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Plenário da Assembleia Legislativa
Plenário da Assembleia Legislativa| Foto: Arquivo Alep

Entre janeiro e novembro de 2020, 54 deputados estaduais gastaram no exercício do mandato quase R$ 13 milhões (R$ 12.939.702,35) com a chamada “verba de ressarcimento”. O levantamento foi realizado pela Gazeta do Povo com base no Portal da Transparência da Assembleia Legislativa, que, até início de janeiro de 2021, ainda não disponibilizou os gastos relativos a dezembro de 2020. A verba de ressarcimento é uma cota mensal reservada pela Assembleia para cada parlamentar cobrir despesas relativas ao mandato – no passado, até deputados licenciados tinham direito a ela, o que hoje é expressamente vedado.

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Atualmente, a verba de ressarcimento é de R$ 31.679,80 por mês, ou R$ 380.157,60 por ano, para cada um dos 54 parlamentares. Ou seja, a Assembleia pode gastar até R$ 20.528.510,40 do seu orçamento anual com verba de ressarcimento. Para ter direito ao dinheiro, o deputado precisa apresentar um comprovante da despesa – em 2020, pela primeira vez, notas fiscais dos gastos também foram colocadas no Portal da Transparência. São 31 tipos de despesa abarcados pela verba de ressarcimento, que vão desde material de expediente, combustível e alimentação até pesquisas de opinião, passagens, aluguel de escritório e imóvel em Curitiba.

Somando as despesas de todos os deputados, “locação de veículos” aparece como o maior gasto: foram mais de R$ 2,5 milhões, em 11 meses. Na sequência, estão mais de R$ 2 milhões com “serviços de divulgação da atividade parlamentar”; R$ 1,8 milhão com “serviços técnicos profissionais”, que abarcam serviços de advocacia e de contabilidade, por exemplo, além de serviços de pesquisa de opinião junto à população; R$ 1,1 milhão com “combustíveis em geral”; e R$ 746 mil com “locação de imóveis para escritórios de representação parlamentar”.

São cinco as principais despesas, levando em consideração a totalidade dos gastos, mas os deputados têm padrões de gastos diferentes: no ranking, o campeão de uso da verba de ressarcimento é o deputado Galo (PODE). Ele utilizou R$ 348.338,84 em 11 meses, quase a totalidade da verba disponibilizada pela Assembleia para o período (R$ 348.477,80). No mês passado, a Gazeta do Povo mostrou que mais da metade deste valor (R$ 182.460,40) foi destinado à empresa LOGA 7 Publicidade, de propriedade de Rosana Massolin, ex-esposa de Galo. Eles têm três filhas e dois netos. Os pagamentos à empresa em 2020 foram a título de “serviços e locação de áudio, vídeo e foto” e “serviços de divulgação da atividade parlamentar”.

Procurado nesta sexta-feira (8), Galo reforçou que não se trata de um dinheiro que ele "pediu ou solicitou": "Isso está lá. O deputado define se vai usar ou não. Uns não usam e têm aí suas condições e não necessitam dela, da verba pública. Outros, como é o meu caso, usam a verba de ressarcimento e eu acho importante o uso para divulgar o trabalho que eu faço, para dar satisfação à sociedade".

"Por ser um homem de comunicação, eu tenho muita vontade de mostrar o que eu faço e isso tem custo. Então eu usei boa parte da verba em divulgação do meu trabalho, mostrar à sociedade que eu estou defendendo a sociedade", disse Galo, que também mencionou a necessidade de viagens à base eleitoral e de "se cercar de bons advogados". "Um bom advogado sempre pode te dar orientação sobre projetos que você quer levar para frente e encontra barreiras. Isso custa", explicou ele.

Já o deputado Luiz Fernando Guerra (PSL) foi quem menos gastou ao longo dos 11 meses: foram R$ 31.905,18, valor que corresponde a praticamente um mês de verba de ressarcimento, apenas. “Tivemos um 2020 atípico por conta da pandemia, com sessões remotas, redução nas viagens por conta do distanciamento social e, por isso, fiz aquilo que entendo ser o correto, gastando naquilo que foi estritamente necessário para o bom andamento do mandato”, justificou Guerra. “Defendo e acredito que a política é feita de exemplos, de conseguir fazer mais com menos, como é feito na iniciativa privada, ainda mais em um momento tão difícil como este”, acrescentou ele.

Outros dois parlamentares também registraram gastos baixos, na comparação com os colegas: Rodrigo Estacho (PV) e Mabel Canto (PSC) tiveram uma despesa de R$ 60.131,90 e de R$ 61.076,02, respectivamente. Os valores são inferiores, por exemplo, aos gastos dos dois parlamentares que exerceram o mandato por menos de seis meses. Marcel Micheletto (PL), que se licenciou da Assembleia em meados do ano passado para assumir uma secretaria na gestão Ratinho Junior (PSD), gastou R$ 166.768,93. Seu suplente, Gugu Bueno (PL), gastou R$ 147.683,65.

