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As campanhas dos candidatos a presidente começaram e junto com elas uma enxurrada de promessas para o eleitor, algumas impossíveis, outras inviáveis, e outras tantas que não dependem apenas do futuro presidente para saírem do papel. Na maioria dos casos, projetos propostos pelo presidente do Brasil dependem de leis, feitas pelo Congresso. Em outros, falta dinheiro para realizá-los. E há ainda aqueles casos em que a ideia é ótima, mas falta a concordância de algum outro agente envolvido (como as empresas ou os milhões de investidores do mercado financeiro) agindo como espera o presidenciável.

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Outro problema é a inviabilidade de determinadas promessas. É o caso, por exemplo, do compromisso adotado pelo candidato Cabo Daciolo (Patriota), de fazer o Brasil ser a maior economia do mundo durante seu governo. O Brasil é hoje a 8ª maior economia, atrás de países como Estados Unidos e China, e é impossível – com crise ou mesmo se o país deslanchar em crescimento – alcançar tal posição. 

Outras campanhas evitaram ser mais específicas em suas propostas, caso de Geraldo Alckmin (PSDB), que trouxe seu programa de governo em apenas nove páginas, sem detalhas suas ideias. Abaixo, listamos algumas promessas feitas pelos candidatos que não dependem apenas da vontade e da força política do futuro presidente.

1) Privatizar muito – e ainda manter controle das empresas  

Algumas dificuldades políticas que poderiam surgir durante o processo de privatizações poderão ser contornadas, com bem desenhadas “golden shares”, garantidoras da soberania nacional.

Programa de governo de Jair Bolsonaro

A promessa: Jair Bolsonaro (PSL) tem adotado um discurso liberal na economia, prometendo reduzir o tamanho do Estado. Mas, como ainda defende alguns preceitos nacionalistas, tais privatizações não podem tirar a “soberania nacional”, como defende o deputado federal em seu plano de governo. Para solucionar isso, Bolsonaro sugere manter “golden share” na mão do governo, uma classe especial de ações na composição acionária das empresas estatais vendidas, que dá ao seu detentor (a União) o poder de veto ou de palavra final sobre as decisões das empresas. Hoje, o governo detém golden shares da Vale e da Embraer, e o processo de privatização da Eletrobras, que está em curso, também previa tal poder de veto à União. 

O problema: A imposição de limites aos possíveis compradores de ações de empresas estatais em processo de privatização é transformada em maior risco ou menor precificação dos ativos. Ou seja: se o presidente impuser que as privatizações manterão os futuros compradores sócios do governo – e consequentemente não poderão definir sozinhos a gestão da empresa, terá de aceitar valores menores no processo de privatização. Quanto maiores forem as amarras ao poder privado, mais difícil é a realização de privatizações. Exemplo disso foi o processo de tentativa de venda da loteria Lotex, da Caixa Econômica Federal. O governo acreditava conseguir R$ 1 bilhão com a operação, que acabou sendo atrasada em mais de um ano e meio, para ser cancelada após redução à metade do valor. Algumas empresas do setor de jogos reclamavam que o governo queria fazer o processo de forma a manter a Caixa presente na gestão das loterias, o que tiraria o apetite dos investidores. 

2) Acreditar que o mercado vai fazer o que eles querem 

Redução da indexação no mercado financeiro, através da substituição gradual da participação de Letras Financeiras do Tesouro, corrigidas pela Selic, por títulos prefixados no financiamento da dívida.

programa de governo de ciro gomes

Desmobilização de ativos públicos, com o correspondente resgate da dívida mobiliária federal” e “redução natural do custo médio da dívida, na medida em que o endividamento total caia.

Programa de governo de Jair Bolsonaro

O governo federal reduzirá o custo do crédito, combatendo os elevados níveis de spread bancário.

programa de governo do PT

A promessa: diversos candidatos prometem reduzir a dívida pública ou os seus juros, além de determinarem a redução do spread bancário (o custo da atividade dos bancos). 

O problema: A gestão da dívida pública, para melhorar o perfil da dívida, é uma tarefa diária do Tesouro Nacional. Como em uma casa, os gestores estão o tempo todo tentando trocar títulos com juros altos ou prazos curtos, que estão nas mãos de investidores, por opções melhores para a União, com menor juros e maior prazo (assim como faria um chefe de família ao tentar renegociar um financiamento, por exemplo). Porém, quando tal movimento é feito de forma abrupta ou em grande volume, o mercado financeiro cobra mais caro para trocar tais dívidas, tornando menos vantajoso para os cofres públicos. Esse seria o caso das promessas de Ciro Gomes e Bolsonaro citadas acima. Quando o assunto é o ganho dos bancos, o mesmo problema ocorre. O governo não pode exigir que os bancos reduzam seus lucros ou suas taxas. A redução dos spreads deve acontecer com a melhora do ambiente de negócios e redução da inadimplência e do risco, por exemplo. 

