Tida como a grande prioridade do governo de Jair Bolsonaro (PSL) -- e uma de suas bandeiras de campanha -- a reforma da Previdência é apresentada nesta quarta-feira (20) pelo presidente e o mentor da proposta, o ministro da Economia, Paulo Guedes. O impacto da reforma é calculado em R$ 1,165 trilhão em dez anos.
Entre outros pontos, o texto prevê mudanças nas aposentadorias de trabalhadores rurais, políticos, professores, policiais civis e federais e agentes penitenciários.
“Nova Previdência é para todos. É melhor para o Brasil” é o slogan escolhido pelo governo para apresentar a reforma. A estratégia de comunicação será passar uma mensagem de combate a privilégios e de que as mudanças vão atingir a todos. A preocupação do governo é evitar que se espalhe a tese de que a reforma prejudicaria os mais pobres, como aconteceu durante o governo Temer.
Se antes a equipe econômica optou por revelar apenas a idade mínima de aposentadoria – que será de 62 anos para mulheres e 65 anos para homens –, agora a proposta é conhecida em detalhes.
Para evitar resistências, o governo afirma que a proposta é justa e igualitária. Os técnicos que apresentaram o texto à imprensa fizeram questão de destacar que os mais ricos vão se aposentar com a mesma idade que os mais pobres.
Isso porque, atualmente, é possível se aposentar por tempo de contribuição (35 anos homens e 30 mulheres), sem necessário atingir idade mínima. Normalmente, pessoas com mais qualificação tendem a conseguir esse tempo. Já trabalhadores menos qualificados e de áreas mais pobres tendem a ficar muito tempo na informalidade, por isso não atingem tempo de contribuição e se aposentam por idade mínima – hoje em 65 anos para homens e 60 para mulheres.
Técnicos do governo também destacaram que quem ganha até um salário mínimo pagará uma contribuição menor. A alíquota foi reduzida de 8% para 7,5%. Já quem recebe mais teve a alíquota levemente majorada: de 11% para 11,68%.
Entrega no Congresso
Bolsonaro foi ao Congresso Nacional na manhã desta quarta, onde se reuniu com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a quem entregou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC). A proposta começar a tramitar em seguida na Câmara dos Deputados, primeira Casa a analisar o texto.
Para entrar em vigor, a nova legislação precisa ser aprovada na Câmara dos Deputados e no Senado, em dois turnos em cada Casa, com votos de no mínimo três quintos (60%) dos congressistas – isto é, de pelo menos 308 dos 513 deputados, e 49 dos 81 senadores.
A apresentação do projeto ocorre na esteira da primeira grande crise política do novo governo: a demissão do ministro Gustavo Bebbiano, na segunda-feira (18), que era visto como peça importante para a articulação política por seu trânsito com os parlamentares.
A missão da articulação será dividida pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho – que tem no currículo a relatoria da reforma trabalhista na Câmara, único grande projeto aprovado na gestão de Michel Temer.
Parlamentares, inclusive o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fizeram alertas sobre temas sensíveis da proposta: aposentadoria rural e Benefício de Prestação Continuada (BPC). Esses benefícios vão mudar (saiba mais abaixo) e tendem a ser alvo de intensa negociação.
O que está na reforma da Previdência
Desde a última semana, o governo já tinha anunciado os requisitos para a idade mínima de aposentadoria, que vai para 65 anos para homens e 62 anos para mulheres. O período de transição para alcançar esse patamar será de até 14 anos, a depender da regra de transição escolhida pelo segurado.
O tempo mínimo de contribuição será de 20 anos. Quem contribuir pelo período mínimo receberá, como aposentadoria, 60% da média de seus salários de contribuição. Cada ano de contribuição além do mínimo de 20 vai acrescentar mais 2% ao benefício.
Assim, quem contribuir por 35 anos, por exemplo, terá direito a 90% da média salarial. E serão necessários 40 anos de contribuição para a obtenção de aposentadoria integral (isto é, de 100% da média salarial). A reforma apresentada no governo Temer previa inicialmente 49 anos de contribuição para aposentadoria integral, mas depois o Planalto aceitou reduzir esse prazo para 40 anos – o mesmo exigido agora.
Para servidores públicos, as idades mínimas também serão de 62 e 65 anos, após transição. O tempo de contribuição mínimo será de 25 anos – cinco a mais que o do INSS, portanto. No momento da aposentadoria, o servidor também precisa ter pelo menos dez anos de tempo de serviço público.
Alíquotas
Outra mudança, esta anunciada na Câmara dos Deputados pelo secretário especial de Previdência e Trabalho, é nas alíquotas de contribuição. Para quem ganha até um salário mínimo, o desconto será de 7,5% – hoje é de 8%. A redução dessa alíquota é uma forma do governo tentar passar uma intenção de promover “justiça social” com a reforma.
Para quem ganha entre R$ 998 e R$ 2 mil, a alíquota será de 7,5% a 8,25%. Entre R$ 2.001 a R$ 3 mil, de 8,25% a 9,5%. Acima desse valor, de 9,5% a 11,68%.
