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Conselheiro Ivens Linhares, do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR)
Conselheiro Ivens Linhares, do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR)| Foto: Wagner Araujo/TCE-PR

O fundo de previdência dos servidores do Paraná acabou se tornando o principal debate da sessão de quarta-feira (6) do Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), dedicada exclusivamente à análise das contas de 2018 do governo do Paraná. Ainda que com ressalvas, recomendações e determinações, as contas administradas por Beto Richa (01 de janeiro a 5 de abril) e Cida Borghetti (6 de abril a 31 de dezembro) foram aprovadas pela maioria (4 votos a 2), mas as modificações que ambos promoveram nas regras do Regime Próprio de Previdência Social do Paraná (RPPS) foram alvos de duras críticas ao longo da sessão.

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Durante a leitura do seu relatório com mais de 40 páginas, o relator das contas, conselheiro Artagão de Mattos Leão, deu os primeiros números do problema. Ele explica que a reestruturação do plano de custeio do regime de previdência feita pela lei estadual 18.469/2015, no início do segundo mandato de Beto Richa (PSDB), resultou no acúmulo de sucessivos déficits, atingindo em 2018 um furo de aproximadamente R$ 5 bilhões, somando os saldos negativos registrados no Fundo Financeiro, Fundo Militar e Fundo de Previdência.

A lei de 2015 transferiu parte dos aposentados e pensionistas do Fundo Financeiro para o Fundo de Previdência e trouxe a obrigação de pagamento dos benefícios antes custeados pelo Tesouro do Estado para os cofres do Fundo de Previdência. Em 2014, o Fundo de Previdência era responsável pelo custeio de 13.862 beneficiários (inativos e pensionistas). Passou a atender 45.444 beneficiários em 2015. Isso trouxe resultados deficitários nos exercícios de 2015, 2016, 2017 e 2018, nos valores de R$ 351,7 milhões, R$ 424,6 milhões, R$ 535,6 milhões e R$ 464,3 milhões, respectivamente.

A lei de 2015, segundo o relator, teria repassado de forma indireta aproximadamente R$ 7 bilhões (em valores corrigidos pelo IPCA) dos cofres do Fundo de Previdência para o Tesouro do Estado entre 2015 e 2018.

“As disponibilidades financeiras do Fundo de Previdência correspondiam a R$ 7,9 bilhões no encerramento do exercício de 2014. Caso o governo do Estado não tivesse realizado a alteração, seria de aproximadamente R$ 13,2 bilhões no final do exercício de 2018. Contudo, apresentou saldo de R$ 6,2 bilhões, caracterizando o processo de descapitalização do Fundo de Previdência”, continua o relator, lembrando que a alteração legislativa não foi avalizada pelo Ministério da Previdência Social.

"Com certeza o Estado precisa se debruçar com vontade para fazer sua reforma da previdência", observou Mattos Leão durante a sessão.

“Irreal e fantasioso”

Outro conselheiro, Ivens Linhares, endossou a preocupação do relator com o regime de previdência, mas acrescentou duras críticas a uma alteração legislativa ainda mais recente, feita no apagar das luzes da gestão Cida Borghetti (PP), em dezembro de 2018. Trata-se da lei estadual 19.790, assinada em 20 de dezembro de 2018, e que isenta o Estado do pagamento da contribuição sobre a folha de inativos e pensionistas, e o obriga a aportes escalonados, até o ano de 2092, para o custeio do regime de previdência, a partir de alíquotas com amortização que começam em 0,5% e chegam até a 58%.

“Houve a extinção da contribuição patronal dos inativos e pensionistas sem oferecimento de uma base confiável de recursos que podem ingressar de fato no regime previdenciário”, afirmou Linhares, para quem aportes de 58% só seriam possíveis com um “milagre financeiro”. A expressão também foi usada pelo procurador-geral de Justiça, Ivonei Sfoggia, quando, no ano passado, encaminhou um ofício à Assembleia Legislativa se posicionando de forma contrária à alteração legislativa (na época, o projeto de lei 402/2018).