3) Geração rápida de emprego

Lula implantará o Plano Emergencial de Empregos como primeiro passo para devolver a dignidade a milhões de famílias que tanto sofreram pelo drama do desemprego

programa de governo do PT

Criação de um programa emergencial de emprego, com ênfase nas áreas de saneamento e construção civil, em consonância com as políticas de estímulo a estas áreas, conforme proposto nestas diretrizes para o programa de governo

programa de governo de Ciro Gomes

Propomos uma revisão das prioridades de intervenção do Estado, privilegiando as atividades que de fato geram mais empregos

programa de governo de Marina Silva

A promessa: Com 13 milhões de brasileiros desempregados, os candidatos miram atacar esse problema de forma emergencial e urgente. 

O problema: A retomada da geração de empregos é lenta e depende da aceleração da economia. Além disso, a geração de postos de trabalho pode não responder de forma direta ao crescimento econômico. Entre as propostas, Marina Silva e Ciro afirmam que vão priorizar os investimentos estatais em obras que geram mais empregos, como no setor da construção civil. Já Lula propõe maior intervencionismo em empresas como a Petrobras, o que pode repetir erros do governo petista ao utilizar empresas públicas para movimentar a economia, levando-as a prejuízos bilionários. Em outros momentos, a tentativa de retomada de empregos foi condicionada à redução de impostos (como no programa criado pelo governo petista para o setor automotivo, que não teve os efeitos esperados).

4) Reduzir drasticamente os gastos públicos 

Um número elevado de ministérios é ineficiente, não atendendo os legítimos interesses da Nação”, e “Com o fim do aparelhamento dos ministérios, inverteremos a lógica tradicional do processo de gastos públicos.

programa de governo de Jair Bolsonaro

Revisão de todas as despesas do governo, de modo a eliminar desperdícios, sobreposições e privilégios; os gastos com investimentos, Saúde e Educação deverão ser preservados.

programa de governo de ciro gomes

A promessa: reduzir ainda mais os gastos públicos, seja cortando ministérios ou mudando a forma de gestão de dos recursos usados pelo governo federal. 

O problema: no quinto ano de déficit fiscal e já tendo previsto uma dívida de R$ 139 bilhões para 2019, o governo vem realizando nos últimos anos diversos cortes de gastos das despesas que não são obrigatórias, as chamadas despesas discricionárias. O espaço para corte desses gastos é muito reduzido, sobrando pouco espaço para cortes. Além disso, os gastos de folha de pagamento são obrigatórios e não podem ser cancelados pelo futuro presidente, estando previstos no Orçamento. 

5) Redução de impostos 

Isenção de tributos na aquisição de bens de capital; Redução do Imposto de Renda da pessoa jurídica; Redução de impostos sobre consumo (PIS/Cofins e ICMS).

programa de governo de ciro gomes

Gradativa redução da carga tributária bruta brasileira paralelamente ao espaço criado por controle de gastos e programas de desburocratização e privatização.

programa de governo de Jair Bolsonaro

A promessa: Reduzir impostos, para alguns grupos de contribuintes. 

O problema: As promessas de redução de impostos são, na maioria das vezes, acompanhadas de promessas de elevação de tributos para outros grupos de contribuintes. Mas as contas públicas ainda estão longe de um cenário de conforto, com déficit previsto de R$ 139 bilhões em 2019. Apesar de o brasileiro pagar altos impostos, com quase um terço da riqueza gerada no país ser oriunda dos tributos, para reduzir impostos o futuro presidente ainda precisará de aval do Congresso Nacional e previsão no Orçamento da troca de uma redução tributária para elevar a arrecadação em outro local. 

6) Acabar com o presidencialismo de coalizão 

Vamos romper com o padrão fisiológico da relação com o parlamento, para que a governabilidade seja garantida com base em princípios republicanos. Buscaremos diálogo permanente com o Poder Legislativo, a partir de um programa que expresse agendas de interesse público, com absoluta transparência.

Programa de governo de Marina Silva 

A promessa: Marina Silva colocou em seu programa de governo que vai romper com o “padrão fisiológico” na relação com o Congresso. Ou seja, buscará alcançar quórum para as pautas de interesse do presidente da República sem acordos com trocas de favores entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo. 

O problema: A governabilidade do presidente e mesmo sua manutenção no cargo dependem em grande medida da relação com o Congresso. Para aprovar pautas enviadas pelo Executivo, é preciso fazer alianças com os partidos. Esse é o chamado “presidencialismo de coalizão”, no qual o partido do presidente faz alianças com outros partidos, que compõem sua base aliada no Congresso. Por mais que o próximo presidente lute para evitar que tais acordos passem pelo chamado “toma lá, dá cá”, no qual são distribuídos cargos em órgãos públicos e outras facilidades para os aliados do governo federal, o próximo comandante do país terá de saber compor e fazer acordos com os líderes dos 35 partidos políticos no Congresso. Será preciso saber ceder, quando preciso.

