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O comportamento do presidente da Câmara, Marco Maia, em relação a manifestações sobre o mensalão durante o julgamento precisa se pautar pelo respeito à liberdade de expressão

Com o objetivo de impedir uma "contaminação" do julgamento do mensalão (que o Supremo Tribunal Federal inicia no próximo dia 2) pelo debate político, o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), manifestou, segundo o jornal Folha de S.Paulo, a intenção de vetar manifestações sobre o tema, tanto no plenário quanto nas galerias da Casa. Apesar das reações imediatas – como a do deputado Roberto Freire (PPS-SP), que classificou a medida como "censura" – e do desmentido do próprio Maia dias depois, só será possível saber como o presidente da Casa pretende agir, na prática, quando os deputados voltarem do recesso, na próxima semana. Tanto o Regimento Interno da Câmara quanto a Constituição Federal oferecem diretrizes para guiar uma atuação sensata de Maia quando o assunto surgir – o que é praticamente inevitável, dada a relevância do julgamento do mensalão para o país.

O Regimento Interno, em seu artigo 17, permite ao presidente da Casa "interromper o orador que se desviar da questão", chegando ao ponto de cortar-lhe o microfone. Impossível discordar da razoabilidade deste regulamento, o que permite concluir que, durante a apreciação de projetos de lei, menções ao mensalão estejam fora de questão, já que o assunto está longe da pauta de votações. No entanto, os parlamentares também têm à sua disposição ocasiões em que podem discursar sobre o assunto que desejarem: pronunciamentos de 5 minutos no chamado "Pequeno Expediente", ou de 25 minutos no "Grande Expediente", antes das votações. Nesses casos, impedir comentários sobre o mensalão já seria uma violação do direito à liberdade de expressão, garantido não apenas pelo artigo 5.º da Constituição Federal como também pelo artigo 53, que trata especificamente do cargo dos deputados federais. Enquanto o discurso se mantiver dentro dos limites do decoro parlamentar, não há motivo para qualquer tipo de restrição.

A participação dos cidadãos durante as sessões da Câmara também deverá ser afetada, pois Marco Maia teria manifestado a intenção de proibir cartazes e faixas nas galerias da Casa. O Regimento Interno, em seu artigo 272, determina que a entrada das pessoas para acompanhar os trabalhos parlamentares é livre, mas também dá ao presidente da Câmara o poder de exigir a retirada de "espectadores ou visitantes que se comportarem de forma inconveniente (...) bem como qualquer pessoa que perturbar a ordem". Já houve casos em que as galerias foram esvaziadas quando manifestantes atrapalharam o andamento das sessões. Este retrospecto ganha importância ao considerarmos que um dos principais acusados no processo do mensalão, o ex-deputado petista José Dirceu, vem convocando movimentos como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a União Nacional dos Estudantes (UNE) para uma "batalha" em defesa dos mensaleiros. É verossímil que, na impossibilidade de acompanhar o julgamento no STF, tais grupos queiram fazer do Congresso seu novo front.

Entretanto, a possibilidade de tumultos nas galerias da Câmara não deveria servir para a proibição pura e simples de qualquer manifestação dos cidadãos. Cartazes e faixas sobre os mais diversos assuntos são comuns durante as sessões da Casa, e aqui vale a mesma regra aplicada aos deputados: qualquer pessoa que, por exemplo, exiba um cartaz silenciosamente, sem violência ou tentativas de hostilizar os parlamentares no plenário, tem sua presença amparada no direito constitucional à liberdade de expressão. Forçar a sua retirada ou impedir a exibição das mensagens sob a alegação de "comportamento inconveniente" seria um abuso.

Como se vê, a discussão não é tão simplista quanto querem fazer parecer os que classificam imediatamente as intenções de Marco Maia como "censura". É possível, por exemplo, que a atitude do presidente da Câmara possa dissuadir grupos de militantes que estejam pensando em ocupar as galerias da Casa. No entanto, a maneira como Maia se expressou não deixa de ser motivo de preocupação. É imprescindível que, a partir da semana que vem, o deputado petista mantenha ao mesmo tempo a ordem necessária para os trabalhos na Câmara e a liberdade de expressão de deputados e cidadãos. Seria lamentável que Maia usasse de suas prerrogativas para servir apenas de escudeiro para seu partido, a principal legenda envolvida no escândalo que o Supremo julgará em breve.

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