• Carregando...

De há muito, certos órgãos da mídia vêm alimentando uma pertinaz e insólita campanha de descrédito das Forças Armadas. A exploração sensacionalista e distorcida de episódios envolvendo militares e organizações militares para a obtenção de audiência é um tipo de jornalismo que certamente não recomenda as organizações que as produzem. Sadio e honesto jornalismo, com liberdade e responsabilidade, são ingredientes essenciais à prática da verdadeira Democracia.

As chocantes cenas do trote dos sargentos do 20.º BIB – embora focalizadas de forma comedida, ponderada e correta pelo noticiário da Gazeta do Povo da terça-feira última, 15 de novembro – foram motivo de iradas cartas de leitores do jornal onde os signatários e signatárias, em meio a ofensas gratuitas ao Exército Brasileiro, questionam a incolumidade física dos jovens que prestam o Serviço Militar e a utilidade e a necessidade da existência das Forças Armadas, o que, no fundo, parece ser o objetivo último de um certo tipo de jornalismo de encomenda.

Como militar reformado do Exército, ao qual prestei quarenta e cinco anos de serviço, utilizo este espaço da Gazeta do Povo – que há mais de quinze anos me concede a generosidade do seu diretor-presidente, jornalista Francisco Cunha Pereira Filho – não para tentar justificar a prática dessa modalidade inusitada de trote, incompatível com as virtudes de camaradagem e de disciplina militar, já motivo de prontas e enérgicas medidas das autoridades responsáveis, com o drástico afastamento do comandante da Unidade – segundo as normas militares, o primeiro e grande responsável por tudo que seu Batalhão faz ou deixa de fazer – e a instauração de uma Sindicância já na sexta-feira anterior à veiculação do fato, logo transformada, face aos indícios de crime, em Inquérito Policial-Militar para apurar as responsabilidades pelos atos e fatos mostrados na televisão, ocorridos em área sob a administração militar, inclusive, a suspeita de venda a jornalistas por um militar da Unidade do material que serviu de base à reportagem. Essa pronta e rigorosa apuração constitui um apanágio da Instituição Militar que não se rende às facilidades do corporativismo para encobrir deslizes e delitos de seus integrantes, entregando inflexivelmente os seus autores ao rigor da Justiça Militar que, através de procuradores credenciados irá acompanhar os procedimentos da investigação, na forma da lei.

Escrevo, ao invés disso, para tentar mostrar as incompreensões e deformações que sempre acompanham esses episódios, quando a emoção proporcionada por cenas chocantes leva a manifestações errôneas, precipitadas, desabridas e injustificáveis. E até a alguns despautérios.

A espinhosa missão das Forças Armadas continua a mesma. Como estatuído no Art. 142 da atual Constituição brasileira, é "a defesa da Pátria, a garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, a defesa da lei e da ordem." Constituídas elas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, "como instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República." São, pois, os instrumentos através dos quais o Estado Nacional exercitará, se necessário e após esgotadas as soluções diplomáticas e pacíficas, o monopólio da violência para a salvaguarda da soberania nacional e a integridade do patrimônio físico da Nação. Todos os dias os soldados do Brasil repetem em sua canção que "a paz queremos com fervor, a guerra só nos causa dor", mas têm eles de estar preparados para ela e para vencê-la, matando e morrendo, se preciso for.

No mundo de hoje, esse monopólio da violência fugiu das mãos dos Estados nacionais e perpassa todas as sociedades no mundo inteiro, como nos mostram as notícias da mídia de todos os dias. É a violência não só da bandidagem comum, mas das "gangues", das torcidas de futebol e dos simples e aparentemente inocentes "vídeogames". Estamos engolfados na "cultura da violência" e os jovens que ingressam nas Forças Armadas são parte de uma geração afetada por essa deformação terrível que se manifesta muitas vezes no próprio "trote" das universidades, resultando em mortes lamentáveis.

O treinamento militar visa a preparar o combatente para enfrentar e vencer o medo e cumprir sua missão, mesmo arriscando a própria vida, a transformar atos rotineiros em reflexos instintivos e condicionados, como o de atirar-se ao chão ao simples sibilar de uma granada de artilharia ou ao zumbido de uma bala.

Os combatentes da FEB e os integrantes de nossas unidades em missões de garantia da paz no exterior – como atualmente no Haiti – viveram e vivem essa experiência. Os problemas psicológicos e existenciais que essas obrigações impõem são algumas das duras servidões da profissão militar.

Foi por tudo isso que o capitão Antônio Siqueira Campos – um dos expoentes do tenentismo – disse certa vez: "À Pátria tudo damos, mesmo nossa vida, e dela nada exigimos, nem mesmo reconhecimento".

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]