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Nas últimas semanas, as novas medidas de regulação do sistema financeiro e das atividades bancárias foram apresentadas ao mundo. Já se esperava que a crise financeira mundial que explodiu em 2007/2008 levasse os governos e os bancos centrais ao estabelecimento de novas regras para a estrutura e funcionamento do sistema financeiro e novas condições para as políticas de crédito. Até aí, nada de novo, porquanto a crise mostrou, mais uma vez, que o capitalismo é um eficiente sistema de invenção, produção e trocas, mas que falha em promover melhor distribuição da renda e deixa a desejar quanto a autorregulação das práticas dos agentes econômicos.

Os adversários da economia de mercado gostariam de ver o fim do capitalismo, sob o argumento de que ele tem gerado crises, pobreza e prejuízos ambientais. Mas não será desta vez que o mundo verá o fim desse sistema (se é que um dia verá), pois não há outro melhor para colocar no seu lugar, e nenhum sistema supera o capitalismo de mercado em sua capacidade de descobrir, inventar, empreender, produzir e promover as trocas, características essas necessárias para o progresso material e o desenvolvimento social. A experiência alternativa tentada no século 20 foi o socialismo soviético que, além de ser ineficiente no campo da economia, deixou um inventário de sangue e tortura jamais visto.

Todavia, o mundo deve esperar, sim, medidas rigorosas de regulação e fiscalização nas quatro grandes áreas (finanças, comércio, investimentos e meio ambiente), como instrumento de correção das falhas de mercado e preservação das suas virtudes. Tão importante quanto fazer uma regulação eficiente é melhorar os órgãos oficiais de fiscalização e as agências autônomas de defesa do consumidor. Não se trata de voltar à velha regulação do passado que mais se dedicava a frear a criatividade e o empreendedorismo do que corrigir falhas de mercado e deficiências de comportamento dos agentes econômicos. A gravidade da crise contribuiu para quebrar a resistência dos ultraconservadores e os levou a aceitar novas regulações e limitações na órbita do sistema financeiro e suas operações.

As novas medidas anunciadas como resultado do acordo da Basileia 3 impõem regras duras e necessárias para melhorar a saúde dos bancos e demais instituições financeiras, além de fixar rígidas normas para o crédito e o financiamento, inclusive, para as complexas operações chamadas "derivativos". Em linhas gerais, as novas regras exigirão mais capital dos controladores e acionistas dos bancos, limites mais estreitos à multiplicação dos empréstimos (redução da alavancagem), condições mais severas para a liberação de empréstimos e redução do arsenal de operações com derivativos financeiros. Ainda que alguns críticos tenham ensaiado atirar contra certas exigências do acordo, a confusão e os prejuízos armados a partir do maior sistema financeiro nacional do mundo, os Estados Unidos, minaram a resistência e o poder de brecar as reformas.

A crise financeira fez pela nova regulação financeira o mesmo que as catástrofes ambientais fizeram pelas leis de proteção à natureza e preservação das matérias-primas naturais. É da lógica humana que a reação ocorra na proporção do tamanho do problema, o que lança esperança na possibilidade de reversão de crises e dos comportamentos danosos à sociedade e ao meio ambiente. Vai se tornando consenso mundial que os homens, as organizações, os governos e os mercados precisam de limites e regras para que, ao lado de cumprirem seu papel de prover bem-estar social, não poluam, não destruam, não danifiquem e não depredem a fonte da vida e sua manutenção, que é a natureza e seus recursos.

Não se conhece, ainda, a extensão das medidas regulatórias sobre o mundo das finanças em cada país que deve adotá-las, pois o acordo da Basileia 3 não tem o poder de, por si só, tornar-se legislação interna das nações. É preciso que os pontos do acordo se transformem em leis e normas internas aprovadas por cada nação individualmente. É certo, porém, que os mercados financeiros e suas operações não voltarão para a liberdade total e para a ausência de condições rígidas, conforme o quadro que vigorou até antes da crise, sob o patrocínio dos governos e seus bancos centrais. Também não haverá o retorno às velhas regulamentações de orientação socialista, nocivas à produção e ao crescimento. O capitalismo não se transformará em um paraíso por causa das reformas, mas é exatamente sua capacidade de se reformar que sustenta, em parte, sua capacidade de sobreviver, já que suas virtudes são importantes para o crescimento econômico e o desenvolvimento social.

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