7) Renegociar dívidas privadas 

A promessa: Ciro Gomes promete limpar o nome de 63 milhões de pessoas do cadastro de inadimplentes do SPC. Segundo Ciro, o governo usaria seu poderio institucional para comprar a dívida dos devedores e refinanciá-las com bancos como Banco do Brasil e Caixa. 

O problema: Para realizar essa proposta, o presidente dependeria de aval do Congresso Nacional (o que poderia ser feito com o envio de uma Medida Provisória, mas dependeria da aprovação da maioria dos parlamentares). E mais difícil que isso: seria preciso destinar recursos aos bancos públicos para refinanciarem as dívidas. Estimativas apontam que o resgate da dívida inscrita no SPC pode custar até R$ 80 bilhões, mesmo já considerando os descontos obtidos com a renegociação. A proposta ainda traz mais uma dificuldade: diferentemente dos programas de renegociação de dívidas tributárias da Receita Federal (como o Refis) ou outros programas de descontos tributários (alguns defensores da ideia utilizaram o Repetro como comparação), as dívidas inscritas no SPC são contraídas com agentes privados, bancos e comércios, e não com o próprio governo. Será preciso ter a anuência e participação de tais agentes com a redução de juros e abatimento de dívidas, o que, feito de uma vez só em montante bilionário, também pode reduzir os descontos.

8) Aumentar faixa de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física

(...) isentar o Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) de todos aqueles que ganham até cinco salários mínimos.

programa de governo do PT

A promessa: O candidato a vice de Lula (PT), Fernando Haddad, afirmou que a atual faixa de isenção do IRPF seria elevada de dois salários mínimos (R$ 1,9 mil) para cinco salários mínimos (R$ 4,7 mil). 

O problema: a definição da tabela de correção do IR é um pleito antigo de entidades sindicais e trabalhadores. Porém, depende de aval do Congresso perante a proposta orçamentária, enviada pelo governo no ano anterior. Ou seja, o presidente não conseguiria realizar isso em seu primeiro ano de governo, quando o Orçamento foi feito ainda em outro governo, e ainda dependerá de aval dos parlamentares. Para que a proposta fosse incluída no Orçamento, o governo teria de comprovar outras fontes de receita que compensassem a perda com a isenção. Segundo a Receita Federal, das 28 milhões de declarações do IR entregues em 2017, 22 milhões estão na faixa de até cinco salários. Ou seja, o governo perderia bilhões em arrecadação de impostos.

9) Obrigar médicos a trabalharem para o SUS 

Credenciamento Universal dos Médicos: toda força de trabalho da saúde poderá ser utilizada pelo SUS, garantindo acesso e evitando a judicialização. Isso permitirá às pessoas maior poder de escolha, compartilhando esforços da área pública com o setor privado.

Programa de governo de Jair Bolsonaro

A promessa: Bolsonaro afirmou em seu plano de governo que o SUS poderá utilizar a força de trabalho de todos que trabalham na área da saúde para que atendam pelo SUS. A proposta não deixa claro como seria feito o pagamento por esse trabalho e eventuais procedimentos. 

O problema: Mesmo que seja por meio de uma remuneração, a proposta é de difícil execução e não traz elementos que mostrem como isso seria feito. Em primeiro lugar, o governo federal teria dificuldade em precificar, auditar e executar pagamentos para agentes privados. A medida também demandaria espaço no Orçamento para tais serviço e seria preciso prever que nem todos os profissionais desejariam participar do programa. 

10) Regras paralelas para contratos de trabalho 

Criaremos uma nova carteira de trabalho verde e amarela, voluntária, para novos trabalhadores. Assim, todo jovem que ingresse no mercado de trabalho poderá escolher entre um vínculo empregatício baseado na carteira de trabalho tradicional (azul) – mantendo o ordenamento jurídico atual –, ou uma carteira de trabalho verde e amarela (onde o contrato individual prevalece sobre a CLT, mantendo todos os direitos constitucionais)

Programa de governo de Jair Bolsonaro

A proposta: Criar vínculos de trabalho no país que não sigam as regras trabalhistas vigentes, sendo permitido nesses casos, voluntários, a prevalência do que for acordado entre trabalhador e empregador. 

O problema: somente com mudança de lei, pelo Congresso, poderá ser criada uma nova forma de vínculo empregatício, possivelmente sendo necessária mudanças na Constituição (o que exigiria que pelo menos três quintos dos parlamentares, após dois turnos de discussão, aprovassem a proposta). Além disso, alguns pontos das leis trabalhistas são cogentes, de cumprimento obrigatório, e não poderiam ser acordados entre as duas partes apenas.

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