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A aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 351/09 pelo ple­­nário da Câmara dos Deputados em segundo turno, na última quarta-feira, é mais um passo para uma descabida mudança nas regras para o pagamento das dívidas dos governos com a sociedade – os chamados precatórios. O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Brito, resumiu de maneira marcante, em duas frases, o grau de perplexidade da sociedade com este fato: a chamada PEC do calote "deixa de luto o estado democrático de direito" no país, e representa "o maior atentado já perpetrado à democracia desde a ditadura militar".

A PEC, que ainda será votada em dois turnos pelo Senado, institui o leilão com enorme deságio para o pagamento das dívidas governamentais, não deixando alternativa para quem tem créditos a receber. Em resumo, este mecanismo abre brecha para que não sejam mais pagos os débitos públicos em seus valores reais ou em patamares aceitáveis, conforme sentenciado pela Justiça.

Nas palavras do presidente da OAB, a apro­­vação da matéria dá carta branca aos governantes, tornando os devedores imunes às sentenças transitadas em julgado, o que "apequena o Judiciário". De fato, o que deveria ser o título mais seguro do país, pelo seu amparado na coisa julgada, transforma-se em moeda podre. Além disso, cria-se ainda um insano leilão de sentenças, em que "o comprador é exatamente o infrator".

Segundo o texto aprovado, a PEC tira praticamente quase todas as possibilidades legais dos legítimos credores a cobrarem suas dívidas. Permite a estados e municípios, por exemplo, limitar o pagamento mensal de precatórios a porcentuais de sua receita corrente líquida. Mais: enquanto os estados e municípios fizerem pagamentos de precatórios por meio desse regime especial não poderão sofrer sequestro de seus recursos, a não ser em circunstâncias muito específicas.

Cálculos do Supremo Tribunal Federal (STF) indicavam, um tempo atrás, que o passivo de precatórios a pagar era de mais de R$ 60 bi­­lhões no país. Já a OAB calculou o montante, mais recentemente, em R$ 120 bilhões. In­­dependentemente das cifras, é possível observar que a dívida dos poderes executivos com a sociedade é imensa. E que os prejuízos serão enormes para quem tem algo a receber. O novo regime de pagamento de dívidas colocará muitas empresas em risco de quebra e fará muita injustiça a milhares de pessoas físicas.

É bastante provável que o Senado siga a votação da Câmara, porque esta votação foi muito bem articulada entre os líderes partidários e governantes de todas as instâncias. Afinal, todos os que estão no poder são os grandes interessados, especialmente os que agora são parlamentares, mas que pretendem conquistar cargos no Executivo nas eleições de 2010.

Se a absurda proposta tiver também o aval do Senado, teremos mais uma prova do espírito de corpo que rege as decisões tomadas em Brasília. Um espírito que não cede espaço para o interesse da sociedade nem se envergonha de praticar a injustiça.

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