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A senadora democrata Elizabeth Warren e colegas de partido propuseram medidas de controle de preços para conter a inflação nos Estados Unidos.
A senadora democrata Elizabeth Warren e colegas de partido propuseram medidas de controle de preços para conter a inflação nos Estados Unidos.| Foto: Ken Cedeno/EFE/EPA/Pool

Em economia é comum surgirem propostas bem-intencionadas, cheia de bondades, mas erradas e maléficas. Uma delas – que parecia enterrada e entendida de uma vez por todas como ineficaz – é o congelamento de preços sempre que eles sobem além do que se considera normal. Eivados de apelo popular e demagogia política, o tabelamento e o controle de preços pelo governo já foram implantados nestes últimos dois séculos em centenas de experiências documentadas... e todas deram errado. Congelamento de preços não é invenção nova e é medida exaustivamente testada ao longo da história, como a imposição de preços máximos fixada pelo imperador romano Diocleciano, no ano 301 d.C.; na Revolução Francesa de 1789; nos Estados Unidos, durante a Segunda Guerra Mundial e também em 1971, na administração Richard Nixon. Nunca resolveu o problema e o saldo de consequências sempre foi desastroso.

Esse erro, no qual o Brasil incorreu várias vezes na tentativa de controlar a inflação, retornou ao cenário político mundial recentemente, por ação de parlamentares do Partido Democrata dos Estados Unidos, liderados pela senadora Elizabeth Warren, que propuseram ao governo norte-americano estabelecer controle e tabelamento de preços, diante da inflação que assola a nação. Esse tipo de medida, que nunca funciona, parte de um princípio economicamente e moralmente errado: a ideia de que a inflação é culpa dos empresários e agentes de mercado que remarcam preços, como se assim o fizessem por pura maldade e como se a economia, quando estável, fosse um sistema pautado na bondade humana.

O mundo já viu, por muitas vezes, governos populistas e irresponsáveis gastarem exageradamente, criarem déficits gigantescos, inundarem a economia com emissão de dinheiro e sucumbirem sob a hiperinflação e a destruição do sistema de preços, mas sempre culpando os empresários pela elevação dos preços. Não são só as empresas que remarcam preços diante de uma desordem monetária e irresponsabilidade na gestão do estoque de meios de pagamentos: todos os agentes econômicos, inclusive os trabalhadores, pressionam por aumento de preços, rendas e salários diante da inflação, que em última análise é quase sempre causada pelo governo.

Eivados de apelo popular e demagogia política, o tabelamento e o controle de preços pelo governo já foram implantados nestes últimos dois séculos em centenas de experiências documentadas... e todas deram errado

O lamentável no atual momento é que os governos não vieram a público dizer que a pandemia, o fechamento de empresas, a paralisação dos estabelecimentos de serviços e o isolamento social de trabalhadores, empresários e consumidores desorganizaram a economia, jogaram a produção para baixo (praticamente permaneceram funcionando somente as atividades sem as quais não há vida) e culminaram com um grave choque de oferta (falta de produtos), de forma que qualquer economista com razoável formação sabia que um dos efeitos seria a inflação. Adicionando-se a gastança de muitos governos – entre os quais está o de Joe Biden e seus gastos acima das possibilidades orçamentárias do governo central dos EUA –, a emissão de dinheiro sem lastro em produção e outros eventos, como a guerra entre Rússia e Ucrânia, tem-se a chamada “tempestade perfeita”, que causou aumento de preços do petróleo, gás, energia, insumos industriais, alimentos e outros, cujo efeito foi jogar a inflação mundial para cima.

No primeiro trimestre de 2020, o preço do barril de petróleo bateu o baixo nível de US$ 23 (em alguns momentos, caiu abaixo desse preço) e, neste segundo trimestre de 2022, oscila em torno de US$ 110. Apenas esse problema já seria suficiente para criar uma confusão na matriz de preços da economia e provocar inflação. Quando uma senadora do país que figura como o mais expressivo do mundo faz um discurso demagógico dizendo que, na crise, os empresários aproveitam para espoliar os consumidores, tem-se, além de diagnóstico errado (que geralmente leva a medidas erradas), o péssimo efeito educativo ao levar a população a crer que o drama se resume a maldades pessoais da classe empresarial.

Do ponto de vista da teoria econômica, admite-se alguma intervenção na liberdade de preços de uma empresa quando ela é protegida contra a concorrência por deter monopólio e, sobretudo, em casos de produtos vitais, como água e energia. Se uma empresa é beneficiada com lei que lhe concede monopólio (caso da Petrobras) ou atua em setor de monopólio natural (caso de água e esgoto), os preços de seus produtos não resultam de mercado competitivo e o consumidor não tem a opção de buscar outro fornecedor; logo, especialmente em caso de produtos vitais, faz sentido algum tipo de limitação no poder monopolista de fixar preços. Há casos em que a empresa monopolista sofre choque de custos em razão do aumento de preços da matéria-prima e insumos de produção. Em alguma medida, essa é a situação da Petrobras, que, embora detentora de monopólio em um pedaço da cadeia produtiva do setor, vincula-se ao mercado internacional exportando petróleo pesado (que as refinarias brasileiras não conseguem refinar) e importando petróleo leve, insumos, máquinas e equipamentos, além de ter acionistas estrangeiros.

Assim, a Petrobras é uma empresa mundial e, por isso, no governo Michel Temer, fixou-se uma política de preços da empresa em linha com o mercado internacional, inclusive como defesa contra governos populistas que pudessem debilitar a empresa, como aconteceu no governo Dilma Rousseff, que congelou preços por um período longo o suficiente para levar a empresa quase ao ponto de insolvência. Claro que se pode pensar em medidas para gerenciar o cronograma temporal de repasse dos aumentos dos preços do petróleo para os derivados, de forma a amenizar as variações abruptas em períodos muito curtos. Porém, por mais que as elevações de preços de derivados de petróleo e a inflação em geral imponham sacrifícios duros à população, o puro e simples congelamento de preços por decisão burocrática do governo não é remédio eficaz para a doença inflacionária. Infelizmente, quando senadores e deputados do país que é líder mundial, os Estados Unidos, surgem com a proposta de tabelamento de preços pelo governo, políticos de outros países começam a gritar a favor da mesma medida, que nunca funcionou nem irá funcionar desta vez.

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