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Investimentos escassos podem fazer indústria perder o bonde do acordo Mercosul-UE
| Foto: Ilustração: Felipe Lima/Thapcom

Como no velho provérbio, sempre onde há alguém chorando, há alguém disposto a vender lenço. Tão logo o acordo firmado entre Mercosul e União Europeia para o livre comércio foi anunciado, no fim de junho, montadoras europeias celebraram a conquista como um carnaval fora de época no Velho Continente. Claro, com a queda das tarifas de importação dos veículos de lá, que chegam a 35% do valor do produto, em alguns casos, pode-se abrir um generoso e ávido mercado nos países latinos.

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Em 2018, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai compraram 3,3 milhões de novos carros, mas só 73 mil vieram da UE.

Não seria um problema caso a indústria brasileira fosse competitiva. Mas não é. Para se manter nos exemplos dos veículos, enquanto os europeus investem pesado em elétricos ou híbridos, o Brasil ainda se abraça aos carros a combustão. Será difícil exportar nossos modelos gasolina/álcool para um mercado consumidor que vê o interesse por modelos mais sustentáveis crescer a uma ordem de 50% a cada semestre – muito, é claro, graças a incentivos governamentais.

Pior, com os tecnológicos carros importados a preços competitivos nas lojas, os brasileiros precisarão mostrar a que vieram. E até onde chegam.

Não há dúvida de que o acordo Mercosul-União Europeia tira o Brasil de um isolamento comercial. O país só assinou acordo internacional com os vizinhos de continente, enquanto, no mundo, existem cerca de 300 deles vigentes – que respondem a cerca de 60% de tudo o que é comercializado. Se bem sinalizado, o novo contrato ventilará a economia nacional e fará o setor produtivo se modernizar, ficar mais competitivo e com melhor custo-benefício. Todos ganham com isso, sobretudo o consumidor, que é sempre relegado à última ponta deste cabo de guerra macroeconômico.

Mas, em vez de se deitar sobre os louros de uma vitória histórica, o Brasil precisa acelerar seus esforços para não ser atropelado e “sentir saudade do que não viveu”. E nesse jogo estamos há anos em atraso. A indústria brasileira, que é quem mais precisará de ajuda, hoje responde a 11% do PIB nacional. É o pior índice em 70 anos. Essa fatia encolheu por conta de falta de investimento, modernização e legislação ultrapassada. Embora os países latinos tenham ganhado 15 anos até a implementação completa do acordo, a solução para os problemas no Brasil ainda é uma corrida com obstáculos.

De dentro para fora, por exemplo, ainda ocupamos um lugar mediano em rankings de inovação na indústria, como aqueles que medem a inclusão no mundo digital-automatizado, a indústria 4.0.

De fora para dentro, reformas como a tributária, que pode colocar um fim ao caos burocrático do país, começaram apenas há pouco a avançar. Da mesma forma, a União joga as esperanças em reformas estruturais que passam como um pebolim na discussão política: caso da previdenciária. Sem a segurança das contas públicas, quem mais sofre é justamente a área de investimentos. Com investimentos diminutos, os gargalos da produção e escoamento brasileiros vão se empilhando.

Nos estados, não é diferente. Em entrevista à Gazeta do Povo, o secretário da Fazenda do Paraná, Renê Garcia Júnior, admitiu um orçamento na casa dos R$ 3 bilhões abaixo do previsto para 2019. Um corte que vai direto na carne dos custos negociáveis, aqueles que ao contrário do salário do funcionalismo, por exemplo, podem ser contingenciados. O mais sensível deles: os investimentos no estado – obras em estradas, portos, distritos industriais e por aí vai.

Um alento são as privatizações de projetos de infraestrutura, que avançam a melhor contento. E podem inspirar uma melhoria de ambiente de negócios. Ao menos, é a tendência.

Embora inspire ações imediatas, o acordo não é uma via perigosa de mão-única. Enquanto a indústria traça estratégias para tirar proveito do contrato, o agronegócio – o Paraná é destaque aqui – celebra a abertura de um mercado extremamente protegido aos produtos brasileiros. Agricultores brasileiros estão em festa, ao contrário dos profissionais de países como a França, onde o campo se defende com subsídios do governo. Mas, aí, é o Brasil quem vende os lenços.

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