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A atitude negligente de um grupo de senadores da República diante da determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) para que demitam os parentes empregados na Casa, com base na súmula que proíbe o nepotismo nos três poderes, demonstra total desrespeito à lei, às instituições e ao país. Representa, acima de tudo, uma escandalosa falta de ética, que reforça ainda mais o descrédito da opinião pública com relação ao comportamento cotidiano dos parlamentares e as instituições políticas.

A seqüência dos fatos revela mais uma vez que a falta de espírito público é um dos componentes mais fortes da política brasileira. A súmula do STF que proíbe o nepotismo entrou em vigor no dia 29 de agosto. No entanto, grande parte dos senadores ignorou a determinação. Diante disso, o presidente do Senado, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), se viu obrigado a enviar uma carta a todos os 81 senadores, na última semana de setembro, rogando-lhes que cumprissem a decisão – só 31 responderam. No documento, Garibaldi pedia que as exonerações ou dúvidas dos parlamentares sobre a súmula fossem resolvidas até o dia 10 de outubro.

As solicitações, no entanto, não foram cumpridas pela maioria. Em vez disso, surgiu um parecer do advogado-geral do Senado, Alberto Cascais, que, para "balizar" a decisão da mesa diretora do Senado, sugeria apenas "demissões seletivas" de parentes. Esse estudo levou o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, a apresentar uma reclamação ao STF, questionando quatro itens da resolução do Senado. A súmula do STF proíbe a nomeação de familiares, em linha reta, colateral – cunhado, genro ou nora – ou por afinidade, até o terceiro grau.

Foi a gota d’água. Na terça-feira, para evitar um escândalo maior, Garibaldi Alves Filho afastou Alberto Cascais do cargo, argumentando que o advogado-geral do Senado "não se mostrou à altura do desafio". Logo em seguida, constituiu uma comissão com três integrantes da Casa, para atender à reclamação do procurador-geral.

Isso significava, na expressão de Garibaldi, que todas as deliberações já tomadas seriam revistas, "de acordo com a decisão do procurador". A comissão, que tem poderes até para acrescentar novos nomes à lista de demissão, foi encarregada de se pronunciar em até três dias úteis, prazo que vence no início da próxima semana.

É sintomático que a única decisão tomada com urgência no Senado em relação a esse tema tenha sido justamente a demissão do advogado que cuidou de tentar blindar os parentes mais caros aos senadores, sob as bênçãos dos próprios parlamentares. É pena que, de prazo em prazo, a solução real para a questão – o afastamento amplo, geral e irrestrito de todos os que forem alcançados pela súmula vinculante antinepotismo – não surja com a mesma pressa.

A resistência da prática nepotista é a expressão da falta de clareza entre o que é público e o que é privado, uma confusão que o Brasil precisa desmanchar sob pena de não fazer avançar a democracia.

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