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 | Marcelo AndradeGazeta do Povo
| Foto: Marcelo AndradeGazeta do Povo

Depois de cair 6,45% nos últimos seis anos, a produtividade brasileira começa a esboçar uma reação. A projeção da consultoria Tendências é de que, em 2018, o indicador deve crescer 0,5%. Trata-se de uma alta modesta, mas que sinaliza o avanço de um indicador essencial para o crescimento sustentável do País. 

Essa recuperação é resultado de uma combinação de três fatores. Um deles é o chamado "darwinismo econômico": durante a recessão, muitas empresas ineficientes vão à falência e trabalhadores com baixa qualificação são demitidos. "A produção cai num primeiro momento de forma mais rápida do que as demissões, já que as empresas não sabem a extensão da crise", explica Evandro Buccini, economista-chefe da Rio Bravo Investimentos. "Quando a economia volta a crescer, o mercado de trabalho demora para responder, o que favorece o ganho de produtividade no pós-crise." 

Além disso, para sobreviver, ou para se preparar para a retomada, muitas empresas investiram na melhoria de processos, corte de custos e otimização dos recursos. Quando a economia se recupera, elas estão mais eficientes e a produtividade aumenta. 

Na semana passada, por exemplo, a montadora Mercedes-Benz anunciou uma série de inovações na fábrica de caminhões e ônibus de São Bernardo do Campo, resultado do investimento de R$ 500 milhões nos últimos três anos, período em que também demitiu 5 mil pessoas. Com a modernização da unidade e a adoção de conceitos da chamada indústria 4.0, a empresa anunciou um ganho de produtividade de 15%. 

A construtora paranaense Plaenge também investiu na melhoria de processos durante a crise. Um dos focos da Plaenge foi reduzir o tempo ocioso da mão de obra, provocado por falhas na distribuição de material para construção, como tijolos ou cimento. "Uma construção que custava R$ 31 milhões, agora custa R$ 1,8 milhão a menos", diz Marcelo Resquetti, gerente geral da Plaenge. 

O impulso no indicador de produtividade também veio da macroeconomia, com juros e inflação convergindo para mínimas históricas. Segundo Alessandra Ribeiro, da Tendências, as mudanças na legislação trabalhista e a Lei de Responsabilidade das Estatais ajudaram a melhorar o ambiente de negócios, estimulando investimentos. "Os efeitos dessas reformas devem aumentar ao longo do tempo." 

Voo de galinha 

Mas ainda há muito a fazer para livrar o Brasil da síndrome de "voo de galinha", em que o crescimento é sempre baixo e de curta duração. Para o País emplacar um crescimento ao "estilo chinês", mudanças estruturais profundas precisam ser feitas. 

"O aumento de produtividade envolve três aspectos", explica o economista José Alexandre Scheinkman, da Universidade Columbia, nos EUA. "Aumento da educação dos trabalhadores, do estoque de capital na economia e, também, maior eficiência na forma como capital e trabalho são usados de forma combinada." 

Esse terceiro ponto depende de melhorias no ambiente de negócios. Trata-se de uma agenda que envolve redução da burocracia, investimentos em infraestrutura, criação de regras e marcos regulatórios que deem clareza e previsibilidade no cumprimento de contratos, aumento da competição entre os agentes econômicos e simplificação tributária. 

Desafio 

Posto em números, é possível ver o tamanho do desafio. A pedido do jornal O Estado de S. Paulo, o banco Santander calculou o esforço que o País precisa fazer para aumentar o potencial de crescimento do PIB, ou seja, o quanto a economia consegue crescer sem exaurir sua capacidade e provocar alta da inflação - que depende de mais produtividade. 

Estudos do banco indicam que, hoje, o teto está próximo de 2% ao ano. Para crescer 4% de forma consistente, a taxa de investimentos terá de sair dos atuais 15,6% para 21% do PIB - e a produtividade crescer 2,3% ao ano. "É um ritmo de crescimento que o País não consegue sustentar desde a década de 70", diz Maurício Molon, economista-chefe do Santander. 

