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Em meio aos reiterados protestos da sociedade contra desvios de comportamento no uso de recursos públicos, há duas semanas a Frente Parlamentar Mista de Combate à Corrupção decidiu arregaçar as mangas e aproveitar o momento para cobrar agilidade de autoridades em apresentar medidas moralizadoras da política nacional. O grupo, formado por 50 deputados e senadores, pretende criar o Pacto de Combate à Corrupção entre os três poderes. Embora não se duvide das boas intenções dos parlamentares integrantes da frente, de nada adiantará se não forem modificados alguns pontos de vital importância para um ambiente político republicano. É evidente que o país necessita de mais transparência, efetividade nas punições de crimes financeiros e contra a administração pública, fortalecimento dos mecanismos de controle e redução intensa do número de cargos comissionados.

Atualmente há mais 20 mil cargos em comissão, ocupados por indicação política no governo federal, um número monstruoso quando comparado a outros países. Pesquisa realizada há uns cinco anos pela ONG Transparência Brasil mostra que os Estados Unidos possuem aproximadamente 12 mil cargos comissionados e países europeus, como Inglaterra e França, trabalham com cerca de 500 comissionados. O reflexo desse inchaço político no serviço público é conhecido – aparelhamento de ministérios por aliados políticos, o que acaba gerando denúncias de corrupção. Os indicados políticos geralmente estão descompromissados com a administração pública, mas muito comprometidos com estruturas partidárias viciadas, cujo objetivo é o uso dos ministérios para fins meramente eleitorais ou, pior, para fins estritamente pessoais.

Uma redução drástica no número dos comissionados reduziria esse problema, ao mesmo tempo em que estimularia uma melhora no serviço público brasileiro. Vale lembrar que em pesquisa recente do instituto suíço IMD, publicada pela Gazeta do Povo, o Brasil ficou em quinto lugar entre os piores serviços governamentais, em uma análise que levou em conta 59 países ricos e emergentes. Um dos fatores atribuídos por especialistas a esse mau resultado é justamente o uso das estatais para acomodação política, como moeda de troca para apoio e formação de uma base aliada no Congresso. Ao retirar técnicos em função de comando, os indicados políticos acabam por interferir negativamente no funcionamento do Estado.

No que se refere à transparência pública, há a necessidade de aprovação da Lei de Acesso a Documentos Públicos que está parada no Senado. É importante que as tentativas de se impor o sigilo eterno – defendidas por alguns senadores, entre eles Fernando Collor de Melo (PTB-AL) e Sérgio Souza (PMDB-PR) – sejam afastadas por completo. Um ambiente genuinamente republicano requer transparência ampla dos atos governamentais.

O fortalecimento dos mecanismos de controle mostra-se uma solução de extrema relevância. São órgãos como a Controladoria-Geral da União e o Tribunal de Contas da União que vêm sendo os responsáveis pela detecção de indícios de irregularidades no país. Melhorar a estrutura da fiscalização e despolitizá-los por completo, em especial os tribunais de contas, cuja indicação de ministros e conselheiros se dá por critérios políticos partidários e não por conhecimento técnicos e mérito, são medidas necessárias para facilitar o controle.

Talvez as medidas mais complexas e mais difíceis tecnicamente de serem implantadas são as que se referem à busca pela efetividade na punição de crimes financeiros contra a administração pública. Seria importante discutir neste momento a criação de varas especializadas para lidar com esses crimes. Ainda, estabelecer regras e procedimentos que facilitem o trabalho investigativo do aparato policial, a fim de evitar nulidades na coleta de provas, como ocorreu no caso da Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que investiga uma série de denúncias de crime financeiro contra integrantes da família Sarney.

É certo que todas essas medidas precisam ser debatidas com a sociedade, para que não venham a frustrar expectativas geradas. É certo também que medidas, como a redução de cargos comissionados venham a ser totalmente descartadas pelo Executivo, dada a cultura patrimonialista dominante. Mas é imprescindível que se inicie a discussão e que haja pressão para a realização de mudanças. Nesse sentido, é importante o trabalho da frente parlamentar de combate à corrupção. Só assim, com propostas de transformação das instituições e um esforço para a sua implementação é que o combate aos desvios da administração pública pode se tornar eficaz.

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