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Advogados do PT querem estatizar o vocabulário, pedindo que a imprensa deixe de usar o termo "mensalão"

Advogados petistas tiveram uma ideia luminosa: querem banir da imprensa o uso da palavra que melhor define o indesmentível episódio de operações financeiras suspeitas que irrigaram esquemas de compra de apoios parlamentares e custeio de campanhas de partidos em 2005, supostamente patrocinados pelo PT e por militantes que integravam o governo Lula. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, se depender dos advogados, a consagrada palavra "mensalão" seria censurada para uso na imprensa e substituída pela burocrática expressão "Ação Penal 470". Eles querem, primeiro, convencer as direções dos veículos de comunicação a "higienizar" seu vocabulário, mas não descartam ir à Justiça para impor seu vocabulário, diz Marco Aurélio de Carvalho, coordenador jurídico do PT.

Na argumentação dos advogados, o termo "mensalão", além de seu caráter pejorativo, guardaria também, intrinsecamente, um juízo de valor que lembra crime e a priori condena seus clientes. O PT, assim, seria o pioneiro da implantação da novilíngua, o idioma criado por George Orwell no romance 1984, em que palavras eram suprimidas de modo que uma ideia "deixaria de existir" se as pessoas não pudessem se referir a ela. Como o ex-presidente Lula vive repetindo que o mensalão não existiu, por que não tentar apagar o termo da cobertura da imprensa?

Não é a primeira vez que envolvidos no mensalão se valem de subterfúgios e eufemismos para designar os delitos pelos quais são julgados agora no Supremo Tribunal Federal. O crime de caixa dois, por exemplo, passou a ser designado como "recursos não contabilizados" – como se isto fosse suficiente para mudar a natureza delituosa dos fatos e contribuísse para diminuir a culpa de seus autores.

Da mesma forma, censurar a imprensa para obrigá-la a denominar de "Ação Penal 470" o que todos sabem ser o mensalão – contenha ou não esta palavra algum juízo de valor – em nada vai mudar o resultado do julgamento a que se dedicam os ministros do STF. Aos juízes não interessará o modo como a imprensa ou a opinião pública se referem à questão, até porque já passamos sete anos ouvindo o termo ininterruptamente. Interessa aos magistrados tão-somente o que está contido nos autos da Ação Penal 470 para emitir seus votos.

O que sobra, portanto, da esdrúxula proposta dos advogados é simplesmente sua absurda tentativa de censurar a imprensa, impondo-lhe uma regra que não encontra o mínimo respaldo legal. A proposta lembra muito aquela história do bode na sala. Se as pessoas se sentem infelizes, coloque-se entre elas o malcheiroso animal. A felicidade e o bem-estar imediatamente voltarão a reinar no ambiente quando o bode for retirado. Os advogados petistas querem retirar do ambiente público a malcheirosa palavra "mensalão" como se, assim o fazendo, os juízes se sentissem mais dispostos à benevolência.

O episódio remete a velhas tentativas de falsear a história, como aquela protagonizada por Lenin, nos primórdios da Revolução Russa de 1917 – para se livrar a presença incômoda de Trotski, mandou aplicar um primitivo "Photoshop" para fazer desaparecer das fotos a figura do desafeto. Mas apagá-lo das fotografias não foi suficiente; mais eficaz foi a ordem de Stalin: dar cabo de sua vida a machadadas durante o exílio no México.

No entanto, não há "Photoshop" que apague da memória nacional aquele que foi o momento que deu início à história do mensalão: o filme que flagrou o diretor dos Correios embolsando uma propina. Já a machadinha dos advogados do PT muito provavelmente errará o alvo: mais provável é que, no futuro próximo, o mensalão chegue até mesmo aos dicionários.

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