O novo diretor-geral da Polícia Federal, o delegado de carreira Fernando Segovia, tomou posse nesta segunda-feira (20) para substituir Leandro Daiello, um dos mais longevos no cargo e que comandou a corporação durante os anos da Operação Lava Jato, uma investigação que está mudando os rumos do país. A substituição de Daiello já era esperada há meses, mas a escolha do novo nome não agradou a corporação.
Não há nada contra Segóvia especificamente, mas a Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF) pretendia que a definição respeitasse uma lista tríplice eleita pela categoria. Nessa entrevista, o presidente da ADPF, Carlos Sobral, lamenta o fato, mas diz que o trabalho de combate à corrupção será mantido com a nova diretoria – que inclui também a troca na Superintendência Regional da PF no Paraná, berço da Lava Jato.
Mesmo em fim de mandato, que se encerra em dezembro, Sobral faz um discurso polido e evita atritos políticos. Porém, assume uma postura mais incisiva quando o assunto é a autonomia dos delegados da PF – prevista na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 412/09, em trâmite na Câmara dos Deputados. O projeto permite que a corporação defina as diretrizes administrativas e orçamentárias e tome decisões internas sobre abertura de concursos e promoção de diretores, entre outros pontos.
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No dia 7 de novembro, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, encaminhou à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara uma nota contrária à PEC. O Ministério Público Federal alegou que haverá risco de insubordinação caso a medida seja aprovada. Em resposta, o presidente da ADPF criticou o posicionamento do MPF.
“A PGR, infelizmente, em determinado momento adotou uma postura de tentar submeter a Polícia Federal a seu comando, o que tem atrapalhado a boa relação entre duas das mais importantes instituições brasileiras”, declarou em entrevista por e-mail. Confira a íntegra:
O delegado Leandro Daiello permaneceu por bastante tempo à frente da corporação. Já houve no período recente menções de substituí-lo, o que acabou acontecendo só agora, após a Câmara dos Deputados arquivar a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer. O senhor acha que Temer se sentiu forte suficiente para fazer a troca pelo nome de preferência do Planalto, o de Fernando Segovia?
Primeiramente, quero destacar que nesses últimos anos a Polícia Federal se tornou a instituição pública de maior credibilidade junto à sociedade brasileira, graças à sua forte atuação contra o crime organizado e a corrupção. A Associação dos Delegados da Polícia Federal tem como uma das suas principais bandeiras a lista tríplice como forma de escolha da diretoria do órgão. Em 2016 começaram a surgir rumores de troca no comando na PF. A partir daí, fizemos uma ampla consulta aos associados, onde votaram mais de 1,3 mil delegados, que manifestaram o desejo de ver a delegada Erika Marena, na época uma das coordenadoras da Lava Jato, no comando do Departamento da Polícia Federal.
A ADPF emitiu uma nota de apoio ao trabalho de Fernando Segovia, mas ressaltou a necessidade de escolha a partir de uma lista tríplice eleita pela categoria. Quais as dificuldades para instituir essa lista tríplice? Há alguma barreira concreta?
Nos últimos anos, instituições de Estado, como o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública, vêm adotando esse processo de lista tríplice como forma de aprimoramento da escolha de seus dirigentes, buscando uma maior autonomia e fortalecimento institucional. Apesar dessa forma de escolha ser um desejo da categoria, que também defende um mandato para o cargo de diretor-geral, a lei ainda faculta a livre escolha ao presidente da República.
Na última semana foi anunciado que Maurício Leite Valeixo vai assumir a Superintendência Regional da Polícia Federal no Paraná, estado que concentra as investigações da Operação Lava Jato. Quais são as perspectivas da associação com o futuro da força-tarefa?
É bom deixar claro que o doutor Valeixo é um nome técnico, qualificado e respeitado dentro da Polícia Federal. Acreditamos que ele dará continuidade ao trabalho da Polícia Federal na Lava Jato. Sabemos que Curitiba é o berço da operação, mas hoje ela já se ramificou em diversos pontos do país, especialmente no Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal. Portanto, a missão da Polícia Federal hoje é fortalecer as equipes responsáveis pela condução da Lava Jato em todos os estados, para que a operação se fortaleça cada vez mais e que tenhamos continuidade no trabalho de combate à corrupção.
A Procuradoria-Geral da República, parceira da PF em investigações, é uma das instituições contrárias ao projeto de autonomia previsto na PEC 412/09. Mesmo policiais federais fazem críticas, e dizem que o interesse dos delegados é se equipararem a juízes e procuradores. O que a associação diz sobre isso?
A PGR, infelizmente, em determinado momento adotou uma postura de tentar submeter a Polícia Federal a seu comando, o que tem atrapalhado a boa relação entre duas das mais importantes instituições brasileiras. A nossa visão é que tanto a Polícia Federal quanto o Ministério Público Federal devem manter a independência uma em relação a outra, mas procurando atuar de forma harmônica e coordenada. Temos a certeza de que o MPF vai refletir sobre essa postura equivocada e, logo, logo, vai acabar apoiando a autonomia orçamentária e administrativa da PF, que já conta com enorme apoio da população e será extremamente positiva para o Brasil.
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