
Ouça este conteúdo
A arrecadação a partir da exploração comercial das Cataratas do Iguaçu, em Foz do Iguaçu (PR), está no centro da disputa entre a União e o governo do Paraná pela propriedade de 10,8 milhões de metros quadrados de terra, equivalente a cerca de 6% da área do Parque Nacional do Iguaçu (PNI) — a área total é de 1,7 bilhão de metros quadrados.
Receba as principais notícias do Paraná pelo WhatsApp
No dia 5 de fevereiro, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) reconheceu que a área, de matrícula 35.598, é de propriedade do estado do Paraná. A União pode recorrer da decisão que deve impactar os cofres dos governos federal e estadual.
O contrato de concessão para a visitação das Cataratas do Iguaçu, assinado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), atual administrador do parque, com a Urbia Cataratas, em julho de 2022, prevê o repasse de 7% da receita operacional bruta para os cofres da União a partir de julho de 2026. No último relatório anual disponível, de 2023, a receita da concessionária foi de R$ 211,7 milhões, o que daria R$ 14,8 milhões ao ICMBio naquele ano.
Além da visitação das Cataratas, a área em disputa compreende a concessão dos passeios de barco conhecidos como “Macuco”. Pelo contrato assinado em 2010 com a empresa Ilha do Sol, o ICMBio tem direito a 8% da arrecadação, o que em 2023 foi equivalente a R$ 6,3 milhões — o contrato que vencia em 2020 foi prorrogado por mais cinco anos.
O Hotel das Cataratas, de propriedade da rede Belmond, também destina parte dos rendimentos para o ICMBio. O contrato assinado em 2007, com duração de 20 anos, prevê o pagamento de um valor fixo mensal pelo arrendamento da área. A empresa tentou reduzir o valor devido à pandemia da Covid-19, mas a Justiça manteve inalterada a obrigação do hotel. O valor mensal pago ao ICMBio passa de R$ 1 milhão.
Estado do Paraná vai buscar diálogo com União e ICMBio
O governo do Paraná entende que esses repasses deveriam ser feitos para os cofres estaduais e não para a União, o que estaria prejudicando a arrecadação que seria do estado por direito. Os contratos de concessão assinados pelo ICMBio, inclusive, não poderiam ter sido celebrados por se tratar de uso de uma área estadual, e não federal.
Em 2020, foi aprovada uma lei na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), de autoria do deputado Luiz Fernando Guerra (União), que prevê a concessão do uso das terras de forma onerosa ao ICMBio, ou seja, a União deve pagar ao estado do Paraná pela exploração comercial do espaço. Pelo texto da lei 20.222/2020, o que é arrecadado é repassado aos cofres do estado para a conservação do parque e aos municípios limítrofes.
O texto alterou uma lei anterior, de 2013, sancionada pelo ex-governador Beto Richa (PSDB), que cedia a área gratuitamente ao ICMBio. A lei, na prática, não foi aplicada por causa do imbróglio na Justiça.
Agora, com a decisão do TRF-4, o estado do Paraná se sente amparado para ser o beneficiário da arrecadação das concessões e do arrendamento do hotel. “É um ganho importante para o estado”, analisa o procurador-geral do Paraná, Luciano Borges. “Como a questão estava em litígio, optamos por não tomar nenhuma providência [quanto à aplicação da lei]”, explica.
Em nota, o ICMBio criticou o entendimento do TRF-4, descrevendo a decisão como “intempestiva e temerária”. Para o órgão, "a decisão focou exclusivamente no interesse econômico, mas a interpretação está equivocada".
Segundo o ICMBio, "o imbróglio jurídico poderia provocar o fechamento do Parque Nacional do Iguaçu por anos, impactando toda a cadeia produtiva do turismo em Foz do Iguaçu e região". A nota não fala sobre uma eventual uma busca de consenso com o estado para sanar a questão.
É nesse consenso que a Procuradoria-Geral do Estado do Paraná (PGE-PR) pretende trabalhar para conseguir aplicar a lei aprovada em 2020. “A partir dessa sentença, vamos dialogar com a União e com o ICMBio para construir uma solução”, adiantou Borges.
No entendimento do ICMBio, os contratos de concessão passariam a ser nulos. A PGE acredita ser possível manter os contratos como estão, desde que haja uma espécie de compensação para os cofres estaduais.
“Não queremos mexer no contrato da concessão, até porque seria prejudicial ao estado do Paraná”, confirma o procurador-geral. “A concessionária continua fazendo o trabalho dela. Não temos nenhuma intenção de prejudicar a atividade comercial”, reforça.
Área das Cataratas do Iguaçu pertenceu a um particular na década de 1910
Conhecida antigamente como “Saltos de Santa Maria”, a área em litígio foi doada em 1910 pela União a um particular chamado Jesus Val — a doação foi feita por intermédio do então Ministério da Guerra. Em 1919, o estado do Paraná comprou a área e registrou a escritura no 2º Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Foz do Iguaçu.
Esse foi o entendimento que prevaleceu no TRF-4. “Resta incontroverso que o estado do Paraná nunca concedeu a posse da área para Jesus Val, e quem o fez foi o Ministério da Guerra, o que restou admitido pela própria União, ao destacar a ilegalidade da concessão da posse realizada ao particular”, argumentou o relator, desembargador Luiz Antonio Bonat. O voto dele foi acompanhado pelos desembargadores João Pedro Gebran Neto e Gisele Lemke.
O imbróglio na Justiça começou em 2018, quando a União ingressou com uma ação judicial com o objetivo de cancelar a matrícula. Em primeira instância, na 1ª Vara Federal de Foz do Iguaçu, a posição da União prevaleceu sob o argumento de que se trataria de uma área devoluta federal — um terreno público que não foi cedido ou ocupado legalmente por particulares. O estado do Paraná contestou e então recorreu ao TRF-4.
VEJA TAMBÉM:
- Paraná vai compensar diferença nos royalties de Santa Catarina com obras rodoviárias

- Atração de empresas é aposta de Ratinho Jr. para desenvolver pequenos municípios

- Título de “Vale dos Dinossauros” faz cidade do Paraná sonhar com impulso no turismo

- Governo aposta em 12 novas concessões rodoviárias com leilões do Paraná em setembro







