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Pela segunda vez em apenas duas semanas, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ameaça colocar de pernas para o ar o processo eleitoral em curso. Antes, tentou interpretar radicalmente a regra da verticalização e, com isso, não tivesse voltado atrás, teria embaralhado muitas das alianças estaduais. Agora, ameaça a candidatura à reeleição de Lula, que teria cometido uma ilegalidade ao conceder aumento acima da inflação para os servidores, sem observar o prazo mínimo de seis meses anteriores à eleição.

A medida provisória que reajustou os salários e concedeu gratificações e vantagens para algumas categorias foi baixada em 30 de maio, dois meses após a data fatal prevista em lei. O sempre polêmico presidente do TSE, ministro Marco Aurélio de Mello, não deixou por menos: "Interpreto a legislação em vigor de modo a evitar distorções, desvirtuamento, a partir da utilização da coisa pública e visando objeto individualizado: a obtenção da simpatia de grande parcela de eleitores formada pelos servidores públicos." Para ele, os aumentos dados durante a campanha são uma "vantagem sedutora" que desequilibra a disputa.

Apesar das razões em contrário apresentadas pela Advocacia Geral da União, segundo as quais o reajuste não desrespeitou a lei, a candidatura de Lula poderia, em tese, estar correndo perigo. Há recursos cabíveis contra a decisão do TSE, que deverão ser impetrados na mesma corte ou diretamente no Supremo Tribunal Federal (STF). Se derrotados, no entanto, o presidente ficaria impedido de postular sua permanência no Palácio do Planalto.

Esta questão abre outra: até que ponto é saudável para a democracia o instituto da reeleição para mandatos executivos? Criada em 1997 para permitir a reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso, a lei já nasceu sob a suspeita de que teriam sido utilizados métodos heterodoxos para conquistar a boa vontade do Congresso em aprová-la. E mantém-se agora sob suspeita quando se vê o proveito que dela tiram os atuais mandatários com projetos reeleitorais.

A súbita simpatia de Lula para com a causa salarial do funcionalismo pode ser, como o próprio TSE levanta, um sintoma desse proveito – assim como a frenética andança que faz por todo o país para inaugurar obras, mesmo as inacabadas, misturando às prerrogativas do cargo objetivos de nítido proselitismo e de propaganda eleitoral. Dá-se o mesmo nos estados em que os governadores concorrem à reeleição.

Podem-se encontrar exemplos no Paraná: ainda nesta semana, o governo estadual isentou de impostos o diesel usado no transporte coletivo, para evitar o já defasado aumento das tarifas – uma medida que, embora reivindicada há mais de dois anos pelo prefeito da capital, foi providencialmente baixada só agora, na antevéspera da eleição. Não se coloca em discussão o mérito da medida, assim como não se pode ser, em tese, contra o aumento do funcionalismo federal – mas é difícil não interpretar esses atos como parte de um esforço de campanha.

A reeleição não é estranha aos melhores regimes democráticos mundo afora. No Brasil, no entanto, tem sido tão freqüentemente desvirtuada que melhor seria aboli-la. Ou, no mínimo, que se exija a desincompatibilização dos governantes que desejem tentá-la. Está claro que reeleição sem desincompatibilização rima com gastança e com bondades de caráter oportunista que não fazem bem nem à democracia nem à boa e responsável gestão do Estado.

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