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| Foto: Nelson Almeida/AFP

Que os planos de governo de candidatos à chefia do Executivo não são levados a ferro e fogo, que se destinaram principalmente à conquista do poder e que as ações de governo não raro destoam dos planos e das falas eleitorais é algo que já se sabia. Um exemplo robusto desse comportamento condenável se deu na eleição presidencial de 2014, quando Dilma Rousseff e seus marqueteiros desconstruíram a candidatura de Marina Silva e, no segundo turno, a de Aécio Neves com críticas e promessas que, após eleita, Dilma viria a descumprir quase que em sua totalidade. A economia estava tão mal que, vencida a eleição, Dilma não esperou nem sequer o dia da posse do segundo mandato para desdizer o que dissera na campanha e tomar decisões opostas ao que havia prometido. Na prática, a presidente foi mais longe na incoerência entre discurso e ação, pois passou a fazer o que seus adversários disseram que fariam, comportamento que custou rápido desgaste de sua popularidade e criou dificuldades para a governabilidade.

Alguns poderiam dizer que a disputa eleitoral é isso mesmo, uma espécie de vale-tudo para conquistar votos, mas o fato é que os planos de governo e as políticas assumidas pelos candidatos produzem efeito na decisão dos eleitores e no destino das candidaturas. Se depois da posse o candidato eleito vai em direção contrária ao que divulgou e nega suas próprias promessas, o resultado é a criação de um ambiente de incerteza, insegurança jurídica e desconfiança dos agentes econômicos. Tal quadro prejudica justamente os que elegeram o governante confiando em seu plano de governo e em suas promessas, desestimula investimentos privados, inibe os negócios e joga a economia em retrocesso. 

O mercado trabalha com informações presentes reais e com expectativas de ações e realidades futuras

É sabido que o sistema produtivo é um organismo complexo, sensível e cheio de armadilhas por suas próprias características. Se o governo colaborar para criar mais confusão, dando menos valor à palavra empenhada e tendo menos seriedade no trato das promessas públicas, a estagnação econômica, o baixo crescimento e a incapacidade de recuperação são consequências normais. No Brasil difundiu-se a crença de que a variação dos preços dos ativos – ações, dólar, taxa de juros e demais ativos – é coisa de especuladores maldosos sem patriotismo, quando na prática se trata da reação negativa às declarações erráticas e à falta de seriedade e confiabilidade nos planos e na palavra dos candidatos. 

O mercado é um sistema de sinais, que trabalha com informações presentes reais e com expectativas de ações e realidades futuras, e é regido por oferta e procura, compra e venda, decisões de investimento, decisões de financiamento, decisões e produção, movimento de capitais etc. O sobe e desce dos mercados e a variação dos preços dos ativos não constituem qualquer problema em si, nem de natureza econômica nem de natureza moral. Há problemas na irresponsabilidade e no comportamento leviano e demagógico de candidatos que descumprem o que prometem, voltam atrás em suas próprias falas e mentem abertamente. Isso aconteceu com Dilma Rousseff, cujo saldo foi ter lançado o país na maior recessão da história já no começo de seu segundo mandato em 2015. 

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Em regimes presidencialistas, nos quais o presidente da República tem um enorme poder monocrático, as atenções são concentradas na figura do presidente, em seu histórico, suas crenças e suas ações. Quando os agentes de mercado – conjunto no qual estão trabalhadores, consumidores, empresários, investidores nacionais, investidores estrangeiros e todos que tomam decisões econômicos – não confiam no discurso, nas promessas e nos planos de governo de determinado candidato, nada mais normal do que a falta de confiança transformar-se em incerteza, risco e insegurança jurídica, com toda sorte de consequências sobre as decisões de investimento, de produção e de preço. 

A mania que se criou no Brasil de culpar o mercado quando os preços de ativos sobem e descem de maneira errática se assemelha a culpar as árvores pelo incêndio na floresta. É preciso remontar às causas dos movimentos de mercado, e em geral elas estão no comportamento, nas decisões e nas ações dos homens que governam ou que estão na iminência de governar o país.

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