Marcel Micheletto e Gugu Bueno estão dentro de um grupo de 13 parlamentares que gastaram mais de R$ 100 mil e menos de R$ 200 mil. O maior grupo – com 26 parlamentares – compreende aqueles que gastaram entre R$ 200 mil e R$ 300 mil. Outros 13 parlamentares gastaram mais de R$ 300 mil.

Portal da Transparência mostra notas fiscais, pela primeira vez

A divulgação das notas fiscais relativas às despesas dos deputados pagas com verba de ressarcimento foi feita pela primeira vez no ano de 2020, embora fosse uma promessa antiga das gestões que passaram pelo comando da Assembleia Legislativa – a Lei Complementar 131/2009, a chamada “Lei da Transparência”, que impulsionou a criação dos portais da transparência, já existe há mais de uma década. Agora, no Portal da Transparência da Assembleia, é possível encontrar as notas fiscais apresentadas por todos os deputados, assim como já ocorre no site da Câmara Federal, em relação a verba semelhante oferecida pela Casa aos deputados federais.

Na nota fiscal, nem sempre há descrição detalhada do produto comprado ou do serviço contratado, mas a publicidade do documento é entendida como um dos mecanismos de controle social do dinheiro público. No final de 2019, o Ministério Público do Estado do Paraná (MPE-PR) chegou a cobrar a divulgação das notas fiscais no Portal da Transparência, através de uma recomendação administrativa enviada à Casa.

16 gabinetes usaram “diárias”

Outra novidade de 2020, contudo, desobrigou os deputados a apresentarem notas fiscais quando houver a opção pela “diária”, bastante utilizada no serviço público em geral. Na regra em vigor desde o início do ano passado, as diárias servem para “indenizar as despesas com pousada, alimentação e locomoção urbana” daquele “deputado estadual ou servidor que, para exercer atividade parlamentar, afastar-se da sua sede de trabalho, em caráter eventual ou transitório, para outro ponto do território nacional”.

Um dos pontos que geraram polêmica na novidade é que, antes do surgimento das diárias, os parlamentares já podiam utilizar a verba de ressarcimento para cobrir despesas feitas durante uma viagem relacionada ao mandato, mas desde que apresentassem as notas fiscais de cada valor desembolsado. No modelo de diárias, os parlamentares não precisam apresentar à Assembleia as notas fiscais correspondentes às despesas da viagem, o que reduz a transparência dos gastos. Cada parlamentar pode gastar até 40% da verba de ressarcimento através de diárias.

Entre janeiro a novembro de 2020, 16 gabinetes de deputados registraram despesas com “diárias para o exercício da atividade parlamentar”, conforme levantamento da Gazeta do Povo junto ao Portal da Transparência. No total, o gasto com tal categoria de despesa foi de R$ 167.844,94. Em todos os casos, embora não tenha apresentação de notas fiscais, os gabinetes apresentaram fotos e postagens em redes sociais para comprovar os deslocamentos, e isso foi incluído no Portal da Transparência.

O pagamento das diárias é alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta no Tribunal de Justiça em fevereiro do ano passado pelo deputado Homero Marchese (Pros). Em um primeiro momento, o TJ acolheu parte dos argumentos do deputado, suspendendo trechos da resolução da Assembleia que trata da verba de ressarcimento. A decisão foi do desembargador Mário Helton Jorge.

Em maio do ano passado, ele determinou de forma liminar (decisão temporária, até julgamento do mérito) que a Assembleia suspendesse a diária para um local onde o deputado ou servidor possui residência fixa. O desembargador também determinou que a Assembleia descontasse da diária paga aos servidores o valor correspondente à alimentação, pois os efetivos e comissionados da Casa já recebem um auxílio-alimentação desde 2011.

Mas a Assembleia recorreu contra a liminar e também fez modificações nas regras. Em setembro, o mesmo desembargador acolheu os argumentos da Casa, que é presidida pelo deputado Ademar Traiano (PSDB), e não ratificou a liminar assinada em maio.

A Assembleia fez duas alterações nas regras. Definiu que as diárias “sofrerão desconto correspondente ao auxílio-alimentação a que tiver direito o beneficiário, na proporção de 1/30 para cada diária recebida”. Além disso, a Casa também deixou expressamente definido que “não serão devidas diárias para o beneficiário que, em seu deslocamento, pernoitar em município no qual mantenha residência fixa”, mas “o beneficiário terá direito a diárias quando se deslocar a partir do município no qual mantenha residência fixa para outros municípios a trabalho e desde que o período de deslocamento não seja inferior a seis horas consecutivas”, anotou o desembargador.

A nova posição do magistrado foi endossada pelos demais desembargadores do Órgão Especial. Apesar da negativa em relação à liminar, o mérito da ADI ainda será julgado.

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