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O ministro Joaquim Barbosa sai do Supremo Tribunal Federal (STF) para entrar na história. Ele anunciou ontem que deixará a corte até o fim do mês de junho, após ter cumprido parcialmente o mandato de presidente e bem antes de chegar à idade de 70 anos, que compulsoriamente o afastaria da magistratura. Sua decisão, sequer acompanhada das justificativas de praxe, foi recebida com surpresa até mesmo pelo plenário do STF, que dela só tomou conhecimento após Barbosa tê-la comunicado à presidente Dilma Rousseff e ao presidente do Congresso, senador Renan Calheiros.

Polêmico, Barbosa foi centro dos mais paradoxais sentimentos – do ódio exacerbado à admiração incontida de tantos quantos viam nele, num extremo, o justiceiro insensível que pôs na cadeia políticos e banqueiros que deveriam ser protegidos pela impunidade, um virtuoso salvador da pátria, repositório das esperanças por um Brasil melhor, ou um virulento promotor, capaz de protagonizar discussões violentas com seus pares para defender seus pontos de vista. Independentemente de qual for a imagem mais adequada para descrevê-lo, sem dúvida seu nome será incluído na historiografia brasileira.

Nomeado ministro do Supremo em 2004, chegou ao posto sob a interpretação de que sua escolha atenderia apenas ao interesse político do ex-presidente Lula de cortejar o segmento negro da população. O destaque que se deu ao aspecto étnico da nomeação, no entanto, não tirou de Joaquim Barbosa o reconhecimento de que reunia, pela sua formação no campo jurídico, todas as condições para chegar ao ápice da magistratura nacional.

Mas é a partir do momento em que foi encarregado de relatar a Ação Penal 470, que indiciou os envolvidos no esquema do mensalão, que sua atuação como ministro do STF passou a ser o centro das atenções, não apenas no mundo jurídico ou político, mas sobretudo na opinião pública, que, cansada da generalizada e habitual impunidade que protege os poderosos, logo sentiu ter na figura de Joaquim Barbosa a personalização do anseio geral de que, enfim, o país entrava em novo tempo.

Coincidentemente, Barbosa chegou à presidência do Supremo ainda na condução da relatoria da Ação Penal 470, o que lhe facilitou o exercício de posições próximas do incabível autoritarismo com que se portou, a ponto de agredir alguns dos seus pares com humilhações impróprias ao ambiente. Mas foi seguramente graças às suas posições firmes, muitas vezes contestáveis do ponto de vista jurídico, que ele conduziu o julgamento que levou à condenação 25 dos 39 réus do processo – entre eles algumas das figuras mais proeminentes do reinado petista de Lula, como o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o ex-presidente do PT, deputado José Genoino.

Joaquim Barbosa sai do STF longe de conquistar admiração unânime e nem chega perto de ser reconhecido como detentor de conhecimentos jurídicos inquestionáveis. Muito menos se vê nele características de temperamento equilibrado que se exigem de um magistrado exemplar. Mas, reconheça-se, ele cumpriu um papel histórico marcado pelo destemor, certamente inédito e que talvez jamais seja repetido no Supremo.

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