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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, na quinta-feira, após um seminário empresarial realizado na sede da Fiesp, que não cabe a ele decidir sobre a permanência do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no cargo. "Não é problema meu. Eu não votei para eleger Sarney presidente do Senado, nem votei para ele ser senador no Maranhão, nem votei no Temer, nem votei no Arthur Virgílio, não votei para ninguém. Votei nos senadores de São Paulo. Quem tem que decidir se ele continua presidente do Senado é o Senado, não sou eu", afirmou Lula. A frase merece ser con­­trastada com o que se viu e ouviu do próprio Lula outros momentos de seu governo. As comparações evidenciam a distância en­­tre sua postura e o que se espera de um ho­­mem encarregado de governar a nação.

A declaração feita por Lula na quinta-feira foi forjada para ter aparência de verdade – realmente ele não votou em Sarney para se­­nador. Mas uma "espiada" nos acontecimentos de fevereiro deste ano basta para desmontar a farsa. Lula pode não ter "votado" em Sarney, mas contribuiu efetivamente para que ele fosse eleito presidente do Senado quando retirou o apoio previamente dado ao senador Tião Viana, candidato de seu próprio partido, o PT. O que fez Lula deixar seu correligionário à deriva? Deixemos que o próprio preterido explique. Lula, afirmou Tião Viana em entrevista publicada pela revista Veja no início de julho, "levou em conta que o PMDB é essencial para 2010. Decidiu respeitar as forças que impuseram a candidatura Sarney, porque privilegiou a candidatura Dilma Rousseff e a necessidade de coalizão".

O senador petista jura não ter guardado mágoa e é provável que nem mesmo tenha ficado surpreso. Afinal, o presidente seguiu o script pragmático que tem marcado todo o seu governo. Os primeiros a serem abandona­­dos, no episódio do mensalão, foram Antônio Palocci e José Dirceu. Depois do fogo amigo, os aliados peemedebistas Romero Jucá e Renan Calheiros também experimentaram a volubilidade presidencial.

O abandono de Sarney é mais um episódio da série. Lembremos que em meados de junho, em visita ao Casaquistão, Lula pediu respeito à biografia do senador maranhense e, ignorando as evidências de seu envolvimento com os atos secretos da Casa, disse que Sarney não era "um homem comum". Fal­­tou-lhe senso de justiça. Afinal, diz a Cons­­tituição, que somos todos iguais.

A mudança no tom das declarações relativas a Sarney é resultado de pesquisas encomendadas pelo Palácio do Planalto que mostram os efeitos da crise política sobre o go­­verno. A proteção a Sarney, segundo a consulta, estava arranhando a imagem de Lula e de sua candidata à Presidência em 2010, Dilma Rousseff. Foi o que bastou para demolir a coragem que os palacianos tentaram demonstrar na defesa de primeira hora.

Os episódios citados seguem um padrão; mostram que, num primeiro momento, Lula não mede esforços para acobertar desvios de recursos, apadrinhamentos e outros excessos cometidos contra a administração pú­­blica, mas que possam ser convertidos em van­­tagens eleitorais futuras – o que lhe re­­vela a falta de caráter. Não bastasse tal com­­por­­tamento, Lula também dá provas de le­­viandade ao fazer da lealdade um artigo des­­cartável, do qual ele lança mão quando imagina poder conter denúncias que, ao fim e ao cabo, resvalam em atos de seu próprio go­­verno. Quando o cálculo político evidencia que a defesa do aliado de ocasião traz mais prejuízos que dividendos, Lula não hesita em refazer o discurso. E, de palavra em palavra, vai deixando evidente quais são as virtudes que lhe faltam para bem governar.

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