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| Foto: André Borges/Agência Brasília

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que limita a prerrogativa de foro de deputados federais e senadores abre a possibilidade de parlamentares serem presos no exercício da função sem a necessidade de aval do Congresso. A Constituição Federal prevê que as prisões preventivas devem ser aprovadas pela Casa Legislativa a qual o parlamentar pertence, mas em casos de condenação em processos criminais transitados em julgado os políticos já podem ser presos sem autorização de seus pares. A decisão do STF sobre o foro privilegiado, porém, abre uma nova discussão: os parlamentares poderão ser presos após condenação em segunda instância?

Pela decisão dos ministros do Supremo, a Corte vai ficar responsável apenas por julgar crimes cometidos durante o mandato parlamentar e em razão dele. Os demais casos serão encaminhados à primeira instância, onde a tramitação costuma ser mais rápida.

Atualmente, o STF entende que condenados em segunda instância já podem ser presos para começar a cumprir a pena. É o caso do ex-presidente Lula, por exemplo, que foi detido no início de abril com base nesse entendimento para cumprir a pena de 12 anos e um mês a que foi condenado na Lava Jato.

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Dependendo do local onde os crimes forem investigados, a condenação em segunda instância pode ocorrer antes de terminado o mandato parlamentar, que dura quatro anos. Os casos da Lava Jato que saírem do STF e tiverem como destino a Justiça Federal do Paraná ou do Rio de Janeiro, por exemplo, onde há uma força-tarefa montada e um juiz exclusivo para processar os investigados, podem andar mais rápido que casos encaminhados a outras esferas judiciais.

O caso do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), ajuda a explicar a diferença entre os ritmos processuais. Enquanto era investigado no STF, o ex-deputado manteve o cargo e enfrentou o processo de cassação mais longo da história do Conselho de Ética da Câmara. Um mês após ser cassado pelos pares e perder a prerrogativa de foro, Cunha foi preso por ordem do juiz federal Sergio Moro, em outubro de 2016. Ele foi condenado pelo magistrado em março de 2017 e a condenação em segunda instância veio definitivamente em março desse ano. Ou seja, entre a prisão, oferecimento de denúncia, sentença em primeira instância e confirmação da condenação em segundo grau se passou menos de quatro anos.

O professor de Direito Constitucional do Ibmec, Alexandre Bahia, alerta, porém, para a possibilidade de os casos não andarem com tanta rapidez quanto o esperado em primeira instância.Ele lembra do caso do ex-deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB), que renunciou ao cargo quando estava prestes a ser julgado pelo STF. “O processo ficou mais de um ano sem tramitação em Minas Gerais e já está quase prescrevendo”, diz o professor.

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Ele ressalta que os processos que são encaminhados à Justiça Federal, que tem uma estrutura melhor, tendem a ser mais céleres do que os que vão parar nas Justiças Estaduais. “Ainda que a primeira instância vá mais ou menos rápido, o que demora são os recursos. Em São Paulo, por exemplo, um processo demora mais de três anos para catalogar o recurso na segunda instância”, exemplifica.

Prisão de parlamentares

A prisão de parlamentares em exercício do mandato começou a ser discutida no caso do ex-senador Delcídio do Amaral (PT). O então petista foi o primeiro parlamentar preso no exercício do mandato desde a Constituição de 1988. Mesmo com a prisão em flagrante pela Lava Jato, o Senado precisou autorizar a permanência de Delcídio na prisão. No caso do senador Aécio Neves, o STF determinou seu afastamento do mandato, mas o Senado decidiu revogar a decisão dos ministros.

O caso mais recente de parlamentar preso é do deputado federal Paulo Maluf. Como ele foi condenado em última instância, pelo STF, a prisão ocorreu sem precisar de autorização da Câmara dos Deputados.

A prisão de parlamentares após uma decisão em segunda instância, porém, pode gerar questionamentos. Para o coordenador da pós graduação em Direito Constitucional da Universidade Positivo, Eduardo Faria, essa é uma questão que vai surgir em breve, caso não esteja presente no acórdão do STF sobre a restrição ao foro privilegiado.

“Não há duvida nenhuma que esse vai ser um ponto que vai suscitar um novo debate no ambiente institucional sobre possibilidade de prisão de parlamentar em segunda instância, mesmo sem transito em julgado. Isso pode impactar na perda do mandato”, explica.

Para ele, a questão tem potencial para gerar um choque entre os poderes no futuro. “Podemos ter um parlamentar eleito e uma decisão que ainda não transitou em julgado e outro poder determinando a prisão. Estou retirando um mandato, fruto da expressão popular e do voto, antes de ter uma decisão definitiva. E se essa decisão [a condenação] for revertida depois”, questiona Faria.

Para ele, essa possibilidade pode acabar gerando abusos. “Abre uma possibilidade efetiva para que em determinadas circunstâncias, em determinados locais, eu tenha processos que eventualmente sejam utilizados como procedimentos que acabem criminalizando a política, o parlamentar, e interferindo nas regras do jogo democrático”, alerta.

Julgamento histórico

O julgamento sobre foro privilegiado foi finalizado nesta quinta-feira (3) com o voto do ministro Gilmar Mendes. Os ministros começaram a discutir o caso em maio do ano passado, mas a discussão foi pausada por um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. Em novembro, o STF retomou o julgamento, mas um novo pedido de vista, do ministro Dias Toffoli, interrompeu novamente a deliberação.

Em paralelo à decisão do STF, tramita no Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acaba com a prerrogativa de foro de parlamentares e membros do Poder Judiciário e do Ministério Público. Pela proposta, do senador Alvaro Dias (PODE-PR), apenas o presidente e vice-presidente da República e os presidentes dos poderes manteriam a prerrogativa. O projeto já foi aprovado no Senado no ano passado e aguarda tramitação na Câmara.

Nesta quinta, após o STF decidir limitar o foro, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), determinou a instalação da comissão especial que vai analisar o mérito da PEC.

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