Na crise, empresas investiram em tecnologia 

Nos últimos dois anos, muitas empresas tiraram da gaveta projetos para melhoria de processos e adoção de novas tecnologias. Elas precisavam se adequar à queda na produção, ao aumento de custos, mas, principalmente, se preparar para a retomada do crescimento. 

"Com os níveis de inflação que tivemos nos últimos anos, a empresa que não investiu em produtividade passou por grandes apuros", diz Armando do Valle Junior, vice-presidente para América Latina da Whirlpool. "Não houve, e continua não havendo, espaço para repassar os aumentos de custos para os preços." 

Segundo o executivo, a empresa realizou cerca de 700 tipos de investimentos, "de softwares a máquinas", para aumentar a produtividade. 

A Celma, divisão de Aviação da GE no Brasil, há dois anos investe em novas tecnologias, como impressão 3D, big data e realidade aumentada, para se tornar mais eficiente. A impressão 3D é usada para a construção de peças e ferramentas usadas na manutenção das turbinas. O ganho é evidente: em vez de encomendar uma ferramenta, que poderia levar dias, ela é "impressa" em até 12 horas, dependendo do tamanho. 

A GE Celma trabalha para ter, até o final do ano, um sistema de coleta e análise de dados para melhorar a eficiência no processo de revisão das turbinas e uso de "óculos inteligentes" com realidade aumentada para facilitar a inspeção de motores. "A tendência é que essas tecnologias se tornarem cada vez mais comuns", diz Julio Talon, presidente da GE Celma. 

A montadora de ônibus Marcopolo também aproveitou a recessão para um ajuste. A empresa, com sede em Caxias do Sul (RS), criou um programa para atacar quatro áreas: segurança, qualidade, entrega e custo - todos ligados ao aumento de eficiência e produtividade. Com isso, reduziu em 70% o número de acidentes, que resultam em menos afastamento dos profissionais. 

As falhas de produção caíram pela metade e os custos 7; Ao mesmo tempo, houve um ganho de 20% no tempo de montagem de um ônibus. 

"Para competirmos globalmente, fazer mais com menos é uma busca constante", diz diretor-geral da Marcopolo, Francisco Gomes Neto. 

Entre 2011 e 2016, a produção da Marcopolo caiu de 21.320 unidades produzidas para 7.181. No ano passado, subiu para 8.852 unidades. 

Brasil avança pouco na comparação com outros países 

Nos anos 90, a produtividade brasileira correspondia a 25% da americana. E nada mudou em 30 anos. Segundo estudo da consultoria internacional Conference Board divulgado no final do ano passado, cada brasileiro produziu, em média US$ 30.265 em 2016. Um americano, US$ 121.260. 

Além dos EUA, outros 76 países estão na frente do Brasil nesse ranking, com 124 nações. "Não acompanhamos o desenvolvimento de economias mais maduras", diz o economista Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central. Em 1950, a produtividade da Coreia do Sul correspondia a 11% da produtividade dos EUA, por exemplo. Em 2016, chegou a 60%. 

A baixa escolaridade no Brasil ajuda a explicar esse atraso. Na empresa de tecnologia de informação Totvs, por exemplo, os profissionais contratados para trabalhar nas subsidiárias da Rússia e dos EUA, em geral, já chegam treinados. "No Brasil, precisamos de até 120 dias de treinamento até que comecem a dar retorno." 

Mas o problema não se restringe à educação. A burocracia também é um limitador. É possível identificar isso no caso da Lukscolor. Como fabricante de tintas, o objetivo da empresa é, obviamente, produzir e vender tintas. Mas cerca de 30 dos 500 funcionários da empresa, 6% do quadro, têm como única função passar o dia acompanhando as mudanças tributárias que ocorrem nos âmbitos federal, estadual e até municipal, e cuidar do recolhimento dos tributos. 

"Não é investimento em vendas, que gera receita. São custos que não podemos cortar", diz Angélica Albuquerque, diretora da Lukscolor. 

O Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) estima que o trabalho de acompanhamento das mudanças tributárias custe em média 1,5% do faturamento das empresas (ou R$ 200 bilhões anuais). 

De 1988 até outubro de 2017, a burocracia estatal brasileira criou 377.566 normas tributárias, das quais apenas 26.268 estavam em vigor em setembro do ano passado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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