A alíquota de contribuição para os servidores públicos, hoje de 11% para todos (e, no caso dos mais novos, limitada ao teto do INSS), também subirá conforme a renda, seguindo a mesma lógica de faixas salariais do Imposto de Renda. O governo quer elevar para até 22% (mas esta alíquota mais alta valeria apenas para rendas superiores ao teto constitucional, de cerca de R$ 39 mil atualmente). Entre os que não ganham acima do teto, o maior desconto no salário será de 16,79%.
Aposentadoria rural, professores, policiais civis e federais, agentes penitenciários
As regras para aposentadoria rural trazem mudanças importantes. A idade mínima, hoje em 55 anos mulheres e 60 anos homens, passam para 60 anos em ambos os sexos. O tempo de contribuição, que hoje está em 15 anos, será de 20 anos.
Para professores, a idade mínima também será de 60 anos para homens e mulheres, com mínimo de 30 anos de contribuição.
Para policiais civis e federais, a proposta da reforma é de aposentadoria com idade mínima de 55 anos para ambos os sexos. As diferenças entre homens e mulheres vêm no tempo de contribuição – 30 anos para eles e 25 anos para elas – e no tempo de exercício de profissão – 20 anos para eles e 15 anos para elas, com progressão até atingir 25 anos e 20 anos de trabalho na atividade para homens e mulheres, respectivamente.
Os agentes penitenciários também serão afetados: homens e mulheres só se aposentarão com idade mínima de 55 anos, tempo de contribuição de 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), além do tempo de exercício de 20 anos para ambos os sexos.
Os agentes penitenciários e socioeducativos não possuíam regra especial para a aposentadoria, o que passará a acontecer caso a reforma seja aprovada desta forma.
Os políticos em exercício do mandato estarão sujeitos a uma regra de transição com idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres. Haverá também 30% de “pedágio” do tempo de contribuição que ainda falta. Todos os eleitos posteriormente à promulgação da PEC estarão sujeitos automaticamente ao regime geral do INSS. A proposta também prevê a extinção dos atuais regimes.
Aposentadoria por invalidez
A reforma da Previdência também altera as regras de cálculo do benefício para aposentadoria por incapacidade permanente.
Hoje, a regra de cálculo é de 100% do valor do benefício para todos. A proposta é que o benefício seja de 60%, com um adicional de 2% por ano de contribuição que exceder 20 anos multiplicado pela média dos salários de contribuição.
Se a invalidez permanente for fruto de um acidente de trabalho, doenças profissionais ou doenças do trabalho, não há alteração na regra de cálculo do benefício, que ficaria 100% multiplicado pela média dos salários de contribuição.
Pensão por morte
A proposta da Previdência altera as regras de recebimento de pensão por morte. Hoje, a taxa de reposição do benefício para o INSS é de 100% do valor, desde que respeitado o teto. No regime dos servidores, o benefício pode ser equivalente até 100% o valor do teto do INSS mais uma parcial de 70% do que superar esse teto.
A proposta é que a taxa de reposição do benefício, com a reforma, seja de 60%, mais 10% adicional por dependente – tanto no INSS quanto para servidores. Ou seja: se há apenas um dependente, a pessoa receberá 60% do valor do benefício da pessoa falecida. Com dois dependentes, o benefício sobe para 70% do valor. Caso haja cinco ou mais dependentes, a taxa de reposição do benefício é de 100%.
De acordo com a proposta, em caso de morte por acidente de trabalho, doenças profissionais ou doenças do trabalho, o benefício será pago no valor integral para o INSS e servidores. Não haverá alteração para pensões já concedidas. No caso de dependentes de servidores que ingressaram antes da criação da previdência complementar, o benefício será calculado sem limitação ao teto do INSS.
Acúmulo de pensão e aposentadoria
Haverá limite para acúmulo de pensões ou de pensão com aposentadoria. O segurado receberá na íntegra o valor do maior benefício, porém apenas uma parte da soma dos benefícios restantes – 80% de benefício que seja igual ou inferior a um salário mínimo; 60% caso seja maior que um e de até dois salários mínimos; 40% caso seja maior que dois e de até três salários mínimos; e 20% de valor que supere três salários mínimos e até quatro salários mínimos.
Há casos de acumulação de aposentadoria previstas em lei que não serão alvo de limitação pela proposta de reforma da Previdência. É o caso de médicos, professores, aposentadorias do regime próprio dos servidores ou Forças Armadas com INSS. A acumulação de cada benefício adicional ficaria limitada a dois salários mínimos.
Benefício assistencial
Para quem pouco ou nunca contribuiu para a Previdência e prove estar em condição de pobreza extrema, continuará a ser pago o BPC, um benefício assistencial. Porém, o valor será reduzido. Hoje, ele é de um salário mínimo para quem tiver 65 anos ou mais ou for deficiente físico de baixa renda. Pela proposta apresentada, será de R$ 400 a partir dos 60 anos e de um salário mínimo quando a pessoa atingir 70 anos. Esse deve ser um ponto que enfrentará bastante resistência no Congresso.
De olho na comunicação
Um ponto que preocupa a equipe de Bolsonaro é a estratégia de comunicação que será usada com parlamentares e a sociedade para apresentar a reforma da Previdência. A avaliação é de que a proposta de Temer foi enfraquecida por dar muita margem à críticas e não explicar de maneira acessível os impactos da mudança nas regras da aposentadoria na vida das pessoas.
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