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Muitos são os chamados, poucos os salvos da miséria. A paráfrase bíblica se aplica ao programa Bolsa Família, meritória iniciativa do governo federal que, há oito anos, vem contribuindo para levar comida à mesa de milhões de famílias carentes do país inteiro. Entretanto, o programa ainda não demonstrou ter capacidade para abrir as portas da redenção e da autonomia econômica dessas famílias, o que acentua o seu caráter meramente assistencialista e reduz o que de melhor se deveria esperar dele, a promoção social.

Ampla reportagem que publicamos na edição da última quarta-feira nos dá conta de que, atualmente, o Bolsa Família transfere renda a 12 milhões de lares. Os valores repassados variam de R$ 70 a R$ 242 por família, dependendo do número de crianças e adolescentes em casa. É o suficiente, talvez, para que cerca de 50 milhões de brasileiros tenham acesso ao mínimo que a dignidade humana exige, isto é, a alimentação básica. Nesse sentido, o programa cumpre um papel humanitário de inegável valor, reconhecido e elogiado internacionalmente.

As contrapartidas exigidas são poucas: as famílias atendidas comprometem-se quase que tão- somente a manter os filhos na escola e a preencher o calendário da vacinação infantil. A desobediência a tais requisitos importa no desligamento compulsório do programa. Essa é uma das razões pelas quais 5 milhões de famílias deixaram o Bolsa Família desde que o programa foi criado em 2003. Outra razão para os desligamentos, bem menos frequente, é a vontade própria dos assistidos, por terem conseguido meios suficientes de sobrevivência pela renda do trabalho.

Esse é o ponto: poucos são os que se libertam voluntariamente da dependência porque não encontram ocupação ou não têm qualificação profissional para acessar o mercado de trabalho, mesmo na informalidade. Logo, falta ainda ao Bolsa Família a necessária complementação, qual seja a de, por vias que transcendem a simples transferência de renda, criar oportunidades de autonomia para maior parte de assistidos. A isso, sim, se poderia dar o nome de promoção social.

Há de se concordar com o cientista político – um dos entrevistados na citada reportagem – que afirma que "para a família conseguir sair dessa condição, é preciso atingir níveis adequados de saúde, moradia e educação, questões que não se podem cobrar do Bolsa Família, que é um programa que transfere dinheiro para as pessoas". Neste sentido, diz ele, o programa está cumprindo aquilo a que se propôs.

Mas, como política pública de promoção social, está evidente, como indiretamente reconhece o entrevistado, a deficiência do programa, que precisa ser complementado por outras ações. Caso contrário, veremos nele instrumento não só de perpetuação da miséria e da estagnação social, como também de exploração política – problema, aliás, frequentemente denunciado país afora, envolvendo agentes públicos mais interessados em tirar inescrupuloso proveito da massa de eleitores carentes e pouco instruídos do que em buscar a sua redenção social.

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