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Em entrevista concedida há alguns dias, o presidente do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, afirmou que a atual população carcerária brasileira é de aproximadamente 440 mil presos. Desse total, 190 mil seriam presos provisórios, ou seja, pessoas ainda não condenadas definitivamente pela Justiça, mas que se encontram recolhidas em estabelecimentos prisionais com base em alguma das demais hipóteses de prisão previstas na legislação, tais como a prisão preventiva, a prisão em flagrante, a prisão temporária, entre outras.

Mas o problema não reside, em si, nos institutos da prisão preventiva, da prisão em flagrante, da prisão temporária e das mais hipóteses previstas na legislação. As prisões provisórias são muitas vezes necessárias e fundamentais para garantir a ordem social, o bom andamento do processo e a aplicação da lei penal. E, aliás, são essas as razões que nos permitem concluir que, ao contrário dos que sustentam alguns, a recente decisão do Supremo (Habeas Corpus 84078-7/MG), baseada no princípio da não-culpabilidade ("ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória"), não colocará em liberdade os 190 mil presos que ainda aguardam julgamento definitivo. A liberdade dessas pessoas estará sempre condicionada à criteriosa análise do caso concreto.

A essência do problema, então, parece estar na perenização e na banalização das prisões provisórias. No conformismo da sociedade. Na constatação de que temos transformado a exceção em regra, e no fato objetivo de que, em nosso país, 43% das pessoas presas ainda aguardam uma decisão judicial final. Algo está errado e as causas de tão preocupante situação são as mais variadas possíveis: a) a precariedade dos órgãos de segurança pública responsáveis pelos inquéritos (polícia); b) a insuficiência das Defensorias Públicas; c) a falta de estrutura no Poder Judiciário (juízes, servidores etc.) e no Ministério Público; d) a "colcha de retalhos" legislativa; e assim por diante.

Todos são fatores que contribuem decisivamente para a morosidade dos inquéritos e dos processos judiciais no Brasil, morosidade essa que acarreta, como principais consequências, a impunidade e o sentimento generalizado de injustiça.

Impunidade porque muitos dos acusados (notadamente os culpados!) têm o tempo como o seu principal aliado no processo, e, não raras vezes, acabam salvos pela prescrição. Contam com a ineficiência do sistema, que, para eles, culpados, tem sido sempre uma companheira bastante presente e fiel.

Já o sentimento de injustiça decorre do fato de que a demora do processo não apenas acentua a dor das vítimas, de seus amigos e familiares, mas também alimenta a indignação de acusados inocentes, que, é preciso que se diga, também não são tão incomuns assim.

No Brasil, infelizmente, os inquéritos costumam ser falhos, e os processos judiciais, quase sempre, rumam em direção à eternidade. Não nos damos conta de que todos os cidadãos têm, ao menos em tese, o direito a um processo com duração razoável e aceitável. Trata-se de garantia constitucional expressamente consagrada no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal de 1988: "A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação." Por isso um processo com duração excessiva viola garantia fundamental constitucionalmente prevista.

A morosidade é patente e a falência do sistema se comprova pelos números acima mencionados. Inquéritos precisam ser concluídos e processos precisam ser julgados. Os inocentes devem ser colocados em liberdade, e os culpados precisam, enfim, cumprir sua pena e arcar com a dívida que contraíram perante a sociedade.

A morosidade precisa ser combatida e, diante desse triste panorama, permanecem sempre válidas e atuais as sábias palavras de Rui Barbosa, que, em sua "Oração aos Moços", ainda em 1921, bem lembrou que "justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta". E é exatamente dessa forma que, hoje, em todos os sentidos, podemos caracterizar o sistema criminal brasileiro: como injustiça qualificada e manifesta.

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