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As panelas voltaram a ressoar pelo país na noite de quinta-feira, quando o Partido dos Trabalhadores veiculou na televisão seu programa partidário. Apresentado pelo ator José de Abreu – um dos maiores defensores de José Dirceu, e que deixou claro no Twitter seu desagrado com a nova prisão do mensaleiro condenado –, o programa ignorou completamente a corrupção que tomou conta do aparelho estatal brasileiro; não houve uma única menção sequer, nem mesmo para afirmar que “nunca antes neste país se investigou e se prendeu tanto”, como a própria Dilma Rousseff dizia até há pouco tempo.

O partido, que durante a campanha eleitoral de 2014 disparou contra o que chamava de “terrorismo” daqueles – seja adversários políticos da oposição, seja analistas econômicos como no famoso caso do relatório do Santander e da consultoria Empiricus – que apontavam tempos difíceis para a economia nacional caso Dilma fosse reeleita, usou no programa o mesmo recurso que condenava antes, mas com algumas diferenças. Agora, o partido até admite que a economia vai mal. “A crise já chegou às nossas casas”, disse Lula durante a inserção (falta saber se, depois disso, aqueles que negavam a crise mudarão seu discurso). Mas os problemas econômicos, alega o PT, podem degenerar para uma crise política, com “final trágico para todos” e que “poderia trazer efeitos bem piores que uma crise econômica”. “Será que tumultuar a política traz solução para a economia?”, questiona um dos outros apresentadores.

O partido não se despe da veste de salvador da pátria, característica do lulismo

Mas o que seria “tumultuar a política”? Como bem sabemos, na retórica de Rui Falcão, o presidente do partido, qualquer oposição vigorosa já é “tumulto” e “golpismo”. É por isso que, no programa partidário, Falcão afirma que desejam “desestabilizar um governo eleito democraticamente” e pede “juízo” aos que “não se conformam com a derrota nas urnas” – embora seja difícil crer que ele faria a mesma avaliação de falta de juízo aos que, no passado, gritaram “fora Collor” e “fora FHC”, dois presidentes também eleitos democraticamente. Para quem insistir em teses como o impeachment, Falcão afirma que “o povo saberá defender a nossa nova e vibrante democracia”.

Ainda que tenha calçado as sandálias da humildade em alguns trechos do programa, admitindo a crise e alguns erros, o partido não se despe da veste de salvador da pátria, característica do lulismo. Se errou, o PT pelo menos errou tentando acertar, enquanto insinua que os governos anteriores teriam errado feio fazendo o mal. “Nosso pior momento ainda é melhor para o trabalhador que o melhor momento dos governos passados. Nosso maior ajuste ainda é menor que os ajustes que os outros fizeram”, afirma Lula. O programa até cita rapidamente a estabilização econômica como conquista brasileira, mas nunca reconhece sua autoria. A oposição, retratada em uma colagem de fotos, é descrita como formada por pessoas que “só pensam em si mesmas”. Nos segundos finais da inserção, ainda sobra espaço para fazer ironia com os panelaços promovidos por uma população cansada de corrupção e de estelionato eleitoral.

Curiosamente, um dia antes da exibição do programa do PT, o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, esteve na Comissão de Minas e Energia da Câmara e fez diversos elogios ao PSDB, até mesmo reconhecendo seu papel na estabilização econômica, e pediu um “acordo suprapartidário” que permita a aprovação de projetos – uma trégua, recorde-se, que o PT nunca se dispôs a conceder quando estava na oposição. Mesmo o programa partidário fala, no início, de um “caminho da esperança e da união”. Mas, ao se portar de forma arrogante, hostilizando a oposição e ironizando em rede nacional a opinião dos 71% de brasileiros que consideram o governo Dilma “ruim” ou “péssimo” (avaliação pior até que a de Fernando Collor às vésperas de seu impeachment), o próprio PT queima as pontes que diz querer construir.

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