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A cansativa discussão que se faz no Pa­­raná em torno da montagem das chapas de candidatos às eleições majoritárias deste ano tornou-se o exemplo pronto e acabado da falência do sistema político-partidário vigente no Brasil. Alianças são tentadas entre partidos e seus líderes com base em puros cálculos matemáticos sobre o que é mais proveitoso. Doutrinas partidárias, princípios, programas e propostas de governo não são o objeto principal das negociações, mas sim os modos e artimanhas mais convenientes para a conquista e a divisão do poder. A coerência interna dos "ajuntamentos" de legendas em relação àquilo que, por exemplo, entendem como interesse público, se reduz à mais pungente insignificância.

Esse cenário merece uma tradução, po­­den­­do-se recorrer a Maquiavel para torná-la bastan­­te precisa: ele é resultado da ação prática do axioma amoral que tornou célebre, desde a Re­­nascença, o conselheiro do príncipe de Florença, segundo o qual os fins justificam os meios. Se o fim é alcançar o poder, o mais importante a fazer é unir forças – ainda que intrinsecamente contraditórias – para derrotar o adversário.

Mais: trata-se de um jogo que se trava a portas fechadas, entre um punhado de pessoas dis­­postas a distribuir e dividir as cartas de acordo com o que lhes parece mais eficaz. O povo? O po­­vo é apenas um detalhe, ao qual será dado pa­­ra comer o prato feito, preparado no caldeirão que mistura e cozinha o oportunismo político e a conveniência eleitoral. Aos eleitores ca­­berá tão somente a tarefa mecânica de votar num ou noutro sem conhecer-lhes sequer o sabor – sabor que seria representado pelas ideias e pelas propostas. Pois, nesse sentido, nada ocorreu que fosse de conhecimento público.

Embora tal situação se mostre de maneira aguda no Paraná, ela não é muito diferente na maioria dos estados. Não se circunscreve, também, apenas às disputas regionais, mas al­­cança a esfera nacional, como se vê agora com a questão que envolve a escolha do candidato a vice-presidente na chapa do presidenciável José Serra. Não parece haver, nesta contenda que prende a atenção da imprensa nas vésperas da decisão obrigatória, preocupações quan­­to a questões essenciais, mas sim quanto à necessidade de sobrevivência destes ou da­­queles partidos, destes ou daqueles nomes.

Culpa da política fisiológica tão corrente no país? Certamente. Culpa também de um sistema arcaico que não valoriza o pensamento, não corresponde às correntes de opinião nacional, não reproduz na essência, na forma de programas partidários, os desafios sociais, e, portanto, não compromete os filiados aos inúmeros – exageradamente inúmeros – partidos em ser fiéis aos pálidos "princípios" que dizem defender. Desse ponto de vista, tanto faz, na grande maioria, ser filiado a esta ou àquela le­­genda. Então, é melhor filiar-se àquela que apresente maior vantagem.

Infelizmente, não se vê no horizonte uma porta de saída digna do que melhor atenderia ao interesse público, pois ela só seria possível mediante uma reforma política ampla e séria. Algo que, convenientemente, os políticos adiam discutir. Não é assim que se constrói a democracia que merecemos.

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