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Reunião realizada entre Santiago Peña e Lula no dia 15 de janeiro, em Brasília.
Reunião realizada entre Santiago Peña e Lula no dia 15 de janeiro, em Brasília.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A reunião “sem muitos afagos” que durou cerca de cinco horas entre os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e do Paraguai, Santiago Peña, se estendeu nos últimos dias, com entraves diplomáticos.

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Representantes dos Ministérios de Relações Exteriores dos dois países não conseguiram avançar nas negociações sobre valores da tarifa de energia pagos pelo Brasil sobre o excedente produzido pela hidrelétrica ao lado paraguaio. O caixa da Usina de Itaipu segue travado, por decisão do governo do país vizinho, até a tarde desta segunda-feira (22).

O Brasil pretende manter para este ano proposta próxima aos US$ 16,71 por kilowatt (kW) pagos em 2023, mas o governo paraguaio pressiona: quer mais de US$ 20.

Essa pressão escalou no início do mês. Como é binacional, a usina é gerida igualitariamente pelo Brasil e pelo país vizinho. Se não houver consenso sobre pagamentos, por exemplo, nenhuma movimentação financeira é feita nas duas margens da usina. Para forçar negociação mais favorável, o Paraguai bloqueou o caixa da hidrelétrica, com travas ao chamado Procedimento Provisório do Sistema de Pagamento, resultando em espera de pagamentos a funcionários, terceirizados e fornecedores.

Reuniões sobre tarifa de energia se sucedem, mas avanços patinam

Apesar de ter marcado a primeira visita oficial ao governo brasileiro desde que tomou posse, a reunião entre Peña e Lula na última semana foi o quarto encontro que abordou o assunto entre os dois países, em cerca de seis meses. Uma série de discordâncias vem escalando pela firme posição do presidente paraguaio em defender abertamente a revisão dos valores e levantar a bandeira de que o país precisa receber mais pela energia que produz.

A hidrelétrica é a principal fonte de arrecadação de recursos públicos no país vizinho e, como por lá não se utiliza toda energia produzida naquela margem, o excedente é vendido exclusivamente para o Brasil.

Em dezembro, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deliberou pela manutenção dos valores acordados em 2023 – aceitos pelo presidente antecessor, Mario Benítez. Para sugerir a manutenção, a Aneel considerou a quitação da última parcela da dívida contraída para a construção da hidrelétrica, há 50 anos.

Sem essa obrigação, é estimado que o caixa da Itaipu tenha uma "sobra" de US$ 2 bilhões por ano - e parte seria para a amortização das tarifas que têm valores revisados anualmente. A sugestão da Aneel descontentou o Paraguai. Para que a medida vigore, precisa ser aprovada pelos Conselho de Administração de ambas as margens.

O orçamento anual de Itaipu se aproxima dos US$ 3,5 bilhões, dos quais cerca de 70% eram destinados ao pagamento da dívida, agora encerrada.

Discussão deve provocar embates na revisão do Tratado de Itaipu

A venda do excedente de energia será um dos principais pontos de embate na revisão do chamado anexo C do Tratado de Itaipu, que está em curso e também foi tema da reunião do dia 15.

A revisão ocorre 50 anos após a assinatura do tratado, completados em 2023. O anexo C relaciona as bases financeiras e de prestação dos serviços de eletricidade da usina.

Na renegociação, o governo paraguaio vai reivindicar o direito ao livre comércio, pelo qual poderia vender o excedente ao país que decidir e “a quem melhor pagar”.

A revisão também vai definir como e onde serão utilizados os mais de US$ 2 bilhões em caixa. O diretor brasileiro da hidrelétrica, Enio Verri (PT), defende que parte da verba seja usada para abater preço das tarifas, mas reconhece que as negociações serão arrastadas e que a revisão pode levar anos até ser concluída. Após ser acordada entre os governos dos dois países, o anexo C precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional do Brasil e do Paraguai. Até lá, seguem vigentes as regras atuais.

Lula reconhece divergências

O presidente Lula reconheceu publicamente que há divergências sobre os valores das tarifas, mas que "o tema seguirá sendo tratado pelas equipes de ambos os governos para que se chegue a uma solução".

A preocupação se acentua entre colaboradores e fornecedores da Itaipu que estão com valores em aberto - e não por falta de dinheiro em caixa. Entre os funcionários, não se descarta uma possível paralisação na última semana deste mês, caso soluções não sejam apresentadas. A Itaipu é responsável pela geração de 10% da energia consumida no Brasil.

Peña defende mudança de visão do Brasil sobre o Paraguai

Na primeira visita oficial de Peña ao governo brasileiro, ele defendeu a necessidade de o “Brasil mudar a visão sobre o Paraguai”. Lula disse ao presidente paraguaio que, apesar dos entraves, há disposição para o debate e para a construção de uma solução conjunta. O Brasil é o maior parceiro comercial do Paraguai.

Sobre o tema energia elétrica, a tensão vinha se acentuando desde o fim do ano, quando interlocutores do Ministério das Relações Exteriores do Brasil afirmavam que as negociações estavam complicadas. Do lado paraguaio, a alegação é que o país está disposto a fincar o pé em valores próximo aos US$ 20 por kilowatt (kW) e que essa seria uma condição irredutível.

"Agora é o Brasil que tem que ir a Assunção para que a gente possa continuar as tratativas para encontrar uma solução definitiva", disse Lula.

Santiago Peña considerou que "a visão do acordo foi a construção, a operação e o pagamento da dívida de Itaipu, e os objetivos foram alcançados”, mas completou que a “conversa [com Lula] foi sincera, aberta e construtiva".

Durante a semana, a Itaipu disse que “em uma próxima reunião extraordinária do Conselho de Administração a situação deve ser rapidamente definida” que a “empresa irá honrar todos os seus compromissos, com pessoal e fornecedores, o mais rápido possível”.

O Ministério das Relações Exteriores informou à Gazeta do Povo que “estão em curso tratativas bilaterais entre os governos do Brasil e do Paraguai para definição da tarifa (ou Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade, também chamado CUSE) da Usina de Itaipu para 2024”.

Segundo o Itamaraty, “os dois governos têm interesse que se possa alcançar solução mutuamente aceitável no menor prazo possível, em linha com o excelente momento das relações entre Brasil e Paraguai e a importância da usina para a parceria bilateral”.

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