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A prefeitura de Curitiba bem que tentou fazer segredo – sem sucesso. O Ippuc desenvolve projeto urbanístico para uma das últimas áreas verdes de Curitiba, no distante Campo de Santana. O local tem 1 quilômetro quadrado, é alagadiço e abriga a paupérrima Vila Lambari, um braço do bem-sucedido loteamento Rio Bonito, onde moram 28 mil pessoas. O projeto prevê 4,7 mil moradias para algo próximo de 20 mil moradores. Ainda não se sabe ao certo se será destinado à população de baixa renda ou para um misto de faixas salariais, como rezam as lições do bom urbanismo. O fato é que, se sair do papel, o Lambari – que se faz lembrar a cada chuvarada, seguida de alagamentos – poderá devolver a Curitiba o posto de cidade criativa.

Pode até mais do que isso. Os programas de habitação praticados na capital nos últimos 50 anos não são muito diferentes dos surgidos em outros lugares do país. Mas aqui a maior parte das políticas de moradia ganhou uma dicção muito particular. A Vila Nossa Senhora da Luz – inaugurada em 1966 – seguiu o modelo da Cidade de Deus e da Vila Kennedy, no Rio de Janeiro. Mas o projeto de Alfred Willer desviou das cascas de banana pisadas por seus antecessores.

Não faz sentido que a nova vila seja menos que marcos como o Caiuá ou o Bairro Novo

Deve-se citar ainda o projeto Caiuá e o Bairro Novo, nos anos 1980 e 1990. O Caiuá nasceu para abrigar moradores de diversas rendas, em casas de muitos tamanhos. Nasceu plural. Quando os proprietários se mudaram para lá, o ônibus, a escola, a unidade de saúde já estavam em funcionamento, regra pouco respeitada. O mesmo se diga do Bairro Novo, um grande loteamento inaugurado debaixo da alegria da Banda Lyra. Além de bem azeitado na planta, o projeto gozou das benesses da propaganda, que fez do local um fato, comentado e observado pela população. A proposta era louvável no tamanho dos lotes, beneficiados por ligações com as áreas mais urbanizadas. Falou-se muito do Bairro Novo, o que serviu de antídoto contra o preconceito de território que acaba com a reputação de determinadas áreas.

Essas experiências projetaram a cidade tanto quanto o Calçadão da XV e os parques. Só que foram menos festejadas. A moradia popular, contudo, é sempre uma camada mais profunda. Dela depende todas as outras – a segurança e a saúde pública, a educação e o transporte.

Não faz sentido que a nova vila seja menos que marcos como o Caiuá ou o Bairro Novo, apesar de os tempos serem mais difíceis. Há menos áreas para habitação. E os governos têm coceira para realizar projetos de retorno eleitoral imediato, o que os faz trocar os pés pelas mãos. O campestre Ganchinho virou cidade grande num estalar de dedos, assim que o Minha Casa, Minha Vida botou os olhos na região. Os serviços básicos não acompanharam tamanha velocidade e o vínculo tende a ser baixo em locais onde o morador tem pouco arbítrio na construção de sua casa.

Até aqui, a prefeitura parece trilhar um bom caminho, com a preocupação em fazer da “vila” uma referência em integração ambiental. Outro ponto a favor é a busca da vocação do local. Umbará, Cachimba e Campo de Santana eram endereço de olarias. O projeto prevê o reerguimento de uma delas e um monumento em honra dessa atividade.

Fantasma, mesmo, é o imediatismo, seguido do pouco diálogo com a cidade. Basta pensar nos bons projetos que amarelaram por falta, digamos, de uma Banda Lyra tocando por lá: SoHo Rebouças, Rua Riachuelo, Umbará, o entorno da Linha Verde. Projetos podem ser engavetados, claro. O estranho é que o Ippuc tenha desistido tão facilmente de ideias sobre as quais, presume-se, ralou os cotovelos.

Nesse sentido, a ocupação sustentável prevista para o Campo de Santana não é necessária só para a turma do Lambari ou para desopilar a fila da Cohab. É necessária para que o Ippuc recobre a confiança, mostrando-se capaz de praticar uma das grandes virtudes cívicas: terminar o que começou.

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