
Nas últimas semanas, muito se falou sobre o Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês), seus discursos, ideias, debates e, principalmente, sobre a proposta de reformar o capitalismo para adequá-lo às exigências sociais e ambientais do mundo moderno. O Fórum é uma organização sem fins lucrativos e, embora tenha ramificações em outros eventos, reuniões e congressos, sua expressão máxima são as reuniões anuais realizadas na cidade de Davos (Suíça),com a presença de empresários, políticos, economistas, ambientalistas, cientistas, jornalistas e intelectuais diversos, com a finalidade de debater os temas mais relevantes para o mundo, e de onde saem documentos, manifestos e propostas.
O Fórum foi fundado em 1971 pelo economista Klaus M. Schwab, professor na Universidade de Genebra, em função de sua preocupação com os problemas do planeta e a conclusão de que era preciso haver um debate mundial que tivesse repercussão no maior número possível de países e nas políticas e práticas de governos, empresas e organizações sociais. A julgar pela importância dada aos resultados do WEF, o objetivo de seu fundador vem sendo atingido. Muito já foi publicado nos mais diversos meios de comunicação e informação, mas o tema essencial derivado da reunião deste ano pode ser resumido como a “necessidade de reformar e aperfeiçoar o capitalismo”, a fim de que seu funcionamento obedeça a novos princípios norteadores.
Desde quando Karl Marx produziu a mais contundente análise sobre os defeitos do capitalismo – especialmente a crença de que o sistema beneficiava os proprietários dos meios de produção e a elite que o conduzia, à custa do sofrimento e empobrecimento dos operários –, as alternativas, sobretudo as experiências socialistas reais, se revelaram desastrosas, não resolveram o problema da pobreza e descambaram em violência e assassinato de milhões de pessoas. O capitalismo pode ser definido, simplificadamente, como um sistema fundado no direito de propriedade privada dos meios de produção, na organização empresarial do processo produtivo, no trabalho assalariado e no mercado livre. Por “mercado livre” deve-se entender o livre jogo de oferta, procura, competição e formação de preços nos mercados de bens, serviços, trabalho, crédito, ideias e negócios.
O capitalismo pautado na liberdade dele decorrente se tornou um sistema capaz de enriquecer os países e melhorar o padrão de vida dos próprios operários, mas não está livre de defeitos
Já o socialismo real (ou comunismo, como o exemplo da experiência soviética, já que as duas palavras são usadas ora significando a mesma coisa, ora com nuances diferentes) seria um sistema coletivo de produção, sem a propriedade privada dos bens de capital, sem livre mercado de trabalho, produção comandada pelo Estado, controle centralizado da oferta, da procura e dos preços. Em resumo: uma economia planejada, controlada e dirigida ditatorialmente pelo sistema estatal. Em sua ideia mais pura, nunca testada, até o mesmo o Estado seria eliminado e tudo seria comunitário, pois, segundo o próprio Marx, o Estado seria ele próprio uma classe privilegiada, uma elite com poderes de expropriar e submeter o operariado.
Comunismo puro, sem nenhuma classe e sem a existência do próprio Estado, nunca existiu; logo, não passa de uma ideia jamais submetida às agruras da vida real. Quanto ao socialismo real, como o testado durante 70 anos na União Soviética, mesmo com a estatização da maior parte dos meios de produção, continuaram existindo, em alguma escala, a propriedade privada, a produção feita por particulares e as trocas livres. Os ditadores comunistas assim admitiam porque, como havia alertado o economista Ludwig von Mises em 1923, sem mercado não há formação de preços relativos, sem preço não há cálculo econômico e, sem cálculo, não há sistema funcionalmente viável.
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Ao longo de sua história, o capitalismo mostrou sua capacidade de aumentar o produto/hora do trabalho, promover o rápido crescimento da produção nacional e elevar o produto por habitante (mesmo com o rápido crescimento da população mundial). Ademais, o capitalismo pautado na liberdade dele decorrente criou enorme revolução no progresso da tecnologia e se tornou um sistema capaz de enriquecer os países e melhorar o padrão de vida dos próprios operários. Mas o capitalismo não está livre de defeitos, entre os quais há quatro incomodando as pessoas preocupadas com o bem-estar da humanidade e os rumos do planeta: a desigualdade de renda, a pobreza, o desemprego e os prejuízos ambientais. Convém mencionar que o mundo tinha 1 bilhão de habitantes há apenas 190 anos, ou seja, em 1830. Hoje já são 7,7 bilhões, e a necessidade de sustentar tanta gente responde, em parte, pelos próprios defeitos do sistema capitalista.
De certa forma, os problemas do capitalismo – assim como os problemas das sociedades em geral – são reflexos dos vícios individuais e equívocos coletivos. Egoísmo, ânsia de poder, insensibilidade social e a busca desesperada por riqueza são traços dos seres humanos, com variações derivadas das diferenças individuais, e certamente estão e estarão presentes em qualquer sistema. Mas foi o comunismo tal qual conhecido nas experiências reais onde ele foi implantado que permitiu a revelação da pior característica do ser humano: a vocação para a violência e o extermínio de vidas humanas. Somente essa razão já basta para se buscar o aperfeiçoamento do capitalismo e das liberdades individuais e sociais.
Schwab surge, então, com a proposta do chamado “capitalismo de todas as partes interessadas”: acionistas, dirigentes, trabalhadores, clientes, fornecedores, governo, sociedade e o meio ambiente. Isto é, à medida que as nações onde o capitalismo for aperfeiçoado consigam reduzir a desigualdade, diminuir a pobreza, proteger os desempregados vítimas da tecnologia e automação, incorporar os perdedores, reduzir a corrupção e proteger o meio ambiente, mais o sistema de livre empresa e livre mercado prosperará e impedirá o crescimento das propostas totalitárias, ditatoriais e ceifadoras das liberdades humanas e direitos individuais. A opção tão divulgada de “socialismo e liberdade”, entendendo por socialismo aquilo que ele é, não as ideias bonitas de preocupações sociais, simplesmente não existe.



