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São Pedro foi comemorado, no arraial da Granja do Torto, com o presidente fantasiado de jeca, engenho e arte de dona Marisa, atenciosa anfitriã de ministros, assessores e amigos, gente de primeira linha, fiel ao ilustre chefe que tomou quentão, pulou fogueira, e soltou busca-pés.

Apesar da euforia do ambiente de fogos e rojões, o supremo não parecia à vontade. Uma aperreação intrigava seu semblante, algo de estranho lhe abatia o riso, os lábios tremiam desordenados e o olhar esmaecia menos cintilante, quase morteiro. Maus presságios lhe fustigavam a alma a interrogarem até quando seus companheiros, que tanto premiara com cargos e regalias, teriam força para lhe poupar da contradança que Roberto Jeferson, a seu modo, cadenciava. O que teriam feito quando, ao acaso de suas duras viagens no afã de saciar a fome do Cabo Verde e Guiné Bissau, ficaram à vontade, com o governo nas mãos, para qualquer resolução que desejassem, inclusive meter a mão no jarro e fazer fortuna? Ao regressar, José Dirceu informava que a "coisa ia indo". Mas, que cousa? Lá fora, corria livre e solta a mais grave crise republicana, sem omitir as que invadiram os quartéis, acionando fuzis, sabres e baionetas.

A Revolução de Outubro de 1930 não foi uma ação que transtornou o povo em que pesem as conseqüências que gerou para a história. Um país de 36 milhões de habitantes não teria meios para figurar nada além de uma viagem de Getúlio ao Rio de Janeiro depondo Washington Luís e anulando a vitória de Júlio Prestes e Vital Soares, consagrada pelas urnas.

Em 9 de julho de 1932, São Paulo, que anteriormente esboçara uma resistência, fez sua revolta sob o comando do general Bertoldo Kingler, insurreição em pouco tempo sufocada apesar dos trens blindados e capacetes de aço em movimento. A data é nome de avenida na capital, feriado comemorado como um heróico brado bandeirante.

Em 1935 fracassou a intentona comunista de Pernambuco e Rio Grande do Norte, com apoio da Infantaria da Praia Vermelha. Sob o nome de "Estado Novo", em 10 de novembro de 1937, Vargas algemou a nação com uma ditadura perversa e truculenta. Em maio de 1938 o ditador acabou com o Anauê dos integralistas sepultando o chefe Plínio Salgado. Em 29 de outubro de 1945 o ditador é deposto. Segue-se a eleição de Eurico Gaspar Dutra, vencendo o Brigadeiro, bonito e solteiro. Nas eleições de 1950 torna Getúlio pelas mãos de Ademar de Barros. O caudilho suicida-se em 24 de agosto, pressionado pelo vigoroso laringe de Carlos Lacerda. Assume o vice Café Filho, logo deposto pelo marechal Lott. Tendo como adversários Juarez Távora, Ademar de Barros e Plínio Salgado, Juscelino Kubitschek chega ao poder fazendo 50 anos em 5 e inaugurando Brasília. Na seqüência, Jânio derrota Teixeira Lott e cai após sete meses. Jango o substitui, amparado pela marcha da legalidade de Brizola, protelando seu afastamento pelos militares que governaram de 64 a 85, Castelo Branco a Figueiredo.

No retorno à democracia, foi eleito Tancredo Neves, falecido sem tomar posse. Tudo isso e muito mais a partir de Ribamar não se equipara ao que temos diante dos olhos, afrontando o povo, indignando as classes, revoltando a nação.

Desde que Lula se arvorou a candidato por quatro vezes seguidas, foi reparado o seu despreparo para o supremo posto, crítica única mas insistente.

Ao curso de tais carências, exacerbou um ministério de 35 membros, pecando na quantidade e qualidade. Somou cargos e multiplicou funções, assessores, diretores, secretários e aspones por todos os cantos. Com tanta gente no trabalho, nasceu um acordo tácito e espontâneo ao gosto de cada uma das partes. José Dirceu no governo e no mando, enquanto o chefe dava voltas ao mundo em 80 dias sulcando mares nunca dantes navegados, líder dos subdesenvolvidos, aclamado em todas as paróquias da humanidade. Ao regressar, se comprazia em visitas regionais, empolgando platéias com seus provérbios e metáforas que o povão aplaudia de pé. O "entourage" animava-o nesses roteiros, aproveitando-os para maior liberdade no poder e criando um refém de suas próprias ambições.

A tragédia não podia, entretanto, parar nos bastidores. E extrapolou para o palco, estarrecendo a nação na voz do pecador confesso Roberto Jéfferson ao trazer a tona um enredo que mais cedo ou mais tarde havia de explodir.

Uma crise que pertence ao futuro, única entidade com direito a decidir a madrugada de amanhã. E que assumiu novas previsões com a inclusão do presidente – até então preservado – nos jornais e revistas de domingo, dia 10, bomba atômica da Veja com várias páginas assinadas. E a palavra impeachment, jamais pronunciada ou escrita ao longo da novela, voltou a ocupar a mídia, aparecendo em vários textos jornalísticos. Fábio Luiz Lula da Silva, o filho, ao lado de dois figurantes, estréiam no tablado para amealharem em três meses cinco milhões de reais.

Nas ruas e nas praças, nos lares e nos bares, passou-se a discutir acerca do conhecimento ou não de S. Exa. sobre o que ocorria nos desvãos do seu governo. Os números contaram 55% sim e 45% não. Lula estava perdido? De modo algum. Na quarta-feira em viagem para a França, a fim de comemorar a tomada da Bastilha, levou em sua bagagem 59,9% de aprovação e a sentença pública contra um bando de legisladores corruptos e traidores de uma administração exemplar. A voz do povo é a voz de Deus?

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