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Até quando o Brasil desfrutará de conforto externo? A baixa taxa de câmbio está provocando aumento das importações e redução das exportações. Se esse quadro persistir e se o preço do dólar não aumentar, dois efeitos negativos poderão aparecer

Em sua passagem pela Europa, a presidente Dilma Rousseff elegeu a expansão monetária promovida pelos países em crise como um dos alvos de suas críticas. Ainda que o Brasil não seja propriamente um exemplo para endossar as críticas disparadas contra os outros, o fato é que a presidente tem razão. O volume de dinheiro emitido pelos Estados Unidos e Europa chega a elevada soma de US$ 8,8 trilhões, equivalente a quatro vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Considerando que cada unidade monetária em circulação tem uma dada velocidade, o volume de produção adicional necessário para absorver tamanha expansão monetária é algumas vezes maior do que a moeda emitida.

Há relação direta entre o estoque de moeda circulante, o produto e o nível de preços, e um dos mais importantes conceitos ensinados pela teoria econômica é que, quando há expansão da moeda sem o correspondente aumento do produto, mais adiante o índice geral de preços aumenta. Isso é, mais inflação. A expansão da moeda é prerrogativa do governo, mais especificamente dos bancos centrais, aos quais cabe promover o suprimento de moeda e administrar o meio circulante. Em geral, a causa primária da fabricação de dinheiro é o déficit público, principalmente nos países em que o Banco Central é apenas uma autarquia do governo e não tem independência.

Ao gastar mais do que arrecada, o governo tem apenas três formas de resolver o problema: aumentar impostos, fazer dívidas ou emitir dinheiro. A razão essencial da emissão de 8,8 trilhões de dólares é a crise da dívida pública decorrente de déficits fiscais crônicos, tanto nos Estados Unidos como nos países da União Europeia. Mesmo os bancos centrais mais rigorosos e autônomos acabam expandindo a moeda quando há déficit público, para evitar calotes bancários e recessão econômica.

O Brasil sempre foi useiro na prática de cobrir os déficits governamentais com emissões monetárias, e essa foi uma das causas principais dos longos anos de inflação, situação que se agravou drasticamente de 1979 a 1994 e provocou hiperinflação e anos perdidos em atraso econômico. A inflação é um imposto sem lei, perverso e prejudicial sobretudo às camadas mais da população, e responde pelo agravamento da pobreza e pela má distribuição da renda. A austeridade monetária somente foi adotada com o Plano Real, quando a emissão de dinheiro passou a ser feita de forma responsável.

Apesar disso, o Brasil andou descuidando desse tema e a base monetária dobrou em apenas cinco anos, passando de R$ 98,3 bilhões em 2005 para R$ 197,4 bilhões em 2010. No encerramento do exercício de 1994, o saldo da base monetária era de R$ 17,3 bilhões, logo, sua elevação foi de quase 11 vezes até o fim de 2010, sem que o PIB tenha aumentado tanto para justificar tal crescimento da moeda em circulação. Apesar disso, o Brasil conseguiu crescer e absorver a expansão monetária sem que a inflação explodisse. Mas há limite para o aumento do dinheiro circulante acima do aumento do PIB e, por isso, a presidente Dilma tem razão ao criticar o volume de US$ 8,8 trilhões de dinheiro que europeus e norte-americanos estão injetando na economia mundial.

Para muitos, houve estranhamento quando a presidente afirmou que, além de colocar lenha na fogueira da inflação, essa massa de dinheiro novo circulando no mundo é prejudicial ao Brasil. A explicação está na oportunidade criada para que investidores captem dinheiro no mercado internacional a taxas de juros baixíssimas e apliquem em títulos brasileiros à taxa Selic, atualmente em 9,75% ao ano. Esse dinheiro entra no país para ganhar com aquilo que os economistas chamam de "arbitragem" (a diferença entre as taxas de juros internacionais e as taxas vigentes no Brasil). Não é capital que ingressa como investimentos estrangeiros diretos, destinados a obras, projetos e implantação de empresas no Brasil.

A presidente Dilma chamou essa massa de dinheiro novo emitido de "tsunami monetário", numa referência de que, no futuro, as consequências em matéria de inflação poderão corroer eventuais efeitos positivos momentâneos. Além disso, a crítica da presidente brasileira foi uma espécie de sinalização de que o governo poderá reagir, pela imposição de mais restrição à entrada de dólares no país. E o Brasil está em posição confortável para enfrentar essa situação, em razão do elevado volume de reservas internacionais em dólar.

A questão é saber até quando o Brasil desfrutará desse conforto externo, pois a baixa taxa de câmbio está provocando aumento das importações e redução das exportações. Se esse quadro persistir e se o preço do dólar não aumentar, dois efeitos negativos poderão aparecer em prazo relativamente curto: o desaquecimento da produção nacional e a redução do estoque de reservas do país, o que reduziria a capacidade do governo para enfrentar o "tsunami monetário".

O fato é que o Brasil está conectado com a economia mundial e caminhando para elevar o índice de internacionalização de sua economia. Assim, cada vez mais os problemas mundiais refletirão na economia doméstica, razão por que a presidente Dilma resolveu externar sua posição sobre a emissão monetária em proporções exageradas.

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