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A semana que passou foi agitada por novas e constrangedoras revelações sobre o que se passa no interior do governo paranaense. Ganhou destaque e produziu conseqüências a carta endereçada ao governador Roberto Requião pelo ex-procurador geral do Estado, Sergio Botto de Lacerda, que, de acusado de prática de um grave desvio funcional, acabou por protagonizar um fenômeno de transmutação radical, tornando-se acusador. E, como tal, com a autoridade de quem privou até a véspera da intimidade do poder, confirmou a existência de um quadro que adjetivou como sendo de omissão, permissividade e corrupção.

A primeira e inevitável conseqüência, lógico, foi a demissão voluntária do próprio acusador dos cargos que ocupava. Mas não foi a única e nem a mais importante. Mais importante foi dar ensejo à confirmação definitiva de que se tornou inadiável instaurar-se um processo de investigação sobre a atuação do governo em seus aspectos ético, político e administrativo. Há um numeroso volume de fatos que evidenciam esta necessidade – todos eles não esclarecidos porque submersos numa complexa teia protetora em que pontificam a absoluta falta de transparência e a maioria submissa dos deputados estaduais.

Se interessa saber sobre a moralidade que envolve a aplicação dos escassos recursos colocados sob a gerência do governo, interessa também analisar os atos administrativos, as políticas e as posturas públicas dos nossos governantes. É um direito legítimo e natural que se confere à sociedade num regime democrático – especialmente quando, no caso paranaense, muitos dos atos guardam a aparência de estar contaminados ora por desvios éticos, ora por desacertos que comprometem o desenvolvimento presente e futuro do estado.

Assim, é de se esperar sejam analisados à exaustão casos como o das despesas aparentemente excessivas e injustificáveis com cartões corporativos, que ascendem à casa dos R$ 210 milhões em quatro anos, ou o dos mais de R$ 500 milhões que foram destinados a organizações não-governamentais, dentre as quais (porém não únicas) se incluem as meritórias Apae’s. Ou ainda se de fato se justifica a expansão em 77% do quadro de servidores estáveis do Executivo durante a gestão anterior do mesmo mandatário.

Ao mesmo tempo, é necessário que se examine com isenção técnica se foram corretas dos pontos de vista jurídico e econômico as decisões unilaterais de romper contratos com agentes privados que formavam parceria com o Estado em projetos rodoviários, energéticos e de saneamento – ou se tais embates não significam a acumulação de passivos judiciais a serem futuramente pagos à custa do sacrifício de projetos de vital importância para a sociedade paranaense. É preciso que se verifique, neste mesmo diapasão, o quanto custarão às futuras gerações as demandas que hoje se travam com o banco Itaú, quando se constata que, já agora, em razão de tais demandas, o Estado se vê impedido de receber repasses de verbas federais.

É igualmente preciso que sejam colocados sob lupa comportamentos que não se deveriam esperar de governantes que juraram obediência às leis e se comprometeram com a manutenção da ordem constitucional. Enquadra-se neste prisma a questão exemplar das invasões de propriedades rurais, sobre a qual o que se registra é uma recorrente, perigosa e metodológica desobediência às ordens judiciais de reintegração de posse – comportamento, aliás, de que resultaram duas mortes há pouco mais de 20 dias.

Assim, é mais do que plausível que as oposições – como agora se ensaia – se unam com vistas ao esclarecimento completo desse quadro. Que, as demais instituições de Estado e entidades civis, aí incluídos o Tribunal de Contas, o Ministério Público e a OAB, se juntem no esforço de utilização dos mecanismos legais e democráticos disponíveis para superar a penosa e paralisante conjuntura que hoje vivemos no Paraná. Que os parlamentares que se alinham politicamente com o governo alinhem-se também (ou sobretudo) com o interesse público e exerçam o papel fundamental que lhes foi delegado pelo voto – isto é, o de fiscalizar o Poder Executivo.

O que não se deve permitir é a passividade diante de tudo quanto se assiste. Não faz bem para o Paraná e nem condiz com o status de democracia que a duras penas reconquistamos no país.

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