• Carregando...
 | Aniele NascimentoGazeta do Povo
| Foto: Aniele NascimentoGazeta do Povo

A defasagem no efetivo provocou um reflexo direto no funcionamento da delegacia de Realeza, no Sudoeste do Paraná: desde a última semana, o distrito policial passou a funcionar exclusivamente em horário comercial, fechando as portas à noite. Em caso de flagrantes, policiais militares que fazem as prisões têm passado a madrugada com o suspeito, até que a delegacia inicie expediente no dia seguinte. O fenômeno reabre a discussão sobre a falta de policiais e sobre a viabilidade de implantação de centrais de flagrantes no Paraná – como ocorre em outros estados.

O fechamento da delegacia durante a noite foi determinado por meio de portaria, assinada no dia 19 de julho pelo delegado Lucas Mariano Mendes. No documento, ele alega que não há servidores suficientes para que o distrito funcione em regime de trabalho de turnos. A equipe da delegacia é composta apenas por um delegado, um escrivão e três investigadores – um dos quais está de férias. Além de Realeza, a unidade também atende o município vizinho, Santa Izabel do Oeste. Casos que violência grave continuam a ser atendidos, independentemente do horário.

Mendes não quis conceder entrevista, mas, na portaria, ele embasa sua decisão em orientações de órgãos da própria Polícia Civil – como o Conselho Superior e o Grupo Auxiliar de Recursos Humanos, que apontam que os delegados devem fazer cumprir a jornada de trabalho estabelecida por lei (oito horas diárias, 40 horas por semana). No documento, o delegado menciona que “visivelmente o escrivão e os investigadores lotados nesta delegacia estão física e mentalmente cansados” pela dinâmica.

LEIA MAIS: Sem formação e sem arma, policiais “Pokémons” quebram galho no Paraná

Na madrugada de quarta-feira (26), policiais militares tiveram que passar a madrugada inteira escoltando um homem que havia sido detido com dez quilos de drogas, até que o expediente começasse e fosse possível lavrar o flagrante. Uma conversa de WhatsApp (veja a reprodução abaixo) mostra que, às 00h40, o policial pergunta ao delegado o que fazer com o suspeito. O delegado responde que eles deveriam esperar o início do expediente, conforme a portaria e que poderia “aguardar na DPOL [delegacia], podem ficar à vontade”.

“Sobreaviso permanente”

A Associação dos Delegados do Paraná (Adepol) classifica a situação das delegacias do interior do estado como “um caos anunciado”. De acordo com a entidade, cada distrito mantém um investigador no período da noite, ou – na maioria das vezes – deixa toda a equipe de sobreaviso e, a cada apreensão ou prisão feita durante a madrugada, precisa ir às pressas para a delegacia, para lavrar o flagrante.

“Os delegados e policiais civis do interior do estado estão em um estado de sobreaviso permanente. Isso é desumano. Ficam submetidos a uma escala de trabalho de 24 horas por dia, sete dias por semana. Insano”, disse o diretor jurídico da Adepol, Pedro Felipe de Andrade.

Em junho do ano passado, a Adepol havia expedido uma recomendação aos delegados associados para que procedessem como o responsável pela delegacia de Realeza: que se abstivessem de lavrar flagrantes fora do horário comercial.

A associação também já encaminhou uma série de ofícios a órgão de segurança do estado – inclusive ao Departamento da Polícia Civil e ao Departamento de Polícia do Interior – em que cobra a instalação de centrais de flagrante, nos moldes que já existem em outros estados. De acordo com a proposta, cada microrregião teria uma central com equipe própria, especificamente para atender flagrantes durante as noites e a madrugadas. O modelo é parecido com o que ocorre em Curitiba, que mantém o Centro Integrado de Atendimento ao Cidadão (Ciac), para atender flagrantes fora do horário comercial.

“O estado precisa regulamentar isso. Poderia usar a estrutura das próprias subdivisões policiais, para funcionar como centrais de flagrante. O que não dá é pra manter esse modelo, que está uma tragédia”, disse Andrade. 

Falta de pessoal

Em maio, a Gazeta do Povo mostrou a dimensão da defasagem de efetivo na Polícia Civil. Do quadro de escrivães, apenas a metade está preenchida. Além disso, faltam investigadores e papiloscopistas. O Paraná também enfrenta uma escassez de delegados: 256 cidades estão sem contar com nenhum desses profissionais de segurança.

Outro lado

Por meio de nota, o Departamento da Polícia Civil disse que se trata de “uma situação transitória” e que a Divisão Policial do Interior (DPI) acionou a Subdivisão de Francisco Beltrão - a que Realeza está vinculada - “para dar todo apoio necessário”. A corporação destaca que continuarão a ser atendidos “casos que envolvam mortes, violência, grave ameaça à pessoa, crianças ou adolescentes“ e que a Corregedoria-Geral da Polícia Civil será acionada e será “rigorosamente apurado” qualquer ato em desconformidade com o estatuto da Polícia Civil.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]