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É mais que óbvio que a idoneidade moral é um requisito essencial para se assumir um cargo público, ainda mais um de primeiro escalão, como um ministério ou uma secretaria. Então, não chega a ser exatamente uma surpresa que Dilma Rousseff, em café da manhã com jornalistas na segunda-feira antes do Natal, tenha dito que pretendia fazer consultas para saber se algum dos seus potenciais escolhidos para o novo ministério estava encrencado, especialmente na Operação Lava Jato. O problema são todas as outras circunstâncias que envolvem esse suposto pente-fino.

O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa lembrou, no Twitter, que o Ministério Público não é bem o órgão certo para que Dilma fizesse a consulta. "Que degradação institucional! Nossa presidente vai consultar órgão de persecução criminal antes de nomear um membro do seu governo!" E continuou: "Ministério Público é órgão de contenção do poder político. Existe para controlar-lhe os desvios, investigá-lo, não para assessorá-lo". Não é à toa que o procurador-geral, Rodrigo Janot, disse "não" à intenção da presidente, até porque os dados da Lava Jato são sigilosos. O Executivo tem à disposição uma outra instituição para levantar informações: a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), como lembrou o colunista Elio Gaspari em texto publicado nesta Gazeta na quarta-feira. Nos Estados Unidos, é justamente o serviço secreto que prepara e entrega ao presidente as informações sobre possíveis nomeados, trabalho que todos sabem existir, mas que ninguém fica alardeando por aí.

Vendo frustrada a tentativa de saber quais políticos estão na mira do MP na Lava Jato, restou ao governo dizer que se valeria das "informações disponíveis" sobre os ministeriáveis, seja dados oficiais, seja a cobertura da imprensa, para completar sua equipe. E é aqui que se pode começar a duvidar das intenções de Dilma sobre a nomeação de um primeiro escalão acima de qualquer suspeita. Três dos nomes já confirmados respondem a processos judiciais: Kátia Abreu (Agricultura), por falsificação de selo público; Eduardo Braga (Minas e Energia), por crime eleitoral; e Helder Barbalho (Pesca), por improbidade administrativa. Nenhum deles, é verdade, foi condenado, e é preciso conceder-lhes a presunção de inocência. Mas, se Dilma queria vetar nomes simplesmente por estarem sob investigação do MP, não seria incoerente nomear quem já é réu em processos?

E ainda há mais: o novo ministro do Esporte, George Hilton, foi flagrado em um aeroporto mineiro, em 2005, com R$ 600 mil que seriam provenientes de doações de fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus. A Polícia Federal o liberou na ocasião, mas o episódio levou Hilton a ser expulso do PFL (hoje Democratas). E até agora não se esclareceu a informação, levantada por um colunista da Folha de S.Paulo, de que o Planalto teria oferecido a vice-presidência do Banco do Brasil ao ex-governador fluminense Anthony Garotinho, condenado por formação de quadrilha em 2010.

Também não se pode esquecer o que aconteceu com parte dos ministros "faxinados" no primeiro ano de mandato de Dilma. O pedetista Carlos Lupi perdeu o cargo, mas continuou dando as cartas no Ministério do Trabalho a ponto de indicar sucessores. Alfredo Nascimento, do PR e demitido da pasta dos Transportes, chegou a ser chamado por Dilma em 2013 para conversar sobre a reforma ministerial com que ela pretendia costurar o apoio à sua reeleição. Esses dois casos deixam claro que, em nome da tal "governabilidade", a presidente está disposta a tolerar os "malfeitos" – eufemismo que Dilma adora usar nos casos de corrupção – de seus subordinados.

E, quando não é o caso de indicar ministros às voltas com a Justiça ou com a polícia, os brasileiros veem nomeações como as do novo ministro da Educação, Cid Gomes – o mesmo ex-governador do Ceará que, enfrentando uma greve de professores em seu estado em 2011, fez pouco caso das reivindicações salariais dos docentes – e, para a Ciência e Tecnologia, de Aldo Rebelo, o mesmo ultranacionalista que, em 1994, chegou a apresentar projeto de lei proibindo que órgãos públicos fizessem uso de "qualquer inovação tecnológica que seja poupadora de mão de obra, sem prévia comprovação (...) de que os benefícios sociais auferidos com a implantação suplantem o custo social do desemprego gerado".

Será mesmo possível que Dilma só tenha como possíveis escolhas políticos ficha-suja ou pessoas sem aptidão para os cargos?

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