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A longa crise da aviação comercial brasileira pôs a nu a fragilidade do organismo encarregado de zelar pelo fiel cumprimento das normas que regem o setor e de exercer o papel de defender o público consumidor de transporte aéreo. No caso, caberia à Agência Nacional da Aviação Civil (Anac) fiscalizar as companhias – e puni-las sempre que fosse necessário – de modo a obrigá-las a obedecer rigorosamente a legislação atinente, quer em relação à segurança e conforto dos passageiros, quer quanto à disponibilização permanente de informações fidedignas, bom atendimento aeroportuário, tarifação justa, fidelidade aos horários e aos compromissos de reserva. É o mínimo que delas se esperava.

Entretanto, todos estes quesitos foram solenemente ignorados pelas empresas aéreas, como bem demonstrou o caos instalado nos aeroportos, sobeja, cotidiana e dramaticamente escancarado pela mídia ao longo dos últimos dez meses. Havia (e há) problemas seríssimos no sistema de controle do tráfego aéreo, fator responsável por tantos atrasos e cancelamentos de vôos. Sim, mas a relação de consumo se estabelece entre passageiros e companhias e estas não cumpriram os ditames mínimos necessários à diminuição do sofrimento.

Tais constatações fizeram da Anac um dos alvos preferenciais a serem vencidos pelo novo ministro da Defesa, Nelson Jobim, para implementar as soluções que considera requeridas. Pediu, mas não obteve, a substituição dos mandatários que ocupam a direção da agência, apesar da leniência e da incompetência contumazes que demonstraram na gestão de suas atribuições. Mais: descobriu-se, até, uma estranha e inconcebível promiscuidade nas relações entre pelo menos um de seus diretores e uma das empresas aéreas.

Esses três parágrafos introdutórios servem para uma reflexão mais abrangente sobre as agências regulatórias e como vêm atuando no país desde que foram previstas na Constituição de 1988 e, anos depois, foram instituídas de fato e passaram a operar. É da lei a definição de seu papel, qual seja o de elaborar regras para atuação dos agentes privados de setores estratégicos da economia, tais como a energia elétrica, os transportes e as telecomunicações.

São, assim, um ente intermediário entre o poder do Estado, as empresas e o público consumidor dos serviços. A regulamentação cerceia o intervencionismo estatal na atividade econômica privada, ao mesmo tempo em que estabelece para esta os limites condizentes com o interesse público. Claras e acessíveis a todos, tais normas constituem-se em marcos regulatórios imprescindíveis para dar segurança a todos.

Dada a sua natureza, precisam ser técnicas, politicamente independentes e infensas a interferências externas. Daí o fato de seus diretores serem nomeados para gestões de cinco anos – período maior do que os mandatos políticos eletivos – e não poderem ser demitidos por ato discricionário dos governantes, salvo em casos flagrantes de cometimento de abusos no exercício dos cargos.

Infelizmente, a prática nacional não tem sido tão salutar quanto a filosofia que inspirou a criação das agências nos países de economia livre. A Anac é exemplo acabado das distorções que, lamentavelmente, ocorreram – a começar pelas indicações político-partidárias que passaram a prevalecer para o preenchimento dos cargos de direção, sem obediência aos critérios de escolha técnica e de experiência profissional indiscutível.

Vai daí que, protegidos pela inamovibilidade legal e pelo apadrinhamento, permanecem à frente da agência os mesmos dirigentes tidos como responsáveis por grande parcela da desastrosa situação do transporte aéreo brasileiro. Ou seja, a Anac, que deveria ser solução, é hoje parte ponderável do problema.

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