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Nem mesmo os escândalos sobre os diários secretos tiveram o efeito de moderar a vontade dos deputados estaduais em aprovar projetos de lei inconstitucionais. Na última terça-feira, dia 23, os parlamentares derrubaram, por maioria, três vetos do governador Roberto Requião ao projeto que estabeleceu o Plano de Cargos e Carreiras dos Servidores do Tribunal de Contas. O projeto tinha sido aprovado pelos parlamentares em dezembro passado. Requião havia vetado dispositivos do projeto por entender que eram inconstitucionais.

O ponto mais polêmico trata do pagamento de gratificações de até 80% – que são pagas a funcionários de nível superior – para servidores concursados em funções de ensino médio. Pelo projeto, terão direito a receber as gratificações servidores com diploma de ensino superior, que tenham ingressado no Tribunal de Contas por concurso público de nível médio, mas que estejam exercendo funções relativas a cargos de ensino superior. Ocorre, entretanto, que a Constituição da República proíbe que servidores aprovados em concurso para exercer cargos de nível médio sejam promovidos para funções de nível superior sem precisar passar por nova seleção. Tal irregularidade chama-se desvio de função. Daí, a inconstitucionalidade do projeto.

O zelo pela Constituição parece não estar na ordem do dia dos deputados. É o que se pode inferir não só da aprovação de um projeto cujas irregularidades são evidentes. O projeto foi aprovado sem debates sobre os motivos do veto do governador. Não interessa aos políticos que hoje estão na Assembleia Legislativa examinar com seriedade a legalidade dos projetos que aprovam. Recusam-se a desempenhar seu papel fiscalizador.

Chega a ser curioso, entretanto, o fato de os deputados estaduais arcarem com o ônus político de derrubar vetos a um projeto que atende aos interesses de uns poucos servidores do estado, cujo custo está estimado em R$ 23 milhões por ano. Os parlamentares não se importam com o juízo que os eleitores possam fazer de seus atos. Estão mais preocupados em agradar à Corte de Contas estadual – órgão que tem entre suas competências a análise do uso de dinheiro público por políticos.

Mas a derrubada dos vetos pode ser corrigida pela Justiça. E o próprio governador já anunciou que, assim que o projeto se tornar lei, irá à Justiça contra ele, com uma ação direta de inconstitucionalidade.

A medida anunciada pelo governador não foi bem acolhida pelos parlamentares. Em matéria da Gazeta do Povo de quarta-feira, o deputado Elio Rusch disse: "Ele (o governador) que cuide do final do seu governo que nós cuidamos da Assembleia. Ele que não venha dar ordens aqui". As declarações de Rusch nos tempos de crise que vive a Assembleia são emblemáticas. Indicam o nível de desorientação republicana que atingiu os deputados da atual legislatura.

Primeiro, porque os escândalos dos diários secretos são a maior evidência de que os parlamentares não estão tratando bem a Casa do Povo. Segundo, porque o sistema de repartição dos poderes existe justamente para corrigir abusos praticados por um dos poderes. E, neste momento, o Poder Executivo está exercendo um papel legítimo, ao anunciar que irá ao Poder Judiciário pedir que se pronuncie a respeito.

A impressão que fica de tudo isso é que o Legislativo paranaense resiste a tomar cons­­ciên­­cia da crise por que está passando. Relega a um segundo plano justamente o seu papel de fiscalizador, aquele que poderia mostrar a relevância do Poder Legislativo. Dificilmente uma mudança substancial ocorrerá na Assembleia Legislativa neste ano de eleições. Mas, em algum momento no futuro, o Legis­­lativo paranaense vai ter de redescobrir o seu papel na democracia do século 21. Ou estará fadado à irrelevância.

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