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As demonstrações da virulência do crime organizado, no início da semana em São Paulo, colocaram em cheque o sistema de segurança pública, dramatizando falhas no uso eficiente da inteligência policial e de coordenação de suas atividades. Porém o dano maior afetou o Estado de Direito, tanto pela dificuldade para manter uma ordem pública aceitável quanto pela desconfiança popular em sua eficácia. Mas trata-se de leitura incompleta porque – lembrava o pensador francês Saint-John Perse – "a democracia, mais do que qualquer outro regime político, exige o exercício da autoridade".

A questão começou quando grupos do crime organizado colocaram sob teste, desde o interior de presídios, a capacidade do novo governo estadual em manter a ordem pública. Tais situações são recorrentes: em 1983 no mesmo estado, no início de um governo eleito pelas oposições, grupos à margem da sociedade testaram o então governador Franco Montoro com tentativa de invasão do Palácio dos Bandeirantes. Desta vez o problema envolveu um líder político com escassa experiência executiva, que ao se preocupar com as formalidades jurídicas da função descuidou da resposta pronta para a sociedade.

A segurança pública, contudo, não é tarefa circunscrita a uma esfera, mas responsabilidade conjunta dos governantes e participação da sociedade, porque nenhum governo será capaz de prover garantia plena, dadas as limitações objetivas da realidade. Não obstante, ensinava Max Weber, "o Estado não pode ser entendido como tal se não tiver o poder de proteger a sociedade".

Entre nós outra cientista política, Lúcia Hipólito, coloca o dedo na questão: por associar a segurança ao regime autoritário, quando o aparato policial mesclava manutenção da ordem com repressão à cidadania, as lideranças da redemocratização nunca lidaram a sério com o tema. Esse descaso levou a criminalidade a explodir, com destaque para homicídios que atingem com gravidade a população masculina jovem, segundo o escritório da ONU no Brasil, devido ao crime organizado, incorporado em quadrilhas de traficantes de drogas.

Só recentemente as agremiações partidárias de esquerda e o governo delas decorrente, passaram a registrar o fato da violência, mas tal preocupação não se converteu em prioridade governamental. Tanto que verbas do Plano Nacional de Segurança Pública – concebido para reforçar a organização policial dos estados – entram no congelamento periódico dos orçamentos. Só agora, no calor dos acontecimentos, votam-se leis para liberar tais recursos, estudam-se fórmulas para estruturação da força policial, agravamento das penas e de sua execução, criação de programas sociais para a juventude pobre, etc.

Nesse despertar para a importância da segurança pública vale cobrar esforços do Ministério Público para a ação legal contra autores de crimes; da magistratura – aplicando penas alternativas ao instrumento da prisão, que, quando indicada, deve conter punição exemplar; da opinião pública – fiscalizando a eficiência da ação das autoridades, no exercício do seu papel central na democracia.

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