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Desde a última sexta-feira, o Paraguai tem um novo presidente – o ex-bispo católico Fernando Lugo. Na presença de 11 chefes de estado, dentre os quais o presidente Lula, e de representantes de uma centena de países, com ele assumiu igualmente a esperança do povo paraguaio e das nações vizinhas de que, naquele momento, iniciava-se também uma nova e mais promissora fase tanto da história paraguaia quanto de suas relações com os vizinhos, especialmente com o Brasil.

Nem mesmo para aqueles que viram com reservas a pregação radical de Lugo durante a campanha presidencial ou para aqueles que nele enxergam um novo representante do populismo retrógrado reinaugurado e estimulado pelo venezuelano Hugo Chávez – não é justo nem sensato, neste momento, apostar no pessimismo. Há de se dar o devido tempo para que, no exercício efetivo do poder e no embate interno das heterogêneas forças políticas que o apoiaram, mostrem-se os rumos reais que o novo governo pretende imprimir.

É claro que, a partir de agora, o Brasil terá de lidar com uma nova realidade, certamente permeada pela visão político-ideológica do ex-bispo Lugo, afinada com a esquerda católica representada pela Teologia da Libertação, e pelo que isto pode significar em termos de mudança nas nossas relações após o término das seis décadas do regime instalado pelo presidente Stroessner e sustentado pelo Partido Colorado.

Por isso não cabe otimismo exagerado, pois que este é um sentimento próprio dos mais ingênuos. Portanto, também não é o caso de cultivá-lo. A postura mais aconselhável é a da cautela misturada àquela esperança a que nos referimos no início, já que o tamanho dos problemas a serem enfrentados internamente por Lugo para cumprir as promessas de melhorar a vida de seu pobre povo é tão grande quanto são as ainda insondáveis repercussões externas que seu governo pode deflagrar no continente. Nesse caso, de modo especial, para o Brasil.

É claro que interessam ao Brasil o desenvolvimento econômico e social do Paraguai, a sua estabilidade política e a implantação de padrões éticos minimamente aceitáveis no lugar dos viciados métodos de aproveitamento do poder pelas velhas oligarquias locais. São essas as condições essenciais para que se instale clima propício para o diálogo digno e produtivo entre os governos de ambos os países – sem o quê se tornará impossível a resolução rápida, eficaz, perene e pacífica de problemas que também nos afetam.

Não são poucos esses problemas. O primeiro deles refere-se à antiga e encalacrada questão de natureza criminal que se dá em nossas fronteiras e da qual sofrem diretamente o Paraná e o Mato Grosso do Sul. As facilidades com que contam em território paraguaio fizeram prosperar ao longo das últimas décadas, de maneira assombrosa, o contrabando, o roubo de carros e o tráfico de drogas e armas. Os esforços do governo brasileiro para conter esses crimes serão sempre infrutíferos se não houver o principal, isto é, o empenho ainda maior do Paraguai.

Preocupa-nos também o tratamento que será dispensado à imensa comunidade de brasileiros que se dedica ao cultivo da terra no vizinho país, responsável pela maior parte da sua produção agrícola e, conseqüente, de ponderável parcela da riqueza legal do Paraguai. Correntes radicais que pregam a reforma agrária a qualquer custo, incluindo as invasões, o confisco de propriedades e a expulsão dos brasiguaios, fizeram parte da legião de apoiadores que levou Lugo ao poder. Elas querem agora que o novo governo lhes dê a contrapartida.

Mas o ponto com maior potencial para causar forte estremecimento nas relações bilaterais diz respeito ao futuro do Tratado de Itaipu. A revisão deste tratado, firmado em 1973 e válido até 2023, foi a pedra angular da pregação político-eleitoral do novo presidente. Mas nos termos em que foi proposta – isto é, a multiplicação por oito dos valores que o Brasil repassa ao Paraguai por conta da propriedade comum das águas do Rio Paraná que geram a energia de Itaipu – são simplesmente inaceitáveis. A diplomacia brasileira terá de ser firme para evitar as concessões requeridas pelo Paraguai e hábil o suficiente para que isto não se transforme em motivo para um indesejável abalo nas relações entre ambos os países.

Cabe ao Brasil não apenas torcer para que prevaleça o clima de amizade e de recíproca boa-vontade, de contribuir para que Fernando Lugo resgate seu país da pobreza e da injustiça e assegure ao seu povo o estágio de desenvolvimento social que merece.

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