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A estrutura da política econômica após o sucesso do Plano Real no combate à hiperinflação foi montada sob três pilares básicos: metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante. Iniciada no governo Fernando Henrique, essa política foi mantida no governo Lula e se revelou acertada, pois o país conseguiu banir o fantasma da hiperinflação e obteve crescimento econômico com melhor distribuição de renda. Tudo parecia caminhar bem até que os graves problemas internacionais resultantes da crise imobiliária norte-americana de 2007/2008 e a explosão da crise europeia atual deixassem expostos alguns furos da economia brasileira.

O bom desempenho da economia internacional e as elevações de preços das commodities exportadas pelo Brasil contribuíram para que o país acumulasse US$ 350 bilhões de reservas cambiais, criando uma situação confortável em matéria de contas externas. Isso facilitou o crescimento do PIB e o controle da inflação, já que a boa situação do balanço externo segurou a taxa de câmbio em níveis baixos.

Porém, se num primeiro momento o preço baixo do dólar contribuiu para manter baixos os preços, em reais, dos produtos importados (o que ajudou muito a manter a inflação sob controle), em um segundo momento a taxa de câmbio tornou-se desfavorável aos exportadores. Ao cair abaixo da cotação de R$ 1,60, a taxa de câmbio começou a ameaçar seriamente as empresas exportadoras e assustou as autoridades econômicas. O governo iniciou alguma reação, sobretudo porque o principal parceiro comercial do Brasil, a China, não vem jogando pelas mesmas regras de câmbio flutuante e vem mantendo sua moeda desvalorizada por meio de intervenções do governo.

A reação do governo brasileiro se deu no campo tributário, com o objetivo de conter a excessiva oferta de dólares, cujo destaque foi a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) na venda de moeda estrangeira e a elevação do IPI sobre carros importados. As autoridades de Brasília imaginavam que, assim, tudo caminharia para provocar elevações lentas e organizadas da taxa de câmbio, a fim de melhorar a situação dos exportadores sem encarecer excessivamente os produtos importados e, portanto, sem pressionar a inflação.

Mas o mercado não obedece a boas intenções e há poucas semanas entraram em cena alguns fatos que expuseram a fragilidade estrutural das medidas tomadas pelo governo. Ao tributar as operações de venda da moeda estrangeira, como forma de reduzir os movimentos de oferta, o governo tinha a boa intenção de evitar novas quedas no preço do dólar. Só que essa mesma medida, que parecia boa para conter a queda na taxa de câmbio, criou uma perturbação no funcionamento livre do mercado e, quando a demanda por dólares aumentou expressivamente, os vendedores dessa moeda não apareceram, a oferta não se manifestou nos níveis necessários para suprir a procura de dólares... e a taxa de câmbio "explodiu", passando a barreira de R$ 1,90 na terceira semana de setembro.

O sustou ficou por causa das razões que provocaram excesso de demanda de dólares nas últimas semanas. O agravamento da crise da Grécia; a constatação de que vários países europeus estão em situação parecida com o problema grego, sobretudo o excessivo endividamento do governo; o rebaixamento das notas de bancos europeus que estão na iminência de tomar prejuízos; a falta de perspectiva para as dívidas gregas que se vencerão nos próximos meses e as incertezas quanto à economia norte-americana; esses foram alguns elementos do complicado quadro internacional que levaram os investidores internacionais a venderem os ativos financeiros possuídos no Brasil. Ou seja, o movimento de estrangeiros detentores de títulos brasileiros em busca de vender seus ativos foi bastante grande e respondeu pelo grande volume de demanda de dólares.

O problema é que as mesmas medidas que tinham o objetivo de frear a oferta de dólares, a fim de impedir mais quedas da cotação cambial, agiram exatamente como o governo queria: impedir a elevação da oferta. Só que isso ocorreu no momento em que a oferta teria de se elevar para fazer frente à demanda da moeda estrangeira e, assim, acomodar o movimento de oferta e procura. O mercado livre existe para que essa acomodação ocorra de forma natural, evitando elevações e quedas bruscas de preços, neste caso, o preço da moeda externa.

A questão é: a taxa de câmbio continuará subindo? Não há resposta fácil, pois ninguém pode antever, com alto de grau de acerto, para onde caminhará a confusão europeia nem para onde vai a situação dos Estados Unidos. O máximo que dá para afirmar é que, se ocorrerem novos aumentos na demanda por dólares e o governo mantiver a tributação na venda de dólar, a taxa de câmbio pode oscilar bruscamente para cima. O governo queria elevação na taxa de câmbio. Mas o dólar subiu muito e o governo não quer que suba mais, pois isso pressionaria a inflação para cima e o crescimento do PIB para baixo. Esse é nó que o governo terá de desatar.

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