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Neste exato momento, há instituições paranaenses trilhando caminhos opostos no que diz respeito à transparência de seus dados, especialmente em relação à divulgação das informações salariais de seus servidores. O exemplo negativo vem do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que, a partir da segunda-feira passada, começou a exigir dos internautas dados pessoais, como CPF, e-mail e nome da mãe, para que se pudesse acessar as informações. O exemplo positivo vem do Tribunal de Justiça do Paraná e do Ministério Público estadual, que adotavam essa prática e devem suspendê-la nos próximos dias, segundo reportagem publicada ontem pela Gazeta do Povo.

Compreende-se a preocupação do TCE e de seus funcionários. Em setembro passado, um diretor do tribunal estava com seu filho quando foi sequestrado e obrigado por seus algozes a fazer saques bancários em várias agências. Há o registro, no sistema de informática do TCE, de que, dias antes do assalto, um anônimo teria acessado cinco vezes as informações pessoais do diretor em questão no site da instituição. Embora essa informação não seja suficiente para concluir inequivocamente que os bandidos escolheram o servidor por saber seu salário, também não se pode descartar essa hipótese.

Dúvidas de ordem policial à parte, embora tenham sido elas o gatilho que motivou o Sindicontas (que representa o corpo de servidores do TCE) a pedir a mudança na forma de acesso, arrolam-se argumentos também jurídicos. É certo que a Lei da Transparência (Lei 12.527/2011), embora tenha obrigado todos os órgãos da administração pública a oferecer em seus portais de internet os salários de seus servidores, deixou a critério delas o modus operandi do acesso. Foi o que bastou para o presidente do TCE decidir pela mudança em decisão monocrática – por se tratar de "questão administrativa", não seria necessário levar o assunto a plenário.

O Conselho Nacional de Justiça, no entanto, já considerou que essa brecha na Lei da Transparência não basta para que se criem empecilhos ao direito do cidadão à informação. Só seria válido pedir os dados do internauta nos casos de "transparência passiva", ou seja, informações que não necessariamente deveriam estar acessíveis à sociedade. Os salários dos servidores, no entanto, não estão nessa categoria. Foi por causa desse entendimento que o CNJ determinou que o TJ-PR abrisse mão da exigência dos dados pessoais de quem busca consultar os vencimentos de seus funcionários.

É sadia a tendência de tornar cada vez mais transparentes os atos dos poderes públicos e de permitir ao contribuinte o exercício de seu direito de saber para quem e quanto se destina do imposto que recolhe. Aqui se chocam dois princípios: o direito do cidadão à privacidade, protegido pela Constituição; e o da publicidade dos atos públicos, também consagrado pela mesma Carta Magna. São compreensíveis os argumentos que buscam resguardar as informações pessoais dos servidores, inclusive para prevenir episódios como o do diretor do TCE, mas neste caso ficamos com a palavra do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto. Quando ele presidia a corte, o STF teve de decidir o que fazer em relação aos salários dos próprios funcionários. E Ayres Britto foi categórico: "Como nosso empregador, o contribuinte tem o direito de saber o quanto nos paga". Que o TCE possa seguir o bom exemplo de outros órgãos e facilitar cada vez mais o acesso do cidadão a informações que o ajudam a saber como está sendo empregado o seu dinheiro.

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