“A única preocupação que não se vê é com o equilíbrio-financeiro e atuarial do sistema previdenciário, o que realça a prática não republicana de sempre postergar os problemas para as futuras administrações”, escreveu Sfoggia, na reprodução lida pelo conselheiro Linhares. “Não é apenas o TCE quem está falando. O próprio Ministério Público foi contra”, reforçou o conselheiro.

Posição semelhante teve o procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC), Flávio de Azambuja Berti, que também criticou duramente a lei de 2018. Para ele, trata-se de um plano de custeio “irreal e fantasioso”. “Esta situação escancarou a inadimplência estatal e a falta de comprometimento com as finanças públicas, produzindo verdadeira peça de ficção ao prever um plano de amortização cuja probabilidade de inadimplemento é quase inexistente”, opinou Berti.

Linhares aponta que, com o advento da lei, o que “era uma situação deficitária de R$ 16,59 bilhões virou um superávit de R$ 70,45 milhões”: “É evidente que o problema da previdência é extremamente grave. Mas, além de não ter sido enfrentado o problema, houve a apresentação de um plano de custeio que não é real. Foi mascarada a situação previdenciária do Paraná. Este superávit de R$ 70 milhões não vai acontecer. Nós podemos afirmar isso com a mais absoluta certeza”.

O conselheiro concluiu que a edição da lei representa irregularidade grave cometida pela gestão Cida Borghetti, daí seu voto pela rejeição das contas de 2018, na contramão da maioria dos membros do Pleno do TCE. Linhares ponderou que a então governadora do Paraná foi alertada sobre as falhas do projeto de lei e, ainda assim, sancionou um plano de custeio “sabidamente equivocado”, após aprovação da Assembleia Legislativa. “A gestão da previdência foi seriamente comprometida em 2018”, disse ele.

Também crítico da lei de Cida, o conselheiro Fernando Guimarães foi o segundo voto contra as contas do governo do Paraná. Seguindo voto do relator, Mattos Leão, os conselheiros Ivan Bonilha, Durval Amaral e Fabio Camargo foram favoráveis às contas.

A Gazeta do Povo entrou em contato com a assessoria de imprensa da ex-governadora do Paraná, que enviou uma nota na manhã desta sexta-feira (8): "A lei foi elaborada por técnicos da Paranaprevidência com o objetivo de assegurar a sustentabilidade financeira do fundo previdenciário. A lei aprovada e sancionada em 2018 equaciona o déficit atuarial e põe fim à controvérsia em torno da contrapartida patronal sobre inativos e pensionistas. A definição das alíquotas anuais levou em conta a disponibilidade orçamentária e financeira do governo do Paraná, projeções do impacto dos aportes sobre o Tesouro e sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal", diz o texto.

Em 18 de dezembro do ano passado, o projeto de lei 402 foi aprovado na Assembleia Legislativa com o apoio de 34 deputados estaduais; outros 12 votaram contra o texto; e também houve uma abstenção. O então deputado estadual Ratinho Junior (PSD), já na condição de governador do Paraná eleito, não participou da votação na Casa.

Atual gestão aposta na adesão à reforma nacional

Em entrevista à Gazeta do Povo nesta quinta-feira (7), o diretor-presidente da Paranaprevidência, Felipe José Vidigal dos Santos, explicou que aposta na adesão do governo do Paraná à reforma da previdência desenhada nacionalmente. “Não vai dar para eliminar completamente o déficit, que é histórico, mas é uma grande oportunidade de resolver parte do problema”, disse ele.

Vidigal dos Santos reconhece que há críticas a serem feitas contra as legislações recentemente aprovadas no Paraná, em 2015 e em 2018, mas pondera que não se pode fazer “uma análise simplista da situação” e reforça que “tudo isso será superado” a partir da reforma da previdência capitaneada pelo governo federal. “Desde 1998 [ano da criação do Paranaprevidência], nenhum governo estadual conseguiu cumprir com tudo. Mas agora vamos ter novos parâmetros”, defendeu ele.

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