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| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo

Em seu discurso de posse, na quarta-feira, dia 2, o ministro da Economia, Paulo Guedes, fez um diagnóstico acertado de todas as mazelas que conduziram o Brasil ao estado atual de caos fiscal, gastando muito mais do que arrecada e, ainda por cima, gastando mal. Ao dizer que “a hora é agora de enfrentar o problema fiscal”, o novo ministro deixou claro que o primeiro pilar de reformas é a Previdência. Ela é a sustentação que permitirá a manutenção do teto de gastos, uma das mudanças aprovadas por Michel Temer, e por isso precisa ser enfrentada o quanto antes. Por isso, ela pode ser considerada o primeiro grande desafio de Jair Bolsonaro na área econômica assim que a nova legislatura tomar posse, em fevereiro.

Enquanto isso não ocorre, o governo trabalha em uma medida provisória para fazer ajustes que não dependem de emenda constitucional. Várias dessas correções buscam impedir fraudes ou concessões indevidas de aposentadorias e pensões, e apenas elas têm um potencial de fazer o governo economizar dezenas de bilhões de reais por ano. Mas essa eventual MP apenas resolve questões pontuais, sem atacar o âmago da questão previdenciária brasileira: sua inviabilidade total no médio e longo prazo, à medida que o bônus demográfico é perdido. O Brasil envelheceu antes de enriquecer, e em breve não haverá mais força de trabalho suficientemente numerosa para bancar as aposentadorias, no sistema atual, baseado na “solidariedade entre gerações”.

A reforma tem de ser apresentada já com um plano de comunicação bem elaborado

E o pilar da Previdência pode ser dividido em vários “subpilares”, como a implantação de uma idade mínima para a aposentadoria, a igualdade de regras para o setor público e o setor privado, e regras de transição para quem já está na força de trabalho. Uma genuína reforma tem de passar por esses três aspectos, que foram contemplados no projeto elaborado pelo governo Michel Temer e que já foi aprovado em comissão especial na Câmara dos Deputados. No entanto, essa mesma proposta já foi muito desfigurada por pressões setoriais de grupos que chegaram a usar até mesmo a violência para se fazer ouvir, como no caso de policiais em abril de 2017, prejudicando qualquer pretensão de uma reforma igualitária. Não se nega que, por suas características específicas, certas funções sejam contempladas com regras especiais para a aposentadoria, mas é preciso saber onde termina a proporcionalidade e onde começa o privilégio. As concessões que foram feitas durante a tramitação da reforma de Temer perpetuam privilégios. E aqui reside um primeiro desafio a Bolsonaro, pois várias das categorias que pleiteiam a manutenção das generosas exigências atuais são muito caras ao atual presidente, que precisará enfrentar o corporativismo desses grupos, colocando o interesse do país acima de interesses setoriais.

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O segundo grande desafio do presidente é vencer a batalha da comunicação. A esquerda soube desconstruir a reforma de Temer com uma forte e eficaz campanha de desinformação baseada em chavões segundo os quais o presidente iria “acabar com a aposentadoria” e fazer o brasileiro “trabalhar até morrer” – quando, na verdade, o fim da aposentadoria virá se não for feita reforma alguma, levando a Previdência ao colapso. Bolsonaro tem uma grande vantagem em relação a Temer: sua popularidade. Mas ele não pode se iludir, pois os adversários voltarão à carga e parte da população que votou em Bolsonaro pode se voltar contra a reforma se concluir que o presidente quer “botar a mão no bolso do brasileiro”. A reforma tem de ser apresentada já com um plano de comunicação bem elaborado, e os responsáveis por isso precisam estudar todo o arsenal que foi usado contra a reforma de Temer, para ter as respostas prontas.

O governo tem várias opções à sua frente. Pode aproveitar a reforma de Temer já aprovada em comissão especial, apresentando emendas aglutinativas para corrigir o que a equipe econômica considerar necessário; ou pode iniciar toda uma nova tramitação, tendo como base projetos apresentados à equipe de transição por economistas de fora do governo (como Renato Follador e a dupla Armínio Fraga-Paulo Tafner) ou mesmo algo gestado pela própria equipe de Paulo Guedes. Mas, independentemente da escolha, a reforma terá de ser abrangente e cortar privilégios – do contrário, será preciso fazer novas correções no curto e médio prazo; e terá de ser muito bem explicada à população, para evitar que uma rejeição infundada desperte oportunismos nocivos no Congresso Nacional. 

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