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O candidato mais despreparado acabou eleito para o Tribunal de Contas. Mas a eleição para o TC atraiu um nível inédito de interesse popular; esperamos que esse nível de mobilização possa perdurar

Não causou surpresa a proclamação do deputado Fabio Camargo como novo conselheiro do Tribunal de Contas do Paraná, anteontem, pela Assembleia Legislativa. Era a notícia aguardada havia meses, desde o dia em que se revelou a intenção do parlamentar – filho do presidente do Tribunal de Justiça – de disputar a vaga com o colega Plauto Miró, tido até então como o candidato in pectore dos poderosos que mantêm sob controle os cordéis do teatro encenado no plenário.

Protegido sob o manto das disposições constitucionais, o processo eleitoral guardou quase toda a aparência de legalidade. Candidataram-se todos os que se dispuseram a tanto e puderam comprovar, documentalmente, o cumprimento das regras regimentais. Foram todos sabatinados, todos puderam discorrer livremente sobre suas qualidades para que, em seguida, secretamente, 52 dos 54 deputados (Camargo e Miró não votaram, embora pudessem fazê-lo) votassem naqueles que suas consciências indicassem como os melhores para ocupar o cargo.

Ledo engano. Ainda que na aparência não se tenha agredido a processualística legal e regimental, as cartas estavam previamente marcadas para que, vergonhosamente, fosse eleito exatamente o candidato mais despreparado para integrar o conselho do Tribunal de Contas – tanto por seu pífio histórico profissional e parlamentar quanto pelas pobres manifestações que fez em defesa da própria candidatura na tribuna da Casa ou em declarações públicas ao longo de sua campanha.

Persistem, porém, algumas dúvidas sobre a decisão do presidente da Assembleia, deputado Valdir Rossoni, ao proclamar a vitória de Camargo por 27 votos – um a menos do que prevê o regimento interno, que leva em conta o número de eleitores presentes em plenário e se omite em relação às abstenções. Ora, presentes estavam os 54 deputados e, nesse caso, a maioria só estaria assegurada com 28 votos, ou seja, 50% mais um. Mas há controvérsias: o corpo jurídico da Assembleia entende que a composição da maioria se faz pelo número de votos encontrados na urna. Nesse caso, como os dois deputados candidatos não votaram, os 27 votos dados a Camargo lhe confeririam a maioria dos 52 que depositaram votos.

Independentemente desta controvérsia, que poderá ser levada à Justiça e até mesmo provocar a anulação do pleito, o que de mais lastimável resulta desse episódio é o fato de a Assembleia Legislativa ter perdido a chance de melhorar sua imagem perante os eleitores – tarefa de que não deram totalmente conta muitas das providências elogiáveis tomadas pela atual direção. Se a revelação dos descalabros administrativos e morais que se perpetravam nos porões da Casa, denunciados na série Diários Secretos, fez com que o Legislativo paranaense procurasse elevar seu conceito sob aqueles aspectos, a eleição para o Tribunal de Contas o fez cair de patamar.

A Assembleia e seus deputados mostraram-se evidentemente surdos aos protestos nascidos nas ruas. Preferiram, em sentido diametralmente contrário à indisfarçável ojeriza popular aos vícios da política que se pratica no país, manter o velho corporativismo e dar as costas para o anseio da sociedade que clama por mais qualidade, honestidade e seriedade das instituições republicanas e de seus gestores.

Nem tudo, entretanto, é motivo de decepção e entristecimento. Esta eleição para conselheiro do Tribunal de Contas provocou um debate sem precedentes na história desse tipo de escolha. A população despertou e se conscientizou sobre a importância de escolhas técnicas e politicamente isentas para melhor fiscalizar as contas públicas. O que pode significar que, da batalha agora perdida, se tire lição positiva para as próximas eleições.

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