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"A gente não se liberta de um hábito atirando-o pela janela: é preciso fazê-lo descer a escada, degrau por degrau", disse, certa vez, o novelista norte-americano Mark Twain.

De fato, quando se trata de mudar um conceito arraigado, o desejo é tão importante quanto a paciência.

O modelo de desenvolvimento agrícola do Paraná deu certo. Somos apenas 2% do território nacional e respondemos por mais de 23% de sua produção de grãos. Para tanto, desmatamos 96% do território; jogamos dentro dele, a cada ano, 40 milhões de quilos de agrotóxicos (66 quilos por minuto); nos tornamos os campeões nacionais de câncer de fígado e de pâncreas; nas lavouras de fumo da Região Centro-Sul, a taxa de suicídio entre adultos jovens, bem como a taxa de câncer entre crianças de até 10 anos e o índice de lesões neurológicas, é excepcionalmente maior que em todos os outros locais do estado; a concentração de nitratos, em lençóis freáticos, já supera em até 80 vezes o máximo permitido no Arenito Caiuá; a perda de solo, em que pesem nosso pioneirismo e êxito nas técnicas de manejo de solo, continuam inaceitáveis (apenas o Rio Ivaí carreia ao Rio Paraná mais de 2 milhões de toneladas de solo ao ano); o número de espécies ameaçadas de extinção, dentre elas, nossa árvore-símbolo, passou de 167 para 344, nos últimos nove anos; e, para completar, 70% das propriedades são pequenas, e sua renda média mensal é de apenas R$ 800,00, segundo o Ipardes e o IBGE. Esta baixa renda agrava os problemas ambientais. O que faz, por exemplo, um agricultor cortar a mata ciliar para vendê-la como carvão? O que o impele a dilapidar a propriedade, às raias da insensatez, senão a necessidade básica de sobreviver? Ambiente equilibrado não se coaduna com acumulação a qualquer custo. Tampouco se coaduna com a miséria. Ambos, o excessivo querer e o nada ter, são os principais inimigos de um processo de desenvolvimento racional. O modelo de desenvolvimento agrícola do Paraná deu certo. Mas, é preciso perguntar: deu certo para quem?

Até porque, mesmo uma rápida análise já acusaria a brutal interferência no ambiente natural, um inaceitável complexo de doenças daí decorrentes e a pauperização de boa parte dos agricultores. Um modelo agrícola ambientalmente questionável, economicamente injusto e socialmente excludente. Deu certo para quem? Apesar disso, parece que a voz da razão começa a ser ouvida. No Paraná, um número cada vez maior de agricultores está convertendo suas propriedades para modelos ecologicamente aceitáveis. Se considerarmos o ano de 2004, já são 4 mil deles, representando um cultivo de 12 mil hectares e uma produção de 66 mil toneladas ano. O crescimento médio do setor é de 20% ao ano, o que significa mil agricultores convertendo suas propriedades para modelos ambientalmente menos impactantes a cada ano. A Secretaria de Estado da Agricultura, através da Emater, tem trabalhado com o enfoque da Agroecologia. A Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, através do Programa Paraná Biodiversidade, constitui módulos agroecológicos. Cada módulo reúne 20 propriedades que são financiadas com R$ 120 mil para que se convertam para práticas ecologicamente adequadas.

Além disso, na Secretaria Estadual de Educação, e com recursos dos ministérios do Desenvolvimento Agrário e do Desenvolvimento Social, iniciamos a Merenda Escolar Orgânica, comprando diretamente do produtor certificado. A meta é beneficiar 1 milhão e 300 mil crianças ao dia. Isso significa um mercado seguro ao produtor, menos agrotóxico no solo, na água e nos alimentos, e mais saúde às nossas crianças. Enfim, os astros estão alinhados. Espera-se que a sorte favoreça o bom-senso.

Não vamos, porém, ser ingênuos. Trata-se da sobreposição de um modelo agrícola por outro. Trata-se de uma substituição. Que só se faz através do confronto de idéias. O confronto está aí. É o bom combate. Não se pode ter medo dele. Para vencer é preciso vontade mas, sobretudo, paciência. Como lutar contra um vício. Assim já recomendava Mark Twain: degrau por degrau. A Natureza também age assim. Não custa imitá-la. Afinal, queremos mais do que nunca que o modelo de desenvolvimento agrícola do Paraná dê certo. Para todos.

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