenso. O governo, inclusive, tem dado provas de boa vontade nesse quesito. Primeiro fez a Lei 11.892 de 2008 – que deu ênfase à educação profissional –, depois a Portaria 971, de outubro do ano passado, criando mecanismos de incentivo a programas que façam avançar o ensino médio. Em paralelo aos revertérios legais, contudo, é preciso envolver a sociedade civil nesse debate, sob risco de que o destino dos 35 milhões de brasileiros entre 16 e 25 anos permaneça onde está, sob a sombra.

Um dos caminhos é aumentar a carga de informação sobre a situação da juventude no país, inibindo a cultura, algo colonial, de fazer pesar sobre os pós-adolescentes a alcunha de "marmanjos", como se a terra onde nasceram não lhes devesse mais nada só porque completaram 18 anos. Ora, nações sólidas como o Japão têm parte de seus êxitos creditados às políticas para a juventude. Aqui, que pena, impera a lógica da lavadeira: quem já pode fazer filhos, que se vire.

O quadro, por tabela, não é dos mais bonitos, e aponta a orfandade crônica imposta aos jovens brasileiros. Por ironia, o banco de dados do governo sobre a moçada está entre os melhores. Sabe-se, por exemplo, que metade da população de 15 a 24 anos já trabalha, o que inibe seu desenvolvimento escolar. Quem duvida, que prove o contrário.

A quantidade de rapazes e moças que pega no batente é de pôr as mãos na cabeça: com a obrigatoriedade do ensino médio, mexe-se na roldana do mercado. Pode-se dar um braço a torcer: a proteção integral à criança e ao adolescente é alvo de críticas ferozes, partidas até de gente ilustrada. Que dirá a garantia do jovem operário às horas de estudo. Fazer avançar essa conversa vai ser tão difícil quanto reconstruir o Haiti.

Não para por aí. Vira e mexe se descobre que o ninho dos infortúnios juvenis no país é a própria escola, um celeiro de exclusão. Há quem suba na mesa ao ouvir isso, mas contra os fatos não há argumentos. Desde que o Ministério de Educação avançou no sistema de avaliação, mais se comprovou a fragilidade no atendimento aos jovens.

Ainda em 2006 se ficou sabendo que o ensino médio – onde o jovem deveria estar – só se safava em municípios entre 200 mil e 500 mil habitantes, dotados de boas universidades públicas e privadas, com capacidade para formar professores que não façam feio diante do quadro negro. Cidade muito pequena tem ensino médio ruim. E cidade muito grande, com exceção de Porto Alegre, não dá conta da clientela.

Para ajudar, de 2005 para cá diminuiu em quase 10% o número de professores formados nas universidades brasileiras. O antigo colegial é o que mais sofre, sentindo, não é de hoje, a carência de profissionais capacitados para lecionar Física ou Química. Não faltam alunos que dizem ter abandonado o ensino médio porque os professores não dão as caras. Outros estudantes revelam algo ainda pior – afirmam não entender a serventia dos conteúdos a que estão expostos na sala de aula.

Na cultura do "marmanjo" o argumento é de que isso é coisa de quem não quer estudar. Mas não há especialista e pesquisador sério que não peça, quase que de joelhos, a reforma de conteúdo escolar nos anos que antecedem à faculdade. A revisão dos currículos do ensino médio – e a sua regionalização – são de tal urgência que ou se faz essa lição de casa ou seremos atropelados por números ainda mais vergonhosos.

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