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Na quarta-feira, as 81 excelências que compõem o Senado da República vão decidir sobre o destino a ser dado ao mandato do presidente da Casa, Renan Calheiros, acusado de ter afrontado regras do decoro parlamentar. Segundo o minucioso relatório de 70 páginas aprovado por maioria esmagadora no Conselho de Ética na semana passada, o político alagoano teve despesas pessoais pagas por um lobista, cometeu irregularidades tributárias, apresentou documentos falsos e mentiu para seus pares – atos notoriamente inconcebíveis para alguém que reúne as condições institucionais de presidir o Congresso Nacional e de ser o quarto homem na linha de sucessão em caso de vacância da Presidência da República.

A sessão plenária e o voto serão secretos, como determina a legislação. Do segredo com que se revestirá o ato de julgamento emergem agudas e pertinentes preocupações quanto à possibilidade de não se fazer justiça – entendida aqui, frise-se, não como sinônimo de linchamento puro e simples do indigitado senador, como clama vasta camada da opinião pública bem informada, mas como expressão sincera da consciência dos senadores, elevados transitoriamente à posição de juízes, quanto à sua responsabilidade primordial de preservar a respeitabilidade da instituição democrática de que são membros.

Trata-se, é verdade, de um julgamento político e a pena prevista em caso de inculpação do réu cinge-se também ao aspecto político. É desta forma, isto é, política, que o caso do senador Calheiros vem sendo tratado, daí derivando, porém, os perigos que cercam a expectativa de que, também politicamente, se faça a mais adequada justiça.

Explica-se este temor ao se constatar que, ao lado da sincera disposição de muitos senadores de defender a higidez ética e moral da instituição, desenvolveram-se ao longo dos três meses de agonia do colega desmedidos esforços, internos e externos, para mantê-lo no mandato e no cargo de presidente. Esforços estes inspirados em interesses e conveniências políticas cujo valor, certamente, são incomparavelmente menores em relação à principal causa em jogo neste episódio – ou seja, exatamente a preservação da dignidade do Parlamento, um dos três pilares fundamentais da democracia.

Observa-se, por exemplo, a atuação de última hora do próprio senador Renan Calheiros e de amplos setores do seu partido, o PMDB, oferecendo-se ao Poder Executivo como moeda de troca. Pretendem obter deste um trabalho de convencimento para que sua base vote pela inocência do parlamentar e, em contrapartida, oferecem-se para garantir ao governo tranqüilidade nas votações de matérias que propuser ao Congresso. Por outro lado, dentro do governo, há quem defenda a permanência de Renan sob o argumento de que, salvando-o da degola, manter-se-á o Senado sob situação de fragilidade permanente – o que também serviria aos intuitos de dominação tão ao gosto de setores de tendência totalitária presentes no poder central.

Definitivamente, não é este jogo de interesses, que nada tem a ver com o clamor de moralização da política que emerge das ruas, que se espera ver no Senado da República nesta semana decisiva. Espera-se que o voto secreto não sirva de cobertura para as acomodações corporativistas e que o resultado do julgamento reflita a melhor expressão da consciência dos senhores senadores quanto à dignidade do próprio mandato e da instituição que representam.

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