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As transformações do mundo rural e do mundo do emprego urbano criaram um ambiente para a discussão sobre o reassentamento de agricultores afastados do meio rural. Por si só, o retorno ao campo e a redistribuição das terras que não cumprem sua função social, conforme determina a Constituição Federal, não garantem sucesso à reforma agrária, por razões que vão além da falta de apoio aos assentados ou da vocação diversa dos novos sem-terra.

A Gazeta do Povo mostrou que o número de agricultores assentados no Paraná caiu drasticamente na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Diante de uma aparente redução da população nos acampamentos do estado, o governo federal está desapropriando terras mais baratas em outras unidades da federação, principalmente no Centro-Oeste, onde também não faltam interessados em atuar na atividade rural. Em âmbito nacional, o programa segue ritmo compassado há 16 anos.

O ideal seria abrir espaço no campo – vocação estrutural da economia paranaense – para todos que possam de alguma maneira atuar de forma social e financeiramente sustentável. No entanto, essa tarefa se tornou mais difícil pela própria evolução da agropecuária do Paraná e das demais regiões produtivas do país.

Para se estruturar uma pequena propriedade em regiões reconhecidamente viáveis, é necessário um investimento considerável. Em regiões onde o hectare de terra se valoriza a cada ano, um lote da reforma agrária pode custar mais de R$ 200 mil. Por outro lado, filhos e netos de agricultores que permanecem no campo e dispõem desse patrimônio relatam renda relativamente baixa na comparação com o que um pequeno negócio ou um bom emprego no meio urbano podem oferecer.

No meio rural, remunerações acima de R$ 2 mil ao mês são consideradas exceções. Para que os agricultores assentados cheguem a esse patamar de renda, além do investimento na terra, é necessário qualificação, estruturação das novas propriedades e cuidado extremo na escolha da atividade a ser desenvolvida, o que exige estudo de mercado e planejamento. Não é essa a realidade de muitos beneficiados pela reforma agrária que se deparam com a realidade competitiva da produção agrícola. O próprio comércio de lotes da reforma agrária é um indício desse problema.

A demanda por alimentos é claramente crescente, mas a margem de lucro torna-se cada vez mais estreita. Não existem culturas permanentemente lucrativas. No caso de alimentos destinados ao mercado interno, como feijão, batata, cebola, são registrados anos vantajosos mas também períodos de prejuízo certo. No caso de culturas como a soja e o milho, que seguem cotações determinadas pelo mercado global, a corrida pela produtividade faz com que apenas a produção em larga escala seja apontada como um bom negócio. Se no primeiro caso é necessária diversificação – e conhecimento especializado em diversas áreas – no segundo o investimento em grandes propriedades torna a desapropriação mais onerosa do que o orçamento público pode suportar.

As transformações do mundo do emprego formal, por sua vez, estão tornando o ambiente urbano novamente receptivo à população sem qualificação. Diante da falta de trabalhadores com instrução específica, a tendência é que sejam abertas oportunidades para aqueles que possuem simplesmente interesse em determinada área. Diante das incertezas do meio rural, a presença mais próxima dos aparelhos do Estado acaba representando uma vantagem. Além disso, programas como o Bolsa Família podem estar permitindo que a população que chega aos centros urbanos tenha condições de insistir em diferente atividades antes de voltar para o meio rural ou se candidatar a novos assentamentos.

A redução no número de famílias assentadas não reflete apenas o descumprimento dos planos da reforma agrária. Mostra que o programa se depara com transformações rurais e urbanas que não podem ser desconsideradas. Pelo contrário. Essa nova realidade, bem diferente da que se impunha pela força do êxodo rural nas décadas de 70 e 80, exige uma reavaliação da política que atende aos trabalhadores sem-terra. O risco é de os assentados, ao invés de reconquistarem espaço e uma vida digna, se defrontarem com a pobreza, que pode ser mais cruel em regiões afastadas da estrutura pública de assistência social e de saúde.

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