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O tumulto ocorrido no sistema aéreo brasileiro há poucos dias, com atrasos e cancelamentos de voos que prejudicaram e irritaram milhares de passageiros, deve soar como alerta para um fantasma que assombra o país o tempo todo: a precária situação da infraestrutura e o risco de novos colpasos, os tais "apagões". Há duas categorias deles. Aqueles que afetam diretamente a população e, por isso, ganham mais visibilidade, e aqueles que estão aí, meio escondidos, mas que retrasam o crescimento econômico. O apagão de energia e o apagão aéreo são exemplos dos primeiros, enquanto o esgotamento dos portos faz parte dos segundos, todos com potencial de frear o aumento Produto Interno Bruto (PIB) nos próximos anos.

Os problemas no sistema áereo vão e voltam e estão aí para demonstrar que, se o Brasil tentar crescer continuamente a 5% ao ano, certamente não irá conseguir. Este é um bom momento para lembrar que dois anos atrás o presidente Lula anunciou que o governo adotaria duas me­­di­­das: a licitação para transferir à iniciativa privada a operação e a administração de alguns aeroportos e a transferência da construção e operação de um novo aeroporto em São Paulo para investidores privados. Naquela ocasião, a fala presidencial indicava que o governo deixaria de lado a costumeira cantilena ideológica e tomaria medidas boas e necessárias para reduzir gargalos na infraestrutura aeroportuária. Infelizmente, o assunto morreu e o discurso do governo foi apenas mais bravata verbal.

Os atrasos e os cancelamentos de voos dos últimos dias foram debitados à conta da ineficiência de uma companhia aérea, em uma situação muito mal explicada. Sai ano, entra ano e os dois principais órgãos públicos envolvidos no assunto, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Infraero, não param de dar demonstrações de incompetência, falta de transparência e confusão na gestão dos aeroportos e na operação do sistema aéreo. Esses órgãos parecem casas mal-assombradas que nunca nada nem ninguém consegue consertá-las e dar-lhes um rumo minimamente eficiente. Já que a privatização da Anac e da Infraero parece pouco provável, o governo poderia ao menos tentar uma saída que mantivesse a propriedade estatal de ambas, mas transferisse a gestão a um corpo diretivo privado por meio de contrato de gestão.

O Brasil poderia inovar e fazer licitação da gestão da Anac e da Infraero, a fim de escolher gestores privados, os quais assumiriam compromissos, ganhariam prerrogativas, receberiam metas e teriam a missão de atrair investimentos privados nacionais e estrangeiros para o setor. Esses contratos de gestão teriam de ser fiscalizados sob regras previamente combinadas e, caso o grupo gestor não desse conta da tarefa, haveria substitução por outro em nova licitação. O fato é que a gestão estatal do setor aeroportuário fracassou e já ameaça seriamente o crescimento do país. Se quiser saber como fazer, o governo pode ir à Inglaterra, pois lá há exemplos bem-sucedidos de parcerias público-privadas em que o governo não privatizou o patrimônio público, mas transferiu ao setor privado a gestão e o aporte de investimentos em novos projetos.

As medidas anunciadas pelo presidente Lula no fim de 2008 pareciam indicar que o governo estava comprometido com a solução dos gargalos no setor, longe de ranços ideológicos. A concessão de alguns aeroportos para que fossem operados e administrados pelo setor privado, cuja propriedade continuaria sendo estatal, e a chamada de investidores privados para um novo aeroporto em São Paulo soaram, à época, como um alento e uma esperança. Dois anos depois, verifica-se que a fala presidencial não era para valer e foi somente um arroubo diante de um problema seríssimo. O fantasma do apagão aé­­reo deu sinal de vida, e os problemas recentes devem servir para lembrar que o colapso está aí, rondando para atacar a qualquer hora.

Outro fantasma que se acalmou, mas não morreu, gira em torno do setor energético. As deficiências nesse setor estão meio encobertas porque a natureza tem sido generosa, dando chuvas abundantes de forma constante. Não se tem falado mais sobre as usinas não concluídas e os projetos não executados, dramas que virão à tona a qualquer momento em que uma estiagem reduzir os níveis dos reservatórios. Ou se investe pesadamente nesses setores ou o Brasil vai amargar, em algum momento, o preço do hábito que os governantes têm de falar demais e realizar de menos.

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