Os líderes de Alemanha, França, Ucrânia e Rússia concluíram uma maratona de 17 horas de negociação em Minsk, na Belarus, e chegaram à proposta de um cessar-fogo para interromper o sangrento conflito no leste ucraniano, que já deixou cerca de 5 mil mortos, a maioria deles civis. No domingo, caso a trégua realmente se concretize, tanto as Forças Armadas ucranianas quanto os separatistas pró-Rússia deverão retirar armas pesadas da zona de conflito, criando uma espécie de "zona desmilitarizada" monitorada pela Organização para Segurança e Cooperação na Europa (OSCE). Alguns dos termos são os mesmos de um outro cessar-fogo acertado também em Minsk, em setembro do ano passado, e que teve poucos resultados, o que permite ver o novo acordo com um certo ceticismo ou, na melhor das hipóteses, com um otimismo resguardado, como o demonstrado na nota emitida pelo governo norte-americano.
Que Angela Merkel, François Hollande e Petro Poroshenko desejam o fim da instabilidade na Ucrânia é indiscutível. A incógnita é Vladimir Putin. Afinal, foi ele quem fez de tudo para criar a situação que desembocou, primeiramente, na independência da Crimeia, posteriormente anexada à Rússia e o presidente russo já não esconde sua participação neste caso e, depois, na rebelião no leste ucraniano, com participação (comprovada por imagens de satélite, mas sempre negada por Putin) de tropas russas e envio de armas para os rebeldes separatistas. O estopim da crise, é preciso lembrar, foi a revolta popular contra o então presidente ucraniano Viktor Yanukovich, que na última hora desistiu de um acordo com a União Europeia, a pedido russo. Se Putin vem auxiliando os rebeldes por baixo do pano enquanto faz papel de pacifista em público, o que garante que seus apelos pela paz feitos após a conclusão das negociações nesta quinta-feira sejam sinceros?
A Rússia, por certo, se ressente da expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), que já inclui vários dos antigos membros do Pacto de Varsóvia (como Polônia, Bulgária e Romênia) e chegou às fronteiras russas com a entrada da Estônia e da Letônia, em 2004. Uma crescente aproximação da Ucrânia com o Ocidente seja por meio de uma eventual adesão à Otan, seja com acordos econômicos com a União Europeia isolaria ainda mais a Rússia no cenário europeu, e por isso Putin se esforça para manter algum nível de controle sobre os governos de quantas ex-repúblicas soviéticas for possível.
O plano traçado por Merkel, Hollande, Poroshenko e Putin nesta semana prevê que, se o cessar-fogo for mantido, as regiões dominadas pelos separatistas poderiam realizar eleições locais, e seriam propostas reformas na legislação ucraniana para dar maior autonomia a essas áreas, o que permitiria a Kiev manter a soberania sobre o leste do país nenhuma palavra, no entanto, sobre uma eventual devolução da Crimeia. Ao manter a península sob seu poder, a Rússia estaria quebrando de vez o Memorando de Budapeste, assinado em 1994 e pelo qual a Ucrânia teve garantida sua integridade territorial em troca da entrega de seu arsenal nuclear.
O mundo olha com atenção para o conflito na Ucrânia, pois se trata do maior impasse militar entre leste e oeste desde o fim da Guerra Fria nos Estados Unidos, chegou-se a levantar a possibilidade de o país fornecer armas aos ucranianos se as soluções diplomáticas falharem, o que aumentaria significativamente a intensidade das hostilidades. Que o diálogo prevaleça, com respeito à soberania ucraniana sobre seu território, evitando que a região seja sugada pela espiral de violência que predomina em outros países, como a Síria e a Nigéria.
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