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Presidenciáveis têm propostas para a Petrobras que vão definir o rumo da companhia no novo governo | Vanderlei Almdeira/AFP
Presidenciáveis têm propostas para a Petrobras que vão definir o rumo da companhia no novo governo| Foto: Vanderlei Almdeira/AFP

Apesar de a grande maioria dos presidenciáveis descartar a privatização da Petrobras, eles têm apresentado diversas outras propostas que vão definir o rumo da companhia no novo governo. As ideias variam de acordo com a visão que cada candidato tem para o setor. Uns querem manter a empresa independente e abrir o mercado para competição. Outros querem fortalecer o papel da Petrobras como estatal e fornecedora de combustíveis para o mercado interno. Com isso, as propostas vão desde acabar com o monopólio na área de refino até a mexer na política de preços, suspender a venda de ativos e estabelecer margem de lucro aceitável. 

O único consenso entre os cinco candidatos melhores colocados na última pesquisa Ibope*, divulgada na quarta-feira (26), é sobre a periodicidade do reajuste dos combustíveis. Todos são contra reajustes diários, estratégia que vinha sendo adotada pela Petrobras desde julho do ano passado e que motivou, entre outros fatores, a greve dos caminhoneiros deflagrada em maio. A própria estatal, depois da paralisação, voltou atrás e criou um mecanismo de proteção financeira (conhecido como hedge) para conseguir segurar o reajuste da gasolina por até 15 dias. O diesel é reajustado a cada 30 dias até o fim do ano, devido a acordo com o governo para pôr fim à manifestação de maio.

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Precificação dos combustíveis: candidatos têm visões opostas

Já sobre a política de preços em si, os candidatos apresentam visões opostas. Desde outubro de 2016, a Petrobras estabelece os preços dos combustíveis a partir do mercado internacional, levando em consideração o câmbio e as cotações em dólar do barril de petróleo e derivados. Essa metodologia foi adotada durante o governo Temer e a gestão de Pedro Parente, nomeado para assumir a presidência da Petrobras em maio de 2016, e foi considerada um dos principais desencadeadores da greve caminhoneiros, já que o preço do diesel sofreu sucessivos aumentos desde o início da nova precificação.

Jair Bolsonaro (PSL), o único dos cinco presidenciáveis melhores colocados que admitiu privatizar a Petrobras se não tiver outra “solução”, diz em seu plano de governo que quer manter a atual política de preços, atrelada ao mercado internacional. Propõe, porém, discutir os impostos que incidem sobre o preço final dos combustíveis para não “sobrecarregar o consumidor brasileiro”. Já a periodicidade de reajuste deve ser “suavizada” com “mecanismos de hegde apropriados”, tal qual o implantado pela estatal para a gasolina após a greve.

Geraldo Alckmin (PSDB) segue a mesma linha. Durante evento de campanha em Vitória (ES) em 13 de setembro, defendeu a adoção de um gatilho: se o preço internacional do barril de petróleo subir, o governo tem de reduzir o imposto; se cair, o governo deve aumentar o imposto. Sobre os reajustes, o tucano fala em prazo de 30 dias.

Os candidatos Fernando Haddad (PT) e Ciro Gomes (PDT) não querem paridade com o mercado internacional. O petista quer retomar a política de preços adotada durante a era Lula, levando em consideração custos internos e rentabilidade. O objetivo, segundo o plano de governo do PT, seria garantir “preço estável e acessível” aos combustíveis. Ele pretende, ainda, criar um programa para garantir gás a “preço justo”.

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O pedetista diz que os preços estabelecidos devem arcar com os custos e com alguma margem de lucro. Essa margem aceitável seria de 3%. “A razão de existir a Petrobras é produzir petróleo nacional para que estejamos protegidos dos ciclos eternos de especulação com o preço de petróleo”, disse o presidenciável em evento da Única, em junho.

Marina Silva (Rede) fala em política de preços mais previsível e espaçada e na adoção de um teto para aumento do ICMS, um dos impostos que incide sobre o preço final do combustível.

O professor de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Adilson de Oliveira, especialista no setor de petróleo, diz que a definição sobre a política de preços, incluindo a periodicidade, é a mais urgente que o novo presidente vai ter que tomar. Até porque, ameaças de novas greves não estão descartadas caso o combustível volte a subir . 

“Depois da greve (dos caminhoneiros), ficou claro que a política de preços alinhada com mercado internacional e reajustes diários tornará a vida dos brasileiros quase insuportável. Esse é o ponto que está todo mundo esperando (uma solução). E algo que deve ser feito logo no primeiro mês de trabalho (do novo presidente)”, afirma Oliveira. Além disso, o subsídio ao diesel estabelecido pelo governo acaba no fim do ano.

Monopólio do refino: quebrar ou manter?

Outro tema sensível à Petrobras é o seu monopólio no refino do petróleo. A companhia controla 98% da capacidade de produção de combustíveis do país. Com isso, é também quem estabelece o preço que é vendido o produto das refinarias para todas as distribuidoras do país. 

Há anos, existem discussões sobre reduzir o domínio da Petrobras e abrir o setor para concorrência externa, o que no papel já é permitido desde os anos 1990, mas na prática nunca aconteceu. 

O tema ganhou ainda mais destaque com a greve dos caminhoneiros. Quem defende, diz que a quebra vai gerar competição, o que pode ser positivo para o preço dos combustíveis e para a própria Petrobras, além de incentivar a construção de novo parques de refino. Já quem é contra diz que a estatal tem que fortalecer a sua posição privilegiada de monopólio para construir novos parques, abastecer o mercado interno e desenvolver a cadeia produtiva. 

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O professor da UFRJ acredita que a solução para o refino dependerá de uma engenharia política mais complexa, e que deverá ser pauta ao longo do primeiro ano de governo. 

“Essa situação terá que ser definida logo no primeiro ano porque o Brasil precisa expandir o parque de refino. O parque de refino está estagnado, mas o consumo de derivados de petróleo segue crescendo. (Com isso), o Brasil está se tornando uma coisa esquizofrênica: exporta (petróleo) para ser refinando nos Estados Unidos e depois importa para abastecer o mercado interno, principalmente no caso do diesel”, explica Adilson de Oliveira. “Só que há uma decisão na Petrobras de não ampliar seu parque de refino. E outros petroleiros acham difícil entrar aqui pelo domínio da Petrobras, que é quem fixa o preço no mercado”, completa. 

A atual plano estratégico da Petrobras, agora comandada por Ivan Monteiro (Pedro Parente renunciou depois da greve dos caminhoneiros), contempla a venda de parte de suas refinarias. A ideia da companhia é vender 60% da sua participação em refinarias na Bahia, Pernambuco, Paraná e Rio Grande do Sul.

O processo, porém, foi parado após o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski decidir, monocraticamente, proibir a venda de controle acionário de estatais e suas subsidiárias sem aprovação do Congresso. O caso ainda será analisado pelos demais ministros da Corte, mas, até lá, a Petrobras suspendeu o processo de venda.

O que dizem os candidatos sobre o monopólio

Bolsonaro e Alckmin são a favor do fim do monopólio da Petrobras. Bolsonaro vai além e diz em seu plano de governo que a estatal deve “vender parcela substancial de sua capacidade de refino, varejo, transporte e outras atividades onde tenha poder de mercado, para promover a competição no setor de óleo e gás, beneficiando os consumidores”. Defende, ainda, o fim do monopólio na área do gás natural, oficialmente quebrado no início do ano com a Lei do Gás, mas ainda dependente de ações práticas para virar realidade. 

Já Alckmin quer a Petrobras concentrada na exploração do pré-sal e em pesquisa e prospeção. Ele também quer que novas refinarias se instalem no Brasil para estimular a competição. “A primeira proposta é quebrar o monopólio do refino. Trazer investimento privado para ter novos refinos no Brasil, novas refinarias e, com isso, reduzir o preço do combustível”, disse em evento em Vitória.

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Haddad tem visão diferente de seus oponentes. O petista quer uma Petrobras onipresente, como é hoje, atuando em todas as áreas (petróleo, biocombustíveis, energia elétrica, fertilizantes, gás natural e, sobretudo, diz o plano de governo, petroquímica) e etapas da cadeia produtiva (exploração, produção, transporte, refino, distribuição e revenda). Fala, ainda, em acabar com a ociosidade das refinarias atuais e ampliar o parque de refino da Petrobras.

O candidato do PDT e Marina Silva não falaram sobre o assunto. 

Venda de ativos: continuar ou interromper?

Um terceiro ponto estratégico para a Petrobras é a venda de ativos. A companhia criou no início desta década um programa para vender propriedades, empresas e participações que não considera mais relevantes. O processo foi acelerado nos últimos anos, principalmente pela necessidade de fazer caixa frente à sua dívida bilionária, que chegou a R$ 500 bilhões em 2015. A companhia já se desfez de negócios na área de fertilizantes, gás, petroquímica e campos maduros de pré-sal. O processo continua, mas, nos casos em que envolve a venda de controle, está parado, devido à liminar de Lewandowski.

Haddad e Ciro Gomes são contra a venda dos ativos. O candidato do PT diz, em seu plano de governo, que vai interromper as privatizações e a venda de patrimônio público. 

Já o presidenciável do PDT afirma, também no plano de governo, que “todos os campos de petróleo brasileiro vendidos ao exterior pelo Governo Temer após a revogação da Lei de Partilha serão recomprados, com as devidas indenizações”. E completa: “Não há nenhuma razão nacional brasileira - estratégica, econômica ou energética - que justifique a venda das nossas reservas ao exterior ou a pressa em explorar e produzir o nosso petróleo”.

Por outro lado, Bolsonaro e Alckmin são favoráveis à venda de ativos. O tucano fala em acelerar a venda de distribuidoras e campos maduros do pré-sal. E o candidato do PSL em vender parcela substancial dos ativos da Petrobras no refino, varejo e transporte. O objetivo de ambos é aumentar a competição no mercado interno.

Outros temas: conteúdo local e regime de partilha

Além da venda de ativos, da política de preços e do monopólio, há outros temas que interferem no futuro da Petrobras e, para quais, os candidatos também têm propostas. 

Por exemplo, a regra de conteúdo local, ou seja, o percentual estabelecido por lei de participação da indústria e de fornecedores nacionais em determinar produção de bem ou serviço. Atualmente, essa regra no setor de petróleo já foi flexibilizada: passou de 80% para 50% na contratação de equipamentos para exploração de áreas novas. Contratos antigos estão sendo revistos.

Entre os presidenciáveis que citam o assunto, Bolsonaro é a favor de acabar com as exigências de conteúdo local para exploração de petróleo. O plano de governo do PT, de Fernando Haddad, diz que a “política de conteúdo local será retomada e aprimorada”. 

O PT defende, ainda, a manutenção do regime de partilha do pré-sal. Nesse regime, vencem as licitações para exploração de pré-sal as empresas que oferecem ao governo o maior percentual de óleo excedente da futura produção. A Petrobras perdeu o monopólio nessa área em fevereiro de 2016. 

Petrobras procura presidenciáveis

Com tantas propostas sendo citadas, a direção da Petrobras fez questão de procurar os candidatos. O objetivo é dar a eles ciência da situação financeira da companhia, que ainda se recupera do escândalo de corrupção conhecido como “Petrolão” e de quatro anos seguidos de prejuízo.

Os encontros começaram em setembro e estão sendo conduzidos pelos executivos Nelson Silva, Rafael Grisolia e Eberaldo de Almeida Neto, respectivamente diretores de Estratégia, Organização e Sistema de Gestão; Financeiro e Relações com Investidores; e de Assuntos Corporativos. Participam assessores econômicos dos candidatos.

A Petrobras não divulga com quais representantes de candidatos já conversou. A assessoria da companhia informa, apenas, que as conversas continuam e que a direção está à disposição de todos os candidatos. 

A reestruturação da Petrobras

Atualmente, a Petrobras funciona de maneira independente e reforçou sua política de governança corporativa e de compliance para evitar ingerência política e novos casos de corrupção. As decisões monocráticas e as indicações políticas para cargos do conselho de administração, por exemplo, foram cortadas. A companhia é controlada pelo governo, mas tem ações negociadas na bolsa de valores do Brasil e dos Estados Unidos.

Desde 2016, passa por um processo de reestruturação. A Petrobras viu sua dívida chegar ao nível recorde R$ 506,5 bilhões em 2015 e viveu quatro anos seguidos de prejuízo (2014-2017), fruto da corrupção, queda do preço do barril de petróleo, recessão no mercado interno e ingerência política. No governo Dilma, por exemplo, o reajuste no preço dos combustíveis foi segurado para conter a inflação.

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Agora, a companhia foca em cortar custos e vender ativos em áreas menos rentáveis e não mais estratégicas para fazer caixa e recuperar a sua capacidade de investimento. O mercado financeiro respondeu positivamente às iniciativas e o valor de mercado da companhia está na casa dos R$ 300 bilhões. Na quinta-feira (27), atingiu R$ 302,56 bilhões e a estatal voltou a ser a segunda empresa mais valiosa do Bovespa. Ainda assim, a expectativa é que a petroleira alcance a saúde financeira somente em 2022.

O analista de investimento da Planner Luiz Caetano relembra que a Petrobras passou por momentos “extremamente delicados”no passado próximo. “Houve um investimento muito acima da capacidade de geração de caixa, o que levou ao endividamento elevado. Ela também perdeu rentabilidade por causa da política de preço (no governo Dilma) que fez ela vender mais barato aqui no Brasil. Tudo isso levou à Petrobras a prejuízos e endividamento alto. Com a dívida elevada, reduziram nível de investimento e venderam ativos para pagar dívida.”

Para ele, se o novo presidente voltar às práticas anteriores que levaram ao endividamento da Petrobras, há riscos de a recuperação financeira - ainda em curso - ser interrompida. “Se o futuro presidente, voltar às práticas anteriores, que estavam levando a empresa a ter prejuízo, seja com preço dos combustíveis, seja com práticas de gestão ou nível de investimento, a Petrobras vai voltar para o caminho do endividamento alto e prejuízos”, diz Caetano. 

O professor Adilson de Oliveira, da UFRJ, destaca que, antes de tudo, ou seja, antes de revolver os temas pendentes e traçar o rumo da Petrobras no governo, o mais importante é garantir que a estatal não volte a ser usada para interesses políticos. “Petrobras não pode ser instrumento político. Isso não pode acontecer. Ela deve ser uma empresa do estado brasileiro, e não do governo de plantão.”

Metodologia da pesquisa citada

*Pesquisa realizada pelo Ibope-CNI de 22/set a 24/set/2018 com 2.000 entrevistados (Brasil). Contratada por: Confederação Nacional da Indústria. Registro no TSE: BR-04669/2018. Margem de erro: 2 pontos percentuais. Confiança: 